Tenho um privilégio do qual procuro desfrutar o máximo possível. São as belezas naturais da cidade onde moro com a família. Elas encantam turistas e atraem forasteiros que aqui chegam e não mais querem retornar. Das janelas de minha casa, no alto da colina, avisto ao longe as montanhas, entre as quais se destaca o Dedo de Deus, pelo qual Teresópolis é conhecida em todo o mundo.
A magnífica visão enternece a minha alma de poeta e libera o espírito para voar nas asas líricas das palavras que constróem poemas e revestem de concretude a realidade materialmente intangível das coisas eternas.
Foi assim dia desses. Após ficar horas a fio contemplando este quadro, meus olhos se elevaram um pouco mais e alcançaram a dimensão etérea descrita nos dois últimos capítulos do Apocalipse. O cenário das ruas de ouro, dos muros adornados de pedras preciosas, da glória de Deus que ilumina as mais distantes extremidades, povoou a minha mente.
Ao mesmo tempo, fui tomado pelas questões existenciais, que vez ou outra escapam dos precipícios do subconsciente e vêm digladiar-se na explosão dos raciocínios que percorrem o cérebro. “E se não existir céu?”, gritou lá do fundo um intruso existencialista.
Nessas horas, todavia, quando se mantém um relacionamento constante e proveitoso com a Palavra de Deus, um dos papeis do Espírito Santo é por ordem na casa e trazer à memória os argumentos que destróem a mais arguta dúvida existencial. Não foi diferente comigo. Ele usou a própria visão panorâmica que se espraiava diante de meus olhos para reafirmar a certeza da fé: “Tem que existir céu!” Foi aí que pensei: “Não é possível que a criatividade de Deus se restrinja apenas a esses vales e montanhas, rios e mares, cachoeiras e maciços que vicejam na Terra”. Fui um pouco mais além: “É inadmissível acreditar que a imensidão criativa do Altíssimo se restrinja ao nosso sistema solar e aos astros que compõem a nossa Via Láctea, bem como às demais galáxias que preenchem o Universo. Deus seria pequeno”.
O espaço em que vivemos e a dimensão sideral, onde se voa a anos-luz, testemunham à nossa consciência que em algum lugar acima das estrelas onde há moradas preparadas para os salvos.
Veio também ao meu coração outra realidade. Somos acostumados a olhar o céu como escapismo para o duro dia-a-dia dos sofrimentos terrenos. É óbvio que a expectativa de deixar para trás as angústias que cercam a existência se inclui entre os fatores que constituem o ideal de todo o cristão. É bíblico que as lágrimas não mais existirão na cidade santa. Mas a esperança no amanhã com Deus deve ser, também, analisada sob outro ângulo. O da qualidade de vida desfrutada no planeta Terra e a que será vivida em toda a sua dimensão no céu.
Em que pesem as agruras provocadas pelo pecado, ainda assim não há como negar que é bom demais desfrutar das riquezas que a natureza oferece. Pelo menos eu gosto. Quem não aprecia, por exemplo, passar horas e horas ao sol, sentindo escorrer pelo corpo as águas frias e cristalinas de uma cachoeira? Ou subir as montanhas e aguçar o olfato para sentir o aroma silvestre das matas?
Quem não se sente bem em caminhar pelas praias e ouvir o bulício das ondas que batem nos pés? Mesmo Jesus, com certeza, experimentou esta sensação nas areias do Mar Mediterrâneo e do Mar da Galileia.
Quem não se contagia ao contemplara infinidade de peixes de variados matizes colorindo o fundo dos oceanos? Ou acompanhar ao longe a alegre sinfonia dos pássaros nas florestas? E o que mais poderia eu acrescentar? A lista é infindável.
Pois bem. Tais possibilidades concretas, que hoje preenchem a expectativa de cada um, são apenas vislumbres esmaecidos da qualidade de vida que os salvos desfrutarão na presença de Deus. Com uma vantagem: sem os sofrimentos que marcam a trajetória terrena.
Portanto, ao invés de ser olhado como escapismo, o céu é a plena realização dos propósitos divinos para o homem em seu estado original no Jardim do éden. E a concretização última da esperança do cristão, que enquanto na Terra desfruta em escala ínfima das boas coisas que Deus preparou para o ser humano, apesar do pecado.
Enquanto continuava a contemplar as montanhas que cercam a cidade, e as flores que adornam o jardim em frente da casa, o Espírito Santo trouxe à tona outros argumentos. Entre eles o da tendência inata do ser humano de desejar a todo custo a imortalidade.
A morte contraria, sob todos os aspectos, a lógica da vida. Aquela implica na cessação desta, segundo a visão equivocada existencialista. Todavia, esta tendência inata atua de tal modo que tudo se faz para adiar a morte. Que o digam os modernos equipamentos de diagnose, capazes de rastrear uma doença grave em seu início e criar todas as condições médicas para erradicá-la. Acreclita-se inclusive que o suicida, se pudesse, voltaria atrás após a consumação do ato insano. Até os que professam o ateísmo alimentam no íntimo a hipótese da imortalidade, mesmo sem admiti-lo de público.
Esta característica inata é a confirmação inconteste, do lado humano, não só do que a Bíblia diz acerca da existência da vida após a morte, mas também da realidade do céu e do inferno, pois justos e injustos terão destinos diferentes.
Assim sendo, mesmo como cristãos, quando lutamos para preservar a vida, empregando todos os recursos da medicina ao nosso dispor, há um testemunho implícito de que o homem foi criado para viver eternamente, e desfrutar do plano original de Deus agora restaurado no céu. Para chegar lá, todavia, dependerá de sua atitude ante a obra redentora de Cristo realizada no Calvário. É aqui onde se realiza a travessia entre a Terra e a cidade celestial.
Meu coração não suportou o peso da convicção espiritual. Bastou para que as dúvidas existenciais evaporassem da minha mente. Elas desejarão dar o ar de sua graça outras vezes, mas, como agora, encontrarão o chão da minha confiança no Altíssimo irrigado pela Palavra. “Tem que existir céu!”, bradei no silêncio da tarde. Lágrimas começaram a rolar pela face. Enquanto contemplava ao longe o Dedo de Deus apontando para cima, e apreciava o sol esconder-se atrás das montanhas, concluí, glorificando a Deus em outras línguas: “Se aqui já podemos experimentar por antecipação as glórias do céu, que diremos daquele dia, quando tomaremos posse de toda a sua concretude?” E listei os seguintes pontos:
Não pretendo ir para o céu como fuga da realidade presente, mas por ser o ápice do propósito de Deus para a realização do homem.
Enquanto vida física tiver, pretendo desfrutar ao máximo as coisas boas que Deus criou, pois elas revelam em menor instância o que me aguarda no porvir.
A esperança do céu não me torna um alienado na Terra. Pelo contrário, exige pleno comprometimento com o evangelho integral, que garante as bênçãos futuras, mas tudo faz para minorar o sofrimento presente e antecipar, aqui e agora, uma excelente qualidade de vida em Cristo.
Enquanto este dia não chega, seja através da morte ou mesmo do encontro pessoal com Cristo em sua vinda, é meu dever preservar a minha vida, cuidando exemplarmente de minha saúde, pois este desejo inato que me proporciona viver aponta para a realidade futura do céu.
Devo viver todos os dias na expectativa de que minha entrada no céu pode estar tão perto quanto eu estou de minhas atividades diárias. Daí porque, vivendo ou morrendo, faço-o pelo Senhor.
Ao fim desta singular experiência, a única maneira que encontrei de antever a realidade do céu foi repassar outra vez os dois últimos capítulos do Apocalipse, dos quais passo a ler com você, para finalizar, os últimos cinco versículos do capítulo 21 e os cinco primeiros do capítulo 22:
“E a cidade não necessita de sol nem de lua, para que nela resplandeçam, porque a gtória de Deus a tem alumiado, e o Cordeiro é a sua lâmpada. E as nações andarão à sua luz; e os reis da terra trarão para ela a sua glória e honra. E as suas portas não se fecharão de dia, porque ali não haverá noite. E a ela trarão a glória e a honra das nações. E não entrará nela coisa alguma que a contamine e cometa abominação e mentira; mas só os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro. E mostrou-me o rio puro da água da vida, claro como cristal, que procedia do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, e de uma e da outra banda do rio, estava a árvore da vida, que produz doze frutos, dando seu fruto de mês em mês; e as folhas da árvore são para a saúde das nações. E ali nunca mais haverá maldição contra alguém; e nela estará o trono de Deus e do Cordeiro, e os seus servos o servirão. E verão o seu rosto, e nas suas testas estará o seu nome. E ali não haverá mais noite, e não necessitarão de lâmpada nem de luz do sol, porque o Senhor Deus os alumia: e reinarão para todo o sempre”.
Pr. Jeremias Couto, Assembleia de Deus, Teresópolis/RJ