Explicando a teologia dos Adventistas do Sétimo Dia (ASD) da “redenção inacabada”, EGW declarou:
“Assistido pelos anjos celestiais, nosso grande sumo sacerdote penetra no lugar santíssimo e ali comparece na presença de Deus, para se empenhar nos últimos atos de sua ministração em favor do homem. executar o juízo investigativo e fazer expiação por todos que são tidos por dignos de receber seus benefícios… A obra do juízo investigativo . o pagamento dos pecados devem cumprir-se antes do segundo advento do Senhor. Visto que os mortos devem ser julgados pelas coisas escritas nos livros, é impossível que os pecados dos homens sejam eliminados antes do término do juízo, onde seus casos são investigados… No tempo apontado para o juízo, o encerramento dos 2.300 dias em 1844, teve início a obra de investigação e eliminação dos pecados” (A Grande Controvérsia entre Cristo e Satanás, White, 2009, p. 472,476).
Um dos maiores problemas com todas essas afirmações de EGW é não conseguirmos harmonizar tais pensamentos com aquilo que está revelado nas Escrituras. Para se chegar a tais resultados interpretativos, se faz necessário tirar versículos de seus contextos, e reinterpretar palavras, dando-lhes um sentido além do que tem sido exposto pelos autores bíblicos.
Jesus, em João 5.24, afirma que quem crê nele não entra em “juízo”, mas passou da morte para a vida. A palavra “juízo” que aparece no original grego é krisis, que ocorre várias vezes nas Escrituras neotestamentárias, transmitindo a ideia de condenação, justiça, julgamento,, além de juízo. Por exemplo, nas quatro ocorrências dessa mesma expressão em outra obra joanina, Apocalipse, sempre o contexto tem sido de juízo vingativo contra o mundo ou a chamada “Babilônia” (14.7; 16.7; 18.10; 19.2). Em nenhuma citação transmite a ideia de um “juízo avaliativo” com relação aos salvos.
A Bíblia afirma que passaremos pelo tribunal de Cristo, que segundo a declaração bíblica se trata de um tribunal de premiação ou não, pelas obras realizadas pelos salvos (2Co 5.10). Paulo não menciona um tribunal onde se faz “expiação” ou “eliminação” dos pecados conforme sugeriu EGW em texto escrito por ele, pois a Bíblia é enfática ao declarar que tanto a expiação, quanto a eliminação de nossos pecados de culpa diante de Deus, já foram realizadas por Cristo a nosso favor, não precisando, portanto, termos nossas obras julgadas para saber quem será “digno” da vida eterna ou não.
O tribunal de Cristo é mencionado no Novo Testamento como o bema, que não era um tribunal de julgamento ou assento judicial na Grécia antiga, mas uma plataforma ou tribuna por onde passavam todos os corredores olímpicos diante do juiz, ou presidente da arena, para serem por ele recompensados. O tribunal de Cristo, pelo qual todos os salvos passarão, é um tribunal de prestação de contas, não no sentido de possibilidade de perdermos nossa salvação. Paulo, ao mencionar esse grande dia em I Coríntios 3.11-15, deixa claro que é apenas a qualidade da obra que estará em jogo, não o executor da mesma. O verbo grego zemiothesetai (sofrer dano, perda, prejuízo) aparece em outras referências bíblicas, para descrever apenas a perda de uma possível possessão (Mt. 16.26; Mc. 8.36; Lc. 9.25; Fp. 3.8), e não a punição eterna ou perda do benefício da salvação, com sugerido por alguns a partir da leitura do texto “sofrer dano”. Os salvos perderão galardões por sua forma displicente de viver o Cristianismo, mas não poderão perder a sua possessão eterna, porque ela está firmada somente na obra de Cristo, e não nos homens.
Outro grave problema com a redenção inacabada do adventismo é que Pedro afirmou que o arrependimento que conduz à salvação em Cristo “apaga” ou “cancela” os pecados (At. 3.19). A palavra que aparece no texto original é o verbo exaleiphthenai, que em sua ocorrência em outros lugares da Bíblia traz sempre a ideia de eliminar algo completamente, apagar, remover, retirar:
- A eliminação completa da dívida da lei (Cl. 2.14);
- A remoção completa da tristeza e dor dos salvos (Ap. 7.17; 21.4).
- O ato de apagar ou riscar completamente o nome do livro da vida (Ap. 3.5);
Se em nenhum texto neotestamentário, onde se faz uso do verbo exaleiphthenai, existe a ideia de algo restando após sua ação, por que o seria com relação aos pecados mencionados em Atos 3.19?
O capítulo sete do livro de Daniel é usado também como meio de justificativa do chamado “juízo investigativo”. Pois os ASD veem na alusão aos “livros sendo abertos”, uma referência aos livros de registro dos santos no santuário celestial. O grande problema com essa interpretação, é que Daniel tem essa visão de juízo, no contexto do surgimento daquele que perseguirá os santos (o anticristo), sendo, portanto, uma visão de juízo contra os não salvos, assim como demonstra o texto de Apocalipse mencionado.
Qualquer leitura desprovida de preconceito do capítulo sete de Daniel demonstrará claramente que o juízo ali representado se refere a um juízo futuro com relação ao anticristo, e_ não uma obra de purificação dos pecados dos salvos por meio de algum tipo de “juízo investigativo”. Q capítulo é claro na sua exposição dessa verdade em pelo menos quatro aspectos: (1) a visão do trono aparece na sequência após a demonstração do último império, portanto é um evento futuro – v. 9; (2) os santos seriam vencidos pelo anticristo até que fosse feito justiça por eles, outro ato futuro – v. 21,22; (3) os santos do Altíssimo seriam perseguidos durante um período de três anos e meio (“um tempo, tempos e metade de um tempo”), outro ato futuro – v. 25 – ver Dn. 11.13; (4) o juízo mencionado no texto é um ato de julgamento contra o anticristo a favor dos santos, e não um ato de juízo sobre as obras dos santos – v.26,27. Portanto, o capítulo sete de Daniel, ao contrário do que ensina a IASD, não traz nenhuma informação sobre algum suposto “juízo investigativo” pelo qual passam os santos do Altíssimo.
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Texto do livro: Os 7 Mitos do Adventismo, Paulo Sérgio Batista, CEKAP