Pergunta: Será que é possível fazer alguém amá-lo, mesmo sendo o Todo-Poderoso?
Realmente são precisos dois para dançar o tango (ou para ter uma relação de amor)?
Andrew
Dr. William Lane Craig responde:
Sua pergunta aguçou meu interesse, Andrew, pois neste ultimo ano Jan e eu estivemos freqüentando aulas de dança de salão e, entre os diferentes estilos, aprendemos tango! Inicialmente, nos matriculamos porque nosso filho John estava se casando no verão. Particularmente, me apaixonei pela dança de salão, pois é divertidíssimo. Embora eu seja completamente descoordenado – e eu falo sério; algumas danças, como rumba, por exemplo, exigem que o dançarino coordene movimentos de mãos, braços, peito, quadris, pernas e pés – eu aprecio desafios e estou realmente determinado a aprender a dançar todos estes diferentes estilos.
Dominar estes estilos de dança requer prática, assim eu passo algum tempo sozinho, praticando os passos com uma parceira imaginária. Eu descobri que eu podia aprender, e a dizer cada passo do tango mesmo sem uma parceira presente, apenas fazendo de conta que ela estava comigo fazendo seus próprios movimentos comigo. Isto me mostrou que necessariamente, eu não precisava de uma parceira para dançar tango, mesmo que seja muito mais interessante tendo uma parceira.
Mas descobri que esta estratégia tem uma desvantagem enorme. Embora seja verdade que você pode aprender os passos de tango sozinho, não acaba aí. O homem é quem guia a parceira durante a dança, durante cada um dos intrincados passos. Isto requer que sutilmente as mãos e os braços pressionem a parceira, orientando-a durante os passos. E isto é algo que você não aprende com uma parceira imaginária. Assim, quando danço com Jan, sei que minha maior fraqueza é que eu não a guio corretamente, e ela não sabe com segurança qual é o próximo passo. Isso pode resultar em pés doloridos!
E foi então que eu percebi que são necessárias duas pessoas para dançar o tango, especialmente se quiser dançar bem.
Da mesma forma, para que se tenha um relacionamento amoroso genuíno as duas partes precisam cooperar. É impossível obrigar alguém a fazer algo por livre e espontânea vontade. Se você impõe, a outra pessoa não o faz por livre e espontânea vontade, pois a escolha não foi dela, mas do outro. Acrescentamos que o verdadeiro amor deve ser dado livremente. (Lembre-se da história de Pinocchio: Geppetto poderia ter criado sua marionete, movido sua boa e dito “papai, eu te amo”, mas Geppetto queria um filho de verdade, não uma simples marionete, mesmo que isto significasse a possibilidade de uma rebelião posteriormente). Assim, um relacionamento amoroso verdadeiro pressupõe liberdade de ambos em dar e receber amor.
Mesmo o Todo Poderoso não pode fazer o que é logicamente impossível. Deus poderia produzir algum tipo de reação química em nossos cérebros para que tivéssemos reações e comportamentos que poderiam ser descritos como amor com relação a Ele, mas isto seria um falso amor, seria como tratar com uma marionete. Para ter um relacionamento amoroso genuíno conosco, Deus necessita criar a possibilidade de uma rebelião.
É claro que isto não significa que Aquele que ama é impotente e incapaz de conquistar o amor do outro. Quem ama de verdade não fica passivo, mas busca maneiras de conquistar a afeição do ser amado. Pode tentar aprender sua “linguagem de amor”, suas preferências, as coisas que não gosta e agir a partir destas informações. De fato, ele passaria pela fase de “se eu fizer X, ela reagirá de forma Y”. Ele tentará pensar em todas as estratégias e circunstâncias em que o ser amado livremente responderia com amor.
Nós podemos fazer apenas julgamentos falíveis e prováveis com respeito à verdade destas condicionais subjuntivas. Algumas vezes percebemos que tivemos erros de cálculo de proporções desastrosas, quando o outro reage de maneira tão diferente daquela esperada. Mas no caso de Deus – se Deus, como creio, possui o conhecimento médio (middle knowledge) – Ele sabe com certeza em quais circunstâncias uma pessoa o amaria ou não livremente em resposta às suas iniciativas. Deus não pode fazer com que você o ame, mas Ele pode fazer algo ainda maior, que é proporcionar circunstâncias em que você por sua livre vontade dê a Ele o seu amor.
Agora, a questão óbvia é por que Deus não ordena providencialmente o mundo de uma forma que todos venham a livremente amá-lo? Este é essencialmente o problema do mal (moral) e sua versão soteriológica que já contemplei em outros artigos (veja “O problema do mal” e “Como Cristo pode ser o Único Caminho para Deus?”). Em resumo, a resposta é que Deus não poderia criar um mundo de pessoas livres (sem gerar desvantagens excessivas) em que todos escolhessem livremente amá-lo. Não é suficiente que existam circunstâncias em que cada pessoa venha a amar livremente a Deus; estas circunstâncias devem ser compossíveis, e isso pode não ser factível. Deus ainda estende graça suficiente sobre todas as pessoas que Ele criou, de modo que ela possa vir a amá-lo e ter um relacionamento de amor com Ele, mas ainda assim, algumas pessoas são inexoráveis e o rejeitam.
Portanto, no caso de Deus, também são necessários dois para dançar o tango e, se uma parte se recusa a dançar, nada acontece.
William Lane Craig
Fonte: http://www.reasonablefaith.org/site/News2?page=NewsArticle&id=7615
Tradução: Marcela Totolo