Romanos 9.20-21

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Os israelitas étnicos incrédulos têm o direito de criticar o juízo de Deus? – O oleiro e o barro

Esta é parte de uma série de postagens sobre a carta de Paulo aos Romanos.

Tendo chegado ao centro da estrutura de Romanos 9: 6-29 (a seção C2-B1) agora estamos prontos para começar a viagem de volta neste post. Na sequência do verso 20a (“Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas?”), Paulo continua assim:

“[20b] Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?”

O sentido da pergunta “Por que me fizeste assim?” é uma objeção que está respondendo a Deus (cf. v. 20a) – ou seja, o objetor israelita étnico pode ser parafraseado como dizendo “você não deveria ter me feito assim”. Essa objeção, que se expressa na forma de uma pergunta, corresponde na estrutura com a objeção do verso 19 do “Por que se queixa ele ainda?”, que pode ser parafraseado como significando “você não deveria estar encontrando defeitos em mim”.

Ser feito “assim” (verso 20b) corresponde à posição dos descrentes israelitas étnicos de estarem fora da bênção de Deus e, antes estão experimentando o juízo de Deus devido à sua rejeição de Cristo (com esse julgamento envolvendo ser endurecido).

Paulo está comparando a objeção de “você não deveria estar me julgando” (a partir do versículo 19) para a situação de um vaso moldado (por exemplo, um pote) dizendo para a pessoa que o moldou, “você não deveria estar me fazendo como um desses” – claramente uma situação ridícula.

O verso 20b é uma pergunta retórica de Paulo. A questão de Paulo é que, como o moldador [oleiro] tem o direito de fazer o que quiser com o material que ele tem, então Deus tem o direito de fazer o que quiser do que ele tem. Portanto, Deus tem o direito de julgar aqueles que ele considera adequado julgar. Ninguém sendo julgado tem o direito de dizer a Deus que Ele não deve julgá-los.

Como vimos a partir de declarações semelhantes antes, a afirmação de que Deus tem o direito de julgar quem quer e julgá-los da maneira que Ele quer não diz nada sobre como [ou porquê] Deus decidiu julgar. Paulo está respondendo a uma objeção antecipada de pessoas que não vão gostar de sua explicação sobre quem Deus decidiu julgar. Paulo está explicando-lhes que eles não têm o direito de reclamar sobre isso. Nós já sabemos que a explicação de Paulo de quem Deus decidiu julgar é que Deus decidiu julgar aqueles que rejeitam a Cristo e se recusam a arrepender-se (Romanos 2: 1-5). Um aspecto desse julgamento é endurecê-los em resposta à sua rejeição de Cristo, mas isso não indica que eles estarão sempre nesse estado de julgamento.

“[21] Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra? ”

Esta é outra pergunta retórica, estabelecendo que o oleiro tem o direito de fazer dois tipos de vasos do mesmo barro. Nesta ilustração, o oleiro é Deus, e o barro são os israelitas étnicos (ver abaixo). O “vaso para uso honroso’ são aqueles israelitas étnicos que estão recebendo a bênção de Deus (isto é, aqueles que estão confiando em Cristo). O “vaso para uso desonroso” são os israelitas étnicos restantes que estão fora da bênção de Deus (isto é, aqueles que rejeitaram a Cristo). Paulo está estabelecendo que Deus tem o direito de incluir alguns israelitas étnicos na bênção de Deus, e de excluir outros. Mais uma vez, a afirmação de que Deus tem o direito de fazer isso não diz nada sobre como [ou por quê] Deus decidiu que israelitas étnicos serão incluídos na bênção de Deus, ou se israelitas étnicos individuais atualmente não incluídos na bênção de Deus podem mudar de lado e receber a bênção de Deus.

O verso 21 corresponde em estrutura com o verso 18: “Logo, pois, compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer.”. Este é outro versículo que afirma o direito de Deus para fazer o que lhe agrada em ter duas categorias de pessoas, sem explicar como [ou porquê] Deus decidiu que as pessoas vão estar em cada categoria, e sem abordar a questão de se ou não alguém que foi endurecido pode tornar-se alguém em quem Deus tem misericórdia. [veja Romanos 11: 17-24, com ênfase no verso 20 que afirma que o critério dessa mudança é a crença ou a descrença].

A analogia do oleiro e do barro usada por Paulo aparece no Antigo Testamento. Essa analogia aparece brevemente em Isaías 29:16 e 45: 9, que Paulo alude no verso 20b. A sua mais extensa aparição é em Jeremias 18. Veremos que o seu uso lá se encaixa com o contexto que vimos em Romanos. Aqui está Jeremias 18: 1-11:

1A palavra do SENHOR, que veio a Jeremias, dizendo: 2 Levanta-te, e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. 3 E desci à casa do oleiro, e eis que ele estava fazendo a sua obra sobre as rodas, 4 Como o vaso, que ele fazia de barro, quebrou-se na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos olhos do oleiro fazer. 5 Então veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: 6 Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? diz o Senhor. Eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel. 7 No momento em que falar contra uma nação, e contra um reino para arrancar, e para derrubar, e para destruir, 8 Se a tal nação, porém, contra a qual falar se converter da sua maldade, também eu me arrependerei do mal que pensava fazer-lhe. 9 No momento em que falar de uma nação e de um reino, para edificar e para plantar, 10 Se fizer o mal diante dos meus olhos, não dando ouvidos à minha voz, então me arrependerei do bem que tinha falado que lhe faria. 11 Ora, pois, fala agora aos homens de Judá, e aos moradores de Jerusalém, dizendo: Assim diz o Senhor: Eis que estou forjando mal contra vós; e projeto um plano contra vós; convertei-vos, pois, agora cada um do seu mau caminho, e melhorai os vossos caminhos e as vossas ações.

O oleiro estava fazendo um vaso, mas o vaso “quebrou-se na mão do oleiro” (versículo 4). O oleiro não o quebrou, mas antes esta foi uma ação do vaso. Em resposta a isso, o oleiro o refez em outro vaso.

O verso 6 nos mostra que o barro corresponde aos israelitas étnicos. Os versículos 7-10 falam de Deus anunciando alguma coisa, mas dando às pessoas a oportunidade de responder antes do que o que Deus anunciou ocorresse. Se Deus anuncia punição, e a nação, em seguida, se arrepende do seu mal, então Deus vai reagir a isso e não dará ao povo o castigo que ele havia anunciado (versos 7-8). O inverso também é verdadeiro (versículos 9-10). Assim, a razão pela qual alguns são punidos por Deus é que eles não prestaram atenção à advertência dada a eles e, portanto, não se converteram dos seus maus caminhos, e a razão pela qual os outros são abençoados por Deus é que eles confiaram em Deus e prestaram atenção à advertência dada a eles, se arrependendo dos seus maus caminhos. Deus decide como tratar as pessoas com base em sua resposta a sua advertência graciosamente oferecida. Todos eles foram avisados e todos, portanto, tiveram a oportunidade de se arrepender.

A história do oleiro e do barro tem uma forte correspondência com a situação dos israelitas étnicos dos dias de Paulo. Os israelitas étnicos deveriam supostamente ser um “reino de sacerdotes” (Êxodo 19: 5-6) através de quem Deus se faria conhecido no mundo inteiro (1 Reis 8: 41-43, 59-60). No entanto, muitos dos companheiros de Paulo, os israelitas étnicos “rejeitaram o propósito de Deus para si mesmos” (Lc 7:30). Assim como o oleiro na história decide fazer outra coisa com o barro em resposta ao fato de ter quebrado em sua mão, de modo que Deus responde à rejeição a Ele pela maioria dos israelitas étnicos, fazendo outra coisa com eles. Deus está determinado a tornar-se conhecido no mundo, e a intenção era para os israelitas étnicos serem as pessoas que mostrariam ao mundo quem é Deus. Com a rejeição pela maioria dos israelitas étnicos do propósito de Deus para eles, Deus decide usar os israelitas étnicos descrentes de uma maneira diferente, a fim de alcançar seu objetivo de tornar-se conhecido. A maneira diferente que Deus escolhe é endurecer os israelitas étnicos descrentes, que resulta no mundo que vem a ouvir sobre Deus. Paulo fala sobre isso ainda mais em Romanos 11, como vimos no que diz respeito a Romanos 11:11.

Ligando isto a Romanos 9:21, Paulo refere-se a fazer, do mesmo barro (isto é, os israelitas étnicos), um “vaso para uso honroso” e um “vaso para uso desonroso”. O “vaso para uso honroso” são aqueles israelitas étnicos que estão confiando em Cristo, e o “vaso para uso desonroso” são aqueles israelitas étnicos que rejeitaram Cristo. Os israelitas étnicos que estão confiando em Cristo estão sendo usados por Deus para o “uso honroso” de tornar Deus conhecido no mundo. Os israelitas étnicos que rejeitaram Cristo estão sendo usados por Deus para o “uso desonroso” de serem endurecidos, que também indiretamente resulta em Deus sendo dado a conhecer ao mundo (como explicado através do link acima sobre Romanos 11:11).

O verso 21 está, portanto, afirmando que Deus tem o direito de usar alguns israelitas étnicos para “uso honroso” e alguns para “uso desonroso”. O verso 21 não aborda a questão de como [ou por quê] Deus decide quais israelitas étnicos seriam incluídos em cada categoria, nem aborda a questão de saber se é possível para um israelita étnico individual que atualmente faz parte dos “vasos para uso desonroso” mudar de categoria para se tornar parte dos “vasos para uso honroso”. Em relação à primeira questão, vimos acima que Deus decidiu que o critério para determinar que vaso cada Israelita étnico será é o critério de se ou não esse Israelita étnico está confiando em Cristo (em caso afirmativo: uso honroso, se não: uso desonroso). Quanto à segunda questão, temos que olhar para outros versos para considerar se é possível para um israelita étnico individual mudar de categoria de ser usado em “uso desonroso” para ser usado como “uso honroso”.

A terminologia dos “vasos” para “uso honroso” e “uso desonroso” de Romanos 9:21 também é usada por Paulo em sua segunda carta a Timóteo. Isso também nos ajuda a compreender o seu significado. Aqui está 2 Timóteo 2: 20-22:

20 Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. 21 De sorte que, se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra. 22 Foge também das paixões da mocidade; e segue a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro, invocam o Senhor.

Paulo refere-se novamente aos dois tipos de vasos. Note-se que Paulo considera que é possível para um indivíduo que é um “vaso para uso desonroso” mudar o seu estado para se tornar um “‘vaso para uso honroso”. Os dois tipos de vasos são duas categorias fixas, mas uma pessoa que é um vaso para uso desonroso pode mudar de categoria para tornar-se um vaso para uso honroso. Isto é o que acontece quando alguém se torna um cristão. Portanto, as pessoas individuais não estão permanentemente e imutavelmente fixas como um determinado tipo de vaso, mas o seu tipo de vaso pode mudar, dependendo de como eles respondem a advertência graciosa de Deus.

No próximo post, vamos continuar com Romanos 9: 22-23.

Por KINGSWOODHART – Tradução Walson Sales

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