Somos macacos?

O conceito da evolução biológica é quase tão antigo quanto a vida em si. Muitos homens, ao longo dos sé­culos, expressaram a crença de que todos os seres vivos evoluíram de um mesmo ancestral. Alguns atribuíram esse processo evolutivo a Deus e outros, à natureza, mas até o século 19, ninguém havia ainda postulado um me­canismo pelo qual isso pudesse ter acontecido e que fos­se remotamente plausível.

No entanto, em 1859, Charles Darwin publicou o que é comumente chamado de A origem das espécies ou A ori­gem.1 Sua teoria da seleção natural, que trabalha com variações de chance, revolucionou o mundo.

Hoje, o darwinismo é recebido por muitas pessoas como uma teoria científica genuína. A popularidade da teo­ria de Darwin é tanta que todo aquele que a questiona é considerado suspeito e inevitavelmente atrai para si o olhar psiquiátrico especulativo.2 Todavia, dissidentes como Adam Sedgwick argumentaram, desde o princí­pio, denunciando que o darwinismo não se tratava de uma ciência, mas estava fundamentado em uma filoso­fia de ateísmo e materialismo.3

Muitos darwinistas negam essa afirmação, acreditando que a teoria darwiniana não é ateísta. Reivindicam que Darwin sempre creu em Deus, ou que ele se tornou in­crédulo muitos anos depois de ter desenvolvido a teoria da seleção natural. Afirmam, ainda, que religião e a evo­lução podem ser reconciliadas, que o ateísmo e a influ­ência naturalística acreditam na evolução.

A verdade é que a teoria da seleção natural foi uma ten­tativa de Darwin em fornecer ao ateísmo aquilo que lhe faltava: uma história da criação.4 O cientista Richard Dawkins sustenta que uma vez que a evolução tornou Deus desnecessário, Darwin lançou então a possibilida­de de que o ateísmo ganhasse um caráter intelectual.5 O primeiro passo para conectar o darwinismo ao ateís­mo é examinar a evidência de que o fundador da teoria era um ateu e que a sua teoria foi formulada para tornar Deus desnecessário.

Na sua juventude, Darwin creu na exis­tência de um Deus pessoal, em Cristo, na vida após a morte e em uma inter­pretação literal da Bíblia. Sua autobio­grafia, escrita para seus filhos, fala que ele foi um homem que se desenvol­veu com uma cosmovisão teísta.

Em 1828, aos 19 anos, Darwin ingressou em Cambridge para se tornar um clérigo. Naquele período de sua vida, ele acreditava na verdade absoluta e literal de cada palavra da Bíblia.6 Durante os três anos em que permaneceu estudando teologia em Cambridge, ele leu, com grande encanto, Evidences for Christianity [Evidências do cristianismo] e Natural Theology [Teologia natural], de William Paley, e julgou conclusivo o argumento teológico de Paley, de que o desígnio aparente na natureza apontava para um “Desenhista”.

Em 27 de dezembro de 1831, Darwin iniciou uma viagem de navegação que duraria vários anos. Durante o tempo em que passou a bordo de um navio chamado Beagle, Darwin ainda era estritamente ortodoxo: “Lembro-me sendo bastante caçoado por vários dos oficiais (não obstante eles também fos­sem ortodoxos) por citar a Bíblia como autoridade incontestá­vel acerca de algum aspecto a respeito de moralidade”.7

Após essa excursão, Darwin passou os anos seguintes (ou­tubro de 1836 a janeiro de 1839) cogitando sobre religião. Des­cobriu o que entendeu serem problemas com o registro bíblico e, apesar de, no início, relutar em abandonar sua fé, a descrença eventualmente triunfou: “Posso me lembrar de, por muitas e mui­tas vezes, inventar devaneios de cartas velhas entre o livro de Ro­manos e os manuscritos descobertos em Pompéia ou em outro lugar, os quais confirmaram, de maneira mais notável, tudo o que havia sido escrito nos evangelhos. Mas achei mais e mais difícil, mesmo dando asas à minha imaginação, inventar evidência que seria suficiente para me convencer. Assim a descrença veio sobre mim lentamente e, por fim, de maneira completa”.8

Darwin alegou que permaneceu um teísta por muitos mais anos e que esse quadro não mudou até a publicação de A ori­gem, quando seu teísmo começou a enfraquecer, embora a sua convicção no Deus do cristianismo já estivesse morta. Confor­me declarou: “O teísmo era forte em minha mente quando es­crevi A origem das espécies, mas foi a partir daquele período que, com muitas flutuações, ele tem gradualmente enfraquecido”.9

Em 1879, poucos anos antes da morte de Darwin (1882), um estudante alemão escreveu para inquiri-lo acerca de suas crenças religiosas. Um membro de sua família respondeu: “O Sr. Darwin considera que a teoria da evolução é bastante compa­tível com a crença em um Deus”.10

A rejeição de Darwin ao cristianismo e sua contínua crença em alguma forma de deidade é o quadro que a maioria das pessoas tem dele, e acreditamos que esse era justamente o quadro que Darwin quis retratar. A hipótese de um Darwin te­ísta pode ser levantada, porém, um estudo cuidadoso e com­pleto dos seus escritos revelam que o ateísmo não fez parte somente de um segundo período de sua vida (seguido de A origem). Sua descrença pode ser percebida muito antes do pe­ríodo reivindicado por Darwin.

DÚVIDAS DE DARWIN

A autobiografia de Darwin discute argumentos pró e contra a existên­cia de Deus. O antigo argumento, diz Darwin, do desígnio na natureza, con­forme apresentado por Paley, é falho, agora que a lei da seleção natural foi descoberta.11 Darwin também enca­rou o problema do sofrimento como um argumento bastante convincente contra a crença em Deus: “Um ser tão poderoso e tão cheio de conhecimen­to como um Deus, capaz de criar o Universo, sendo Deus, para as nossas mentes finitas, onipotente e onisciente, revolta a nossa compreensão quando supomos que a sua benevolência não é ilimitada. Pois, qual proveito haveria no sofrimento de milhões de animais de menor complexidade ao longo de um tempo quase infini­to? Esse antigo argumento, a partir da existência do sofrimento contra a existência de uma primeira causa inteligente, parece-me bastante forte; considerando que, como se observou aci­ma, a presença de tamanho sofrimento concorda bem com a visão de que todos os seres orgânicos foram desenvolvidos por variação e seleção natural”.12

Darwin argumentou que somente a seleção natural era ca­paz de responder aos fatos. Em sua cosmovisão, a seleção natu­ral era incompatível com Deus e pretendia substituí-lo. Darwin disse a Charles Lyell, em 1859: “Se fosse convencido de que fui eu quem requereu tais adições [novos poderes, atributos e forças] à teoria da seleção natural, eu a rejeitaria como coisa sem valor”.13 Em um material publicado em 1868, ele disse que ou Deus ou a seleção natural era desnecessário, deixando seus leitores decidi­rem entre um e outro.14 E chegou a se referir à sua teoria como evangelho do diabo,15 e chamou a teoria da seleção natural de “minha deidade”.16

Na conclusão da seção religiosa de sua autobiografia, Da­rwin resumiu sua posição: “O mistério da gênesis de todas as coisas é insolúvel a nós; e eu devo me contentar em permanecer agnóstico. Nada é mais notável que a expansão do ce­ticismo ou racionalismo durante a segunda metade da minha vida”.17

Apesar da reivindicação de Darwin, de que o ceticismo re­geu somente a última parte de sua vida, evidências, a partir de um grande número de anotações privadas, publicadas recente­mente (de 1836 a 1844), revelam que Darwin expressava crença no ateísmo e no materialismo já em maio de 1838, vários meses antes de desenvolver a teoria da seleção natural. Em 1838, as anotações encontradas num caderno eram, de acordo com o evolucionista Ernst Mayr, completamente materialistas.18 E, em julho daquele mesmo ano, ele escreveu: “Antes de mais nada, acredito em materialismo, digo somente que emoções, instintos, graus de talento, são hereditários porque o cérebro de uma criança se assemelha ao dos pais”.19Também tem sido trazido ao conhecimento que os comentários periféricos dos livros fisioló­gicos que Darwin estava lendo naquele período mostram que ele se aliou aos materialistas.20

Será que Darwin mentiu sobre sua posterior rejeição ao teísmo? Alguns parecem pensar que sim. Outros, como Neal Gillespies, tentaram reconciliar o teísmo de Darwin baseados em citações encontradas em um dos seus cadernos de anotações: “Eu sugeriria que não somente o materialismo de Darwin era, em sua mente, compatível com o teísmo, mas que isso não re­presentou nenhum interesse em um ateísmo filosófico radical ou materialismo metafísico”.21

O problema com a explicação de Gillespies é que ela não responde às outras anotações que eram tão aparentemente ateístas. Em uma carta escrita para J. D. Hooker, poucos anos depois, Darwin escreveu: “Estou quase convencido de que as espécies não são (isso seria como confessar um assassinato) imutáveis”.22

Muitos eruditos estão chegando à conclusão de que Da­rwin era, na verdade, um ateu bem antes da publicação de A origem.23 Howard Gruber declarou:” O material dá clara evidência para a compreensão de que, durante esse período, as ideias de Darwin eram, de fato, materialistas, com fortes tendências ao ateísmo, portanto, perigosas”.24 Stephen Jay Gould, do mes­mo modo, afirmou: “Os escritos de Darwin provam que ele es­tava interessado em filosofia e ciente de suas implicações. Ele sabia que a característica primária que distinguiria sua teoria de todas as outras doutrinas evolucionistas era sua inabalável filosofia materialista”.25

A AMBIGUIDADE DE DARWIN

Mostrando, ainda, sua inclinação ao ateísmo, os escritos de Darwin revelam, como já vimos anteriormente, que ele recor­reu à conversa sobre Deus em muitas ocasiões. A linguagem de Darwin sobre esse assunto é tão ambígua que há muito tem frustrado os estudiosos: “A ambiguidade de Darwin a respeito de Deus é notória. Afinal, o que se entende quando ele comen­ta sobre as leis impressas na criação pelo Criador e ainda cha­ma a criação especial de ridícula? No que estaria ele baseado quando, na mesma carta, escreve: ‘Eu não posso ser persuadi­do a pensar que um Deus beneficente e onipotente teria cria­do intencionalmente o icnêumone (inseto parasita), intentan­do, explicitamente, que fossem alimentados dentro dos corpos vivos de lagartas. Sou inclinado a olhar para tudo isso como sendo o resultado de leis propositadas, com os detalhes – quer sejam bons ou ruins – deixadas para o funcionamento do que pode ser chamado de chance. Todas essas leis foram expressamente intencionadas por um Criador onisciente, que previu cada evento e sua conseqüência”.26

Os escritos de Darwin permitiram que ambos os lados des­se debate achassem neles (nos escritos) o que quisessem en­contrar. No entanto, os que veem Darwin como teísta (ou deísta) enfrentam mais dificuldades para reconciliar as passagens ateístas com seu ponto de vista do que aqueles que veem Da­rwin como um ateu. A escola ateísta de Darwin ofereceu duas explicações plausíveis para a denominada linguagem teísta de Darwin.

Alguns acreditam que Darwin usou a conversa sobre Deus porque ele não queria ofender seus amigos e, especialmente, por não querer aborrecer sua esposa, Emma, que era uma mu­lher muito religiosa (cristã). Emma se casou com Charles em 1839, mas logo em seguida descobriu sua incredulidade. Ela escreveu para Charles demonstrando quão espantada estava e expressou o quão infeliz seria se Charles não lhe pertencesse por toda a eternidade.27

Anos depois, Edward Aveling e Ludwig Buchner almoçaram com Charles, Emma e alguns amigos chegados. Na presença de Emma, conversaram somente sobre assuntos científicos. Depois, num estudo privado e fora da presença de Emma, Darwin, imedia­tamente, iniciou uma troca de ideias sobre religião. Disse aos seus convidados o quanto sua esposa era ortodoxa em todos os aspec­tos e expressou o quanto sofreu para publicar suas descobertas científicas, a partir do fato de que suas declarações, em alguns casos, estavam sujeitas a ferir aqueles que eram muito próximos e queridos dele.28

Emma, certamente, influenciou Darwin a moderar seus es­critos. Mas acreditamos que havia uma razão mais significante por trás das ambiguidades de Darwin, que testemunhou a “crucificação” de muitos materialistas nos seus dias. Robert Chambers falou, repetidamente, a respeito de Deus em seu li­vro sobre evolução, em 1844, Vestíges of the Natural History of  Creation [Vestígios da história natural da criação], e foi criticado severamente e rotulado de materialista.29 Se Chambers não pôde alcançar aceitação, Darwin muito menos, pois sua teoria era materialista ao extremo.

Darwin não era apaixonado pela controvérsia, mas ela apa­receu mais tarde na publicação de As Origens. Quando, final­mente, o livro foi publicado, muitos rejeitaram sua teoria por razões religiosas. Em seus textos, havia sempre a possibilidade de reconciliar Deus com a teoria da seleção natural, portanto, acreditamos que Darwin moderou sua conversa sobre Deus para superar essa principal objeção.

Se tudo isso parece mera especulação, considere o que Da­rwin escreveu ao seu bom amigo J. D. Hooker, em 1863: “Há muito me lamento de ter-me submetido à opinião pública e usado o termo bíblico da criação. Com isso, quis realmente de­monstrar alguns processos completamente desconhecidos”.30

Recentemente, David Kohn mostrou que Darwin emendou passagens em sua dissertação, em 1844. Quanto a essa disser­tação, Emma fez alguns comentários e, por conta disso, Kohn acredita que Emma se tornou o modelo do convencional leitor vitoriano.31 A habilidade de Emma para alterar a construção dos textos de Darwin significa uma verdade crucial para Kohn: não se pode dar nenhum tipo de valor a uma única palavra da ambígua conversa sobre Deus em A origem.32

CONVERSÃO DE DARWIN?

Nos últimos anos da vida de Darwin, ele não redescobriu sua fé cristã, nem mesmo sua fé em Deus, ao contrário do que alguns reivindicam. Conforme mencionado anteriormente, Aveling e Buchner, dois militantes ateus, visitaram Darwin em 1881, um ano antes de sua morte. Em determinado momento do encontro, Darwin perguntou aos seus convidados: “Por que vocês se consideram ateus e afirmam que não há Deus?”.33 Ave­ling explicou que eles não diziam que Deus não existia; antes, já que não havia nenhuma evidência de deidade, eles não po­diam acreditar na ideia de haver um Deus e estavam, portan­to, à parte de Deus. Darwin concordou completamente com a posição deles, mas escolheu uma palavra diferente: “Concordo com o raciocínio de vocês, mas preferiria a expressão agnósti­co, em lugar da palavra ateu”.34

O duque de Argyll teve uma conversa semelhante com Darwin, um ano antes da sua morte. O duque mostrou alguns desígnios maravilhosos na natureza e sugeriu que eles eram a expressão de uma mente superior. Darwin olhou severamente para o duque e disse: “Bem, tal pensamento frequentemente vem à minha mente como uma força esmagadora; mas, em outras ocasiões, balançando a cabeça e ele parece ir embora”.35

Ainda que essas duas reuniões confirmem que Darwin per­maneceu na sua incredulidade, houve uma outra, porém, (que supostamente aconteceu com a senhora Elizabeth Hope, nos últimos dias da vida de Darwin) em que ele teria mencionado sua conversão ao cristianismo.

A história apareceu primeiramente no jornal Boston Watchman Examiner, em 1915:

“Foi numa daquelas gloriosas tardes de outono, período em que aproveitamos da Inglaterra. Então, pediram-me para me encontrar e sentar com o famoso professor Charles Darwin. Ele estava quase acamado por alguns meses, antes de morrer. Sen­tado numa cama, segurando uma Bíblia aberta, ele a estudava sem parar.

— O que você está lendo agora? — perguntei.

— Hebreus! — ele respondeu.

E prosseguiu ele, dizendo:

— Continuo em Hebreus, porque o chamo de o Livro Real. Isso não é formidável?.

Fiz algumas alusões às fortes opiniões expressas por muitas pessoas a respeito da história da criação, de sua magnificência e do tratamento que davam aos primeiros capítulos do livro de Gênesis. Ele parecia muito angustiado.

— Eu era um jovem com ideias informes. Lancei a público questões, sugestões, desejando saber, em todo o tempo, sobre tudo. E, para minha surpresa, as ideias pegaram como fogo sel­vagem. Pessoas fizeram delas uma religião.

Em seguida, pausou e disse, de repente:

—Tenho uma casa de verão num jardim que abriga aproxi­madamente trinta pessoas. Quero muito que você fale lá. Você falaria para eles?

— Sobre o que eu falaria? — perguntei.

A resposta veio de imediato:

— De Cristo Jesus!

Depois, acrescentou, em um tom mais baixo:

— E sobre a salvação que Cristo oferece. Não é este o melhor tema?36

Somente uma pequena parcela de cristãos alguma vez acreditou e propagou essa história. Os evolucionistas e a maio­ria dos criacionistas rejeitam-na. Por essa razão, é convincente a evidência contrária à conversão de Darwin no fim de sua vida.

A história contém inconsistências. Por exemplo, reivindica que Darwin estava quase que acamado por meses; mas, como um dos biógrafos de Darwin destacou, ele recusou ser acama­do e trabalhou enquanto teve forças.37 Surgiram também mui­tas versões diferentes a respeito dessa mesma história.38

Quando rumores a respeito da conversão de Darwin apa­receram primeiramente em 1887, o editor do Toronto Mail [Cor­reio de Toronto], Charles Deduchson escreveu para um amigo íntimo de Darwin, chamado Thomas Huxley, a fim de verificar se a história era verdadeira.39Huxley negou a alegação40 e re­meteu uma cópia da carta de Deduchson ao filho de Darwin, Francis, que, igualmente, negou a conversão do pai.

A filha mais velha de Darwin estava presente na ocasião da morte do pai e testemunhou que ele jamais havia conhecido a senhora Elizabeth Hope ou se retratado de suas opiniões cientí­ficas. Declarou, ainda, que toda essa história era uma invenção e que, provavelmente, teve sua origem nos Estados Unidos.41

A FÉ DE DARWIN

Pelo que parece, Darwin teve uma fé permanente e profunda em um materialismo ateu. A pergunta contro­versa que desejo apresentar agora é: “Será que as crenças ateístas e materialistas de Darwin tiveram alguma parti­cipação no desenvolvimento de sua teoria ou Darwin foi conduzido tão-somente pelos fatos?”.

Darwin queria que acreditássemos que somente os fatos o conduziram à sua teoria: “Meu primeiro caderno de anotações começou a ser escrito em julho de 1837. Trabalhei baseado so­mente nos princípios baconianos e, sem qualquer teoria, nos fatos colecionados em uma balança por atacado, mais espe­cialmente aqueles relacionados às produções domesticadas, às pesquisas impressas, às conversas com hábeis criadores e jardi­neiros e à extensa leitura”.42

Mas os escritos de Darwin também demonstram que os fatos tiveram uma participação muito pequena na formulação de sua teoria. Seus primeiros cadernos de anotações mostram que ele cogitou duas outras teorias da evolução antes que chegasse em sua teoria final. George Grinnell, em seu estudo sobre a primei­ra teoria da evolução de Darwin, faz a seguinte pergunta: “Essas três teorias eram complementares ou mutuamente exclusivas? Se eram complementares, então a implicação é clara em favor da im­portância dos dados empíricos moldando o raciocínio de Darwin. Mas se eram mutuamente exclusivas, isso implica em que Darwin chegou às informações com uma cosmovisão prévia, a qual ten­tou sobrepor às informações, e fez isso por meio de vários meca­nismos e modelos hipotéticos”.43

Grinnell chegou à convicção de que os três modelos de Da­rwin eram, de fato, mutuamente exclusivos. Darwin rejeitou a primeira teoria (variação por isolação) porque continha muitas anomalias. Então, voltou sua atenção para a segunda teoria (variação por hábito). Mas logo abandonou a segunda pela ter­ceira teoria (variação por procriação doméstica), a qual veio a se tornar a mais proveitosa. Até que ponto ele estava disposto a forçar uma teoria? Diante de seu colapso para entreter no­vas teorias, Grinnell sugere que Darwin estava filosoficamente inclinado a transmutar teorias por razões que transcendem os dados empíricos com os quais ele originalmente trabalhou.44

Em vez de permitir evidência contrária à sua teoria, como faria um bom cientista, Darwin apresentou uma variedade de hipóteses para que sua teoria não fosse considerada falsa.45

Mais tarde, ele abraçou teorias que havia ridicularizado anteriormente, tais como: o lamarckismo (a teoria que defende que a evolução acontece pela herança de ca­racterísticas adquiridas pelo uso ou desuso de partes do corpo) e o selecionismo, para resolver problemas espe­ciais que a seleção natural não pôde resolver.46

Mais adiante, Darwin admitiu que sua teoria estava fundamen­tada completamente em considerações gerais (isto é, na luta pela sobrevivência) e, quanto a este assunto, a teoria requer fé: “Quan­do chegamos aos detalhes, não é possível provar que alguma espécie mudou ou que as supostas mudanças são benéficas, ou seja, as mudanças que representam a base da teoria. Nem pode­mos explicar porque algumas espécies mudaram e outras não”.47 A teoria de Darwin não era científica, como ele reivindicou que fos­se. Ele tinha tamanha fé cega no materialismo que estava disposto a ignorar ou a dobrar suas observações, e chegou a argumentar a respeito, com uma diversidade de raciocínios, a ponto de chegar a um nível sem precedente.

Por que Darwin mentiu acerca de como sua teoria foi formulada? O conselho que ele deu a John Scott, em 1863, pode nos fornecer a resposta: “Eu sugeriria a você, no mo­mento, a evitar introduzir a teoria em seus documentos. Deixe a teoria guiar suas observações, mas até que sua reputação esteja bem estabelecida, poupe-se de publicar a teoria. Publicá-la faria as pessoas duvidarem de suas ob­servações”.48 Darwin reconhecia que as pessoas são mais hábeis para aceitar uma nova teoria se acreditarem que a teoria surgiu dos fatos, em vez de uma ideia preconcebi­da, especialmente se a teoria for inerentemente ateísta.

Estudiosos como George Grinnell, que, durante anos, ob­servou Darwin, estão chegando também a uma conclusão se­melhante: “Tenho pesquisado bastante a respeito de Darwin e posso dizer, com alguma garantia, que ele não originou sua te­oria a partir da natureza, mas, em vez disso, colocou certa cosmovisão filosófica sobre a natureza e, então, passou vinte anos tentando juntar os fatos para torná-la convincente”.49

A compreensão popular das crenças de Darwin e de suas práticas, como um cientista, é contraditória aos fatos. A teoria de Darwin nunca tencionou ser compatível com um Criador. Seu propósito era remover Deus da última esfera da vida que pudesse estar debaixo de seu governo. Era uma tentativa de demolir o argumento de Paley sobre o desígnio na natureza e oferecer ao ateísmo sua própria história da criação.

NOTAS

  1. DARWIN, Charles. A origem das espécies. São Paulo: Editora Martin Claret, 2004.
  2. HARDIN, Garrett Hardin. Nature and Mans Fate. NewYork: Mentor, 1959^ p.216.
  3. Em 1860, Sedgwick classificou a teoria de Darwin como um frio materialismo ateístico. HULL, David L. Darwin and His Crítics: The Reception of Darwins Theoiy of Evolution by the Sdentific Community. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1973, p.161.
  4. DAWKINS, Richard. 0 relojoeiro cego. Lisboa: Edições 70:1988, p.6.
  5. DARWIN, Charles. Autobiografia 1809-1882. Rio de Janeiro: Contraponto Editora: 2000, p.57.
  6. ,p.85.
  7. , p. 86,87.
  8. , p.93.
  9. Family Member.The Life and Letters of Charles Darwi. 2 vols., ed. Francis Darwin. NewYork: Basic Books, 1959,1:277.
  10. DARWIN, Garies. Lisboa: Relógio D’Água, 2004, p.87.
  11. , p.90.
  12. Darwin, Life and Letters, 2:6.
  13. DARWIN, Charles. Variations of Domesticated Animais and Plants, 2. NewYork: D. Appleton and Company, 1896, p. 428.
  14. DARWIN, Charles. The Correspondence of Charles Darwin, 8,1860, ed. Frederick Burkhardt.

Cambridge: Cambridge University Press, 1993, p.316.

  1. Darwin, Life and Letters, 2:165.
  2. DARWIN, Charles. Autobiografia, Escritores, como Maurice Mandelbaum, têm corretamente considerado o agnosticismo de Darwin como uma forma não-dogmática de ateísmo. Darwins Religious Views, Journal of the History of Ideas 19 (June 1958): 376.
  3. . MAYR, Emst. One Long Argument: Charles Darwin and the Genesis of Modem EvolutionaryThought. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1993, p.15.
  4. DARWIN, Charles. Charles Darwins Notebooks, 18361844: Geology.Transmutation of Species, Metaphysical Enquiries, ed. Paul H. Barrett et al. Ithaca, NY: ComelI University Press, 1987, M57,53233.
  5. KOHN, David. Darwins Ambiguity:TheSecularization of Biological Meaning. British Journal forthe History of Science 22 (1989): 224.
  6. GILLESPIE, Neal C. Charles Darwin and the Problem of Creation. Chicago: University of Chicago Press, 1979, p.139.
  7. DARWIN, Charles. More Letters of Charles Darwin, 2, ed. Francis Darwin and A. C. Seward. London: John Murray, 1903,1:4041; veja também Life and Letters, 1:384.
  8. SCHWEBER, Silvan. The Orígin ofthe Origin Revisited, Journal of the History of Biology 10,2 (1977): 23334; MAYR, Emst. Darwin and Natural Selection, American Naturalist (MayJune 1977): 323; GHISELIN, Michael. The Individual in the Darwinian Revolution, New Literary History 3,1 (1971): 122.
  9. GRUBER, Howard. Darwin on Man. NewYork: E. P Dutton and Company, 1974, p.14.
  10. GOULD, Stephen Jay. EverSince Darwin. NewYork: W.W. Norton, 1979, p.24.
  11. KOHN, David. Darwins Ambiguity: The Secularization of BiologicalMeaning. British Journal forthe History of Science 22 (1989): 21516.
  12. DARWIN, Charles. Lisboa: Relógio D’Água, 2004, p. 237.
  13. AVELING, Edward. Charles Darwin and Karl Marx. New Century Review 1 (1897): 322.
  14. Por exemplo, um crítico declara que Chambers é, pelo menos, consistente em seu materialismo. “Nós não temos nada, mas exclusivamente a afirmação; e nós o desafiamos a provar este único ponto de vista”. SEDGWICK, Adam. Review of Vestiges ofthe Natural History of Creation. In Edinburgh Review 82 (July 1845): 12.
  15. Darwin, Life and Letters, 2:2023.
  16. Em referência à rainha Vitória, da Inglaterra, ou à sua época (1819-1901).
  17. KOHN, David. Darwins Ambiguity.The Secularization of Biological Meaning. British Journal for the History of Science 22 (1989): 226.
  18. AVELING, Edward. Charles Darwin and Karl Marx. New Century Review 1 (1897): 323.
  19. AVELING, Edward Aveling. AVisit to Charles Darwin. National Reformer 40,18, Outubro 29,1882:292.
  20. DARWIN, Charles. In: Duke ofArgyll, What Is Science? Good Words 26 (1885): p. 244.
  21. CAUDILL, Edward. Darwinian Myths. KnoxvilleJN: University ofTennessee Press, 1997, p. 47.
  22. IRVINE, William. Apes, Angels, andVictorians NewYork:Time, 1955, p.277.
  23. SLOAN, Pat. The Myth of Darwins Conversion. Humanist (British) 75 (March 1960): 7072.
  24. DAWS0N,Warren. The Huxley Papers. London: Imperial College of Science and Technology, 1946,34, letter 13.136.
  25. , 13.138.
  26. Garles. Autobiografia. Lisboa: Relógio D’Água, 2004, p.l 19; Darwin, Life and Letters, 2:371,412.
  27. GRINNELL George. The Rise and Fali ofDarwin’s FirstTheory ofTransmutation. Journal of the History of Biology 7,2 (Fali 1974): 259.
  28. , p.273.
  29. Hull’s book Darwin and His Critics (ver n°03).Trata-se de uma compilação de muitas criticas dirigidas a Darwin pelos seus contemporâneos. Outra obra que contém esta e outras objeções é: MIRVAT, George. The Genesis of Species. NewYork: D. Appleton and Company, 1871.
  30. EISELEY, Loren. Darwin’s Century. NewYork: Doubleday, 1961, p.209-11; RUSE, Michael. Charles Darwin and Group Selectionism. Annals of Science 37 (1980): 627.
  31. Life and Letters, 2:210.
  32. Darwin, More Letters, 2:323,
  33. , 2:323.
  34. GRINNELL, George. Reexamination ofthe Foundations. Pensee 2,2 (May 1972): 44.

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FONTE: CHRISTIAN RESEARCH JOUNAL, VOL 29, N° 2 – 2006

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