Será que foi Deus que nos fez pecar?

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Será que foi Deus que nos fez pecar?

O calvinista convicto Jonathan Edwards “resolveu” o problema da predestinação e do livre-arbítrio afirmando que: 1) Livre-arbítrio é fazer o que desejamos; 2) mas Deus nos da o desejo de fazer o bem. E que dizer do desejo para o mal? Isso vem de nossa natureza caída, que deseja somente o mal. A parte de Deus dando-nos o desejo de fazer o bem, naturalmente desejamos fazer o mal.

Contudo, os fieis seguidores de Edwards admitem que essa solução não resolve o problema sobre onde Lúcifer e Adão obtiveram o desejo para seu primeiro pecado. R. C. Sproul chama isso “problema torturante”, acrescentando: “Uma coisa e absolutamente impensável, que Deus possa ser o autor ou executor do pecado”. Todavia, esse problema e “torturante” somente porque Sproul crê na lei da não contradição, e parece ser uma contradição sustentar todas estas premissas, da maneira em que ele o faz:

1) Deus não pode dar a ninguém o desejo de pecar.

2) Originariamente, nem Lúcifer nem Adão tinham natureza pecaminosa.

3) A vontade não se move a menos que seja dado um desejo por Deus ou por sua natureza.

Aqui esta uma conclusão inequívoca: tanto Lúcifer quanto Adão pecaram. Mas Sproul não quer desistir das premissas 1 e 2 em hipótese alguma. Entretanto, a premissa 3 deve ser falsa, visto que e contraditória as outras premissas que ele crê serem absolutamente verdadeiras, porque e certo que Lúcifer não tinha natureza má, nem Deus lhe deu o desejo de pecar.

Inversamente, se os seguidores de Jonathan Edwards insistem em agarrar-se a sua ideia defeituosa da liberdade humana, então seu Deus deve ser punido por dar a Lúcifer e a Adão o desejo de pecar. Pois se a vontade original da criatura perfeita fica em posição neutra (não possuindo nenhuma natureza pecaminosa para movê-la em direção ao pecado) ate que Deus a mova, resta então somente uma pessoa no universo a quem responsabilizar — Deus! Não importa quão “torturante” possa ser, eles devem tanto culpar Deus pela origem do mal quanto desistir da ideia do livre-arbítrio como sendo a capacidade que alguém tem de desejar de acordo com a natureza humana, ou ainda, desistir da ideia de que Deus deu esses desejos.

QUEM ME FEZ PECAR?

Se nem o Diabo nem Deus me fizeram pecar, quem fez? A resposta bíblica e que fui eu. Isto e, “eu mesmo” sou a causa do mal. Como? Por meio desse bem, a livre-escolha, que Deus me deu.

Não é verdade que cada evento tem uma causa?

Os calvinistas radicais objetam ao raciocínio acima afirmando que cada evento tem uma causa — ate mesmo as nossas ações. Afirmar que Deus não causou nossas ações significaria que ha efeito sem causa — o que e absurdo. Em resposta a esse raciocínio, diversas coisas devem ser observadas.

Primeiramente, cada evento tem realmente uma causa. Mas nem toda causa tem uma causa, afirmativa com a qual os próprios calvinistas radicais concordam. Cada pintura tem um pintor, mas o pintor não e pintado. Além disso, se cada causa tivesse uma causa, então Deus não seria a primeira Causa não-causada. Portanto, e ainda mais absurdo perguntar “Quem fez Deus?”. Deus e o Criador incriado. E também absurdo perguntar “Quem criou o Incriado”? Ninguém criou o Incriado. Ele simplesmente e o Incriado.

Levar a pergunta um pouco mais longe e como insistir em que deve haver uma resposta a pergunta “Quem e a mulher do solteirão?”.

Solteirões não tem mulher, e o Ser não-causado não possui uma causa.

De modo análogo, se a criatura, por meio do bom poder da livre escolha, e a primeira causa do mal, então nenhuma causa dessa ação má deve ser procurada em outro lugar que não na própria pessoa que a causou.

Em segundo lugar, a objeção do calvinista extremado erroneamente presume que uma ação má deve ser causada por outra pessoa ou coisa, ou ela não e causada de forma alguma. O pensamento vai mais adiante por dizer que cada evento e tanto causado quanto não-causado, e sabidamente não ha outras opções logicas. Nem o calvinista extremado nem o moderado (ou mesmo o arminiano) creem que as ações, mas não possuam causa ao menos por duas razoes: para um, e uma violação desta regra fundamental da razão: todo efeito tem uma causa. Ate o famoso cético David Hume negou que tenha afirmado tal coisa “absurda”, de que as coisas surgem sem uma causa.

Além disso, se as ações, mas não possuem causa, então ninguém pode ser considerado responsável por elas. Mas ambas, a razão moral boa e a Escritura, informam-nos que as criaturas livres são consideradas moralmente responsáveis por suas escolhas. Lúcifer foi condenado a separação terna de Deus por sua rebelião contra ele (Ap 20.10; lTm 3.6), como foram os anjos que caíram com ele (Ap 12.4,12; Jd 6 e 7). De igual modo, Adão e Eva foram condenados por suas ações (Gn 3.1-19; Rm 5.12).

Contudo, se nossas ações são causadas, não esta correta a ideia dos calvinistas extremados de que elas devem ser causadas por outra pessoa?

De forma alguma. Essa perspectiva faz vista grossa a uma alternativa muito importante, a saber, a de que elas foram causadas por nos mesmos. Cada ação verdadeira e tanto causada quanto não-causada.

Isso exaure as possibilidades logicas. Mas não se segue que cada ação seja não-causada por ninguém ou causada por outra pessoa. Ela pode ter sido causada por mim mesmo. Ha três possibilidades: minhas ações são: 1) não-causadas; 2) causadas por outra pessoa (ou coisa); 3) causadas por mim mesmo. E muitas razões dão suporte a ultima ideia.

QUEM ME LEVOU A FAZÊ-LO?

Novamente, os calvinistas extremados objetam que uma ação Auto causada é contradição de termos. Segundo essa linha de pensamento, nada pode causar a si mesmo. Não podemos, por exemplo, levantar a nos mesmos por esforço próprio. Uma causa e sempre anterior ao seu efeito (na existência ou mesmo no tempo). Mas não podemos ser anteriores a nos mesmos. Assim, parece seguir-se que uma ação auto causada e impossível, sendo racionalmente absurda.

Aqui, também, os calvinistas extremados apresentam um entendimento indevido fundamental. Um ser auto causado e impossível pela razão que eles dão, mas isso não e verdade quanto à ação auto causada.

E verdade que não podemos existir antes de vir a existir ou de ser antes de vir a ser. Mas podemos e devemos ser antes de poder fazer.

Isso quer dizer que devemos existir antes de poder agir. Portanto, as ações auto causadas não são impossíveis. Se fossem, então Deus, que não pode fazer o que e impossível (v. tb. Hb 6.18), não teria sido capaz de criar o mundo, porque não havia ninguém ou nada mais para causar a existência do mundo antes de o mundo existir, exceto o próprio Deus. Se o ato da criação não foi auto causado por Deus, não poderia ter acontecido, visto que Deus, a Causa não-causada, e o único que poderia ter realizado aquela ação.

De igual modo, se as ações auto causadas não são possíveis, então não ha nenhuma explicação para o pecado de Lúcifer. Porque, novamente, um Deus impecável não poderia ter causado o pecado em Lúcifer (Tg 1.13). Visto que Lúcifer foi o primeiro a pecar, a sua ação deve ter sido auto causada, ou ele nunca teria sido capaz de pecar.

Segue-se que as ações auto causadas são possíveis. Mesmo calvinistas moderados como W. G. T. Shedd admitem isso. Disse ele: “Um ato positivo da autodeterminação angélica e necessário. […] Nada além da espontaneidade da vontade pode produzir o pecado; e Deus não opera na vontade para causar espontaneidade ao pecado” (Dogmatic Theology, v. 1, p. 420), Talvez a razão para que as ações auto causadas não sejam possíveis para alguns esteja no próprio termo “auto causado”. Isso pode ser mais bem entendido se falarmos de nossas ações como “causadas por mim mesmo” (em oposição a “causadas por outro”). Ações não causam a si mesmas, mas alguem pode causar uma ação. Falar dessa maneira eliminaria a ambiguidade que da surgimento a ideia falsa de que uma ação auto causada e impossível.

POR QUE O FIZ?

Por que faço o que faço? Minha formação, meu treinamento e meu ambiente não afetam o que faço? Sim, afetam, mas não me forçam a pecar. Afetam minhas ações, mas não a efetuam (i.e., causam). Influenciam, mas não controlam minhas ações. Que ainda tenho o poder de fazer escolhas morais livres e verdadeiro por diversas razões.

Em primeiro lugar, ha uma diferença entre características físicas herdadas (como olhos castanhos), sobre as quais não tenho controle, e tendências espirituais herdadas (como a luxuria), sobre as quais devo ter controle. Não podemos evitar o tamanho básico, a cor, os talentos ou o grupo étnico do qual viemos. Mas temos escolha com respeito a seguir impulsos espirituais que podemos ter herdado, como impaciência, ira, orgulho ou impureza sexual. Nenhuma dessas tendências desculpa nossas ações, mas que procedem delas, como a violência física, assassínio ou perversão sexual.

Podemos sentir o impulso de dar um tapa em alguém que nos diz alguma coisa repugnante a nosso respeito, mas podemos escolher não agir sob esse impulso. Moralmente falando, “impulsos irresistíveis” são impulsos que não foram resistidos. Pessoas tem morrido por falta de água e de comida, mas ninguém e lembrado como tendo morrido por falta de sexo, álcool ou outras drogas para satisfazer desejos ardentes!

Temos a livre-escolha em todas essas áreas. Em segundo lugar, ha uma diferença entre escolhas morais e escolhas amorais (não-morais). Nossas preferencias por cores não se relacionam com moral e são, em grande parte, determinadas. Mas escolher ser racista com base na cor da pele de uma pessoa e um problema moral, não um ato que não podemos evitar.

Finalmente, aqueles que afirmam que todas as ações possuem uma razão e que essa razão determina o que fazemos, frequentemente falham em distinguir devidamente um proposito de uma causa. O proposito e por que eu ajo. A causa e o que produz o ato. O proposito e causa final (aquela para a qual agimos), mas a causa e causa eficiente (aquela pela qual agimos). Nem um alvo ou meta de um ato produz um ato humano livre. Ele e simplesmente o proposito para o qual escolhemos agir. Se escolhermos trapacear ou roubar, fazemos isso livremente, embora a ganancia possa ter sido o propósito para fazer isso. As ações morais surgem de nossas escolhas, não importam quais tenham sido os propósitos para elas.

Extraído do livro ELEITOS, MAS LIVRES, EDITORA VIDA

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