Os mórmons e o batismo

Conferência-Geral-Mórmon

Uma das desculpas de Joseph Smith, para não se unir a nenhuma das igrejas cristãs de seu tempo, foi o fato de não serem unânimes em seus pontos de vista sobre o batismo.

Sentia-se “escandalizado” porque os presbiterianos e metodistas aspergiam crianças ou adultos. Os batistas imergiam unicamente crentes responsáveis. Os Amigos (quacres) não batizavam de nenhum modo. Isso foi na época em que Alexander Campbell estava reunindo adeptos, e os cambelitas insistiam que o batismo pela imersão era necessário para a salvação.

Smith alegava grande angústia sobre o assunto, e, como sua nova igreja estava em vias de ser fundada, era de se esperar que ele chegasse a uma decisão a respeito do batismo. Smith relata que, quando ele e Oliver Cowdry traduziam as placas de ouro, depararam com a menção de “batismo para remissão de pecados”.

Smith e Cowdry foram imediatamente para o bosque para orar. Lá se apresentou a eles um mensageiro do Céu que verificaram ser João Batista. Anunciou-lhes que estava para conferir-lhes o sacerdócio da ordem arônica. Smith recebeu ordem para batizar Cowdry e este por sua vez para batizar Smith. Realizado isso, foi-lhes dito que o sacerdócio de Melquisedeque lhes seria conferido mais tarde por Tiago, Pedro e João, que retinham essa autoridade (Pérola de Grande Valor, p.97). Isso se deu em 15 de maio de 1829. Até abril de 1830, o Livro de Mórmon tinha sido publicado e estava organizada a nova igreja.

Até novembro do mesmo ano, a Igreja tinha adquirido um teólogo na pessoa de Sidney Rigdon. Este fora primeiro batista, depois seguiu Alexander Campbell e adotou seu conceito da regeneração pelo batismo. Rompeu com Campbell quando este não quis adotar as noções de Rigdon sobre o comunismo cristão. Rigdon tinha um grupo de adeptos em Kirtland, Estado de Ohio, onde se praticava o princípio de possuir todas as coisas em comum. Afora essa feição comunitária, a nova seita de Rigdon seguia de perto os ensinos de Campbell. O rompimento deu-se em agosto de 1830.

Há uma lacuna no registro das atividades de Rigdon correspondentes aos poucos meses seguintes. Uma ocorrência nesse período foi a conversão de Parley Pratt aos ensinos de Rigdon. Dentro de três meses de sua conversão, Parley viajou na qualidade de evangelista para o Estado de Nova Iorque, onde foi convertido de volta para o mormonismo pela pregação de Hyrum Smith, irmão de Joseph.

Oliver Cowdry, Parley Pratt e dois companheiros foram enviados ao Oeste por Smith, para venderem o Livro de Mórmon e pregarem aos índios. Em coisa de dias visitaram Rigdon em Mentor, Estado de Ohio, e ofereceram-lhe um exemplar do Livro de Mórmon. Dentro de duas semanas, em meados de novembro de 1830, Rigdon e sua colônia comunitária em peso aceitaram o mormonismo e foram batizados por Cowdry.

Parece não haver dúvida de que as noções de Joseph Smith sobre o batismo eram na realidade as de Rigdon. Há bastante indicação da possibilidade de ter Rigdon estado em contato com Smith durante parte considerável do período de desenvolvimento da Igreja, bem como no período em que escrevia o Livro de Mórmon.

O calendário da vida de Rigdon não apresenta anotações referentes aos dois meses entre junho e agosto de 1828, nem às semanas entre 13 de outubro de 1828 e 1 de janeiro de 1829. Foi durante esse período que o manuscrito do Livro de Mórmon progredia rapidamente.

Há outra lacuna de maio até julho de 1829. Foi durante esse lapso de tempo que Smith e Cowdry se batizavam mutuamente por ordem de João Batista. Em outro capítulo anotamos que Oliver Cowdry mais tarde comentou que a voz de João Batista parecera extraordinariamente com a do Ancião Rigdon. É provável que fosse realmente Rigdon (Oliver Cowdry, Defesa).

Foi durante uma dessas ausências de Rigdon que uma das mais importantes seções de Doutrina e Convênios foi preparada. É a seção 20, que traz a data de abril de 1830. Contém instruções completas para a ordenança do batismo, a organização da Igreja e os deveres de seus oficiais. Não foi preparada por nenhum principiante, mas sim por alguém que conhecia todas as práticas da Igreja daquele tempo. Na maior parte de seus detalhes, corre paralelamente com a constituição das igrejas cambelitas da época, das quais Rigdon tinha íntimo conhecimento, sendo um de seus líderes. Contém muita matéria bíblica para ter sido escrita por Smith ou Cowdry sem auxílio. Smith, conforme admitiu sua própria família, era, naquela época de sua vida, quase totalmente desconhecedor da Bíblia (Lucy Mack Smith, Memoirs).

A versão dada pelos mórmons da conversão de Rigdon ao mormonismo é que ele aceitou com alegria o Livro de Mórmon da primeira vez que lhe foi apresentado, sem ter tido oportunidade para examiná-lo senão ligeiramente. A versão “gentia” da história é que Rigdon tinha estado em contato com Smith durante o período em que se escrevia o Livro de Mórmon. Há quem afirme que foi ele que tornou disponível a Smith o Manuscript Found de Solomon Spalding.

Os pronunciamentos de Smith, quase na íntegra, foram apresentados na forma de “revelações”, inclusive em se tratando de diretrizes em matéria puramente secular. Há em todos os seus escritos referências numerosas ao batismo e à regeneração pelo batismo. O Livro de Mórmon contém trinta e duas referências ao batismo. Em uma delas, 1Nephi 10:7-10, conta-se que Lehi, um judeu que vivia em Jerusalém em 600 A.C., profetiza, em boa fraseologia inglesa de 1611, a sequência exata do batismo do Salvador por João Batista, conforme narrado nos Evangelhos. As referências ao batismo vão-se tornando mais frequentes e amplas na parte final do Livro de Mórmon, onde se desenvolvem doutrinas tipicamente rigdonianas.

A referência mais estarrecedora, porém, e a primeira na sequência cronológica (embora não fosse revelada senão pelo menos cinco anos após completar-se o Livro de Mórmon) é uma descrição detalhada do batismo de Adão por imersão! Passamos a citar boa parte dessa surpreendente revelação:

“Deus chamou Adão dizendo: se te voltares para mim e creres e te arrependeres de todas as tuas transgressões, e te batizares, sim, na água, em o nome de meu Unigênito Filho, que é cheio de graça e de verdade, o qual é Jesus Cristo, receberás o dom do Espírito Santo.

E nosso pai Adão falou ao Senhor e disse: Por que devem os homens arrepender-se e ser batizados em água? E o Senhor disse a Adão: Eis que te perdoei a tua transgressão no Jardim do Éden. E agora eis que te digo: Este é o plano de salvação a todos os homens, pelo sangue de meu Unigênito que virá a ti no meridiano do tempo. E sucedeu quando o Senhor tinha falado a Adão, nosso pai, que Adão clamou ao Senhor, e foi arrebatado foi arrebatado pelo Espírito do Senhor, e foi levado para dentro da água, e foi estendido debaixo da água, e foi trazido para fora da água. E assim foi ele batizado e o espírito de Deus desceu sobre ele, e assim foi ele nascido do espírito, e foi vivificado no homem interior. E ele ouviu uma voz do céu, dizendo: Tu estás batizado com fogo, e com o Espírito Santo” (Pérola de Grande Valor, Moses, 6.51-54,62,65).

Há trinta e oito referências ao batismo em Doutrina e Convênios, uma das quais estabelece a idade em que a ordenança deve ser administrada:

“E os filhos deles serão batizados para remissão de seus pecados quando tiverem oito anos de idade, e receberão a imposição das mãos” (Doutrina e Convênios, 68.27).

Todos os teólogos mórmons são unânimes em concordar que eles ensinam sem reservas que não há salvação em época alguma — passada, presente ou futura — sem o batismo da água. Nem mesmo eximem dessa lei o ladrão na cruz a quem foi prometido que estaria com o Salvador naquele dia no paraíso.

Afirmam categoricamente que a remissão dos pecados é alcançada mediante a administração do batismo por uma pessoa credenciada, e que nesse ato o Espírito Santo é ministrado ao candidato. Essa é a fórmula total no que concerne à “aceitação do candidato no Reino de Deus”. Em tudo isso são forçados a admitir que consideram a fórmula do batismo para remissão de pecados como sendo o processo pela qual a salvação é iniciada.

Isso está na mais absoluta divergência com o ensino da Bíblia. O batismo para remissão de pecados e a salvação da penalidade do pecado são proposições inteiramente diferentes. O exame do sentido do termo, e seus vários empregos no Novo Testamento, demonstrarão que assim é. A palavra para “remissão” no grego é aphesis. Pode ser traduzida por liberdade, libertação, perdão, ou pelas expressões despedir, por de lado, remir, omitir, remover. No grego clássico é usada em situações como despedir um escravo que obteve sua alforria, eximir de compromisso, ir passando por alguém, ou ignorar.

No tocante à remissão de pecados, o termo é empregado no Novo Testamento em duas sequências no tocante ao batismo. A primeira se relaciona com o batismo de João (Marcos 1.4; Lucas 3.3). Esse não foi um caso de batismo após conversão individual, mas, antes, de arrependimento nacional em massa, em preparação para a vinda do Messias. Não se trata do batismo cristão.

O segundo caso diz respeito aos judeus arrependidos no Pentecoste (Atos 2.38). Trata-se do batismo cristão daqueles que agora aceitavam seu Messias que antes rejeitavam. Agora Ele era não só o Messias de Israel, mas também o Salvador dos pecadores. No caso desses judeus o batismo tinha um sentido todo especial. Eles eram homens que tinham participado pessoalmente da rejeição e crucificação do Salvador. Esse crime específico se prendia a eles pessoalmente. Agora pedia-se-lhes que tomassem a si, no batismo público, o nome que, poucas semanas antes, desdenharam. Submetendo-se ao batismo em nome do Senhor Jesus, à plena vista daqueles em cuja presença tinham perpetrado o crime, eram eximidos agora da culpa de seus feitos. Seus pecados eram remidos ou publicamente anulados.

Nesse mesmo sentido o batismo é administrado a pecadores arrependidos que hoje renunciam a seus pecados. Os que presenciam esse batismo estão cientes da vida passada da pessoa arrependida, e têm motivos para esperar que, dessa data em diante, não incorra mais em suas más práticas antigas. Nesse sentido ela tem a remissão de pecados. Seus pecados foram esquecidos por Deus, e os homens não têm mais direito de assacar-lhe os pecados de seu passado.

James E. Talmage, escrevendo sobre a conversão de Paulo (James E. Talmage, The Vitality of Mormonis, p.86), cita falsamente o texto de Atos 22.16. Ele o dá como: “Levanta-te e lava os teus pecados”, ao passo que Paulo cita assim as palavras de Ananias: “Levanta-te, recebe o batismo e lava os teus pecados”. As palavras ‘recebe o batismo’ e ‘lava’, nessa passagem, não se aplicam a uma só proposição.

Quanto à remissão de pecados, verificamos que o assunto é apresentado mais frequentemente em separado do que em conjunto com o batismo. Hebreus 9.22 informa que “sem derramamento de sangue não há remissão” (perdão). Esse pensamento é apresentado também em Mateus 26.28, na instituição da Ceia do Senhor. O Salvador diz: “Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados”. Ao passo que o batismo é símbolo da purificação dos pecados, somente o “sangue de Cristo” aplicado ao pecador é que pode providenciar a remissão dos pecados. Quando Pedro pregava em casa de Cornélio, afirmou: “todo o que nele crê recebe remissão de pecados” (Atos 10.43). Aí a remissão de pecados depende simplesmente da aceitação do Salvador pela fé.

Não há contradição entre as três proposições. 1 — O sangue de Cristo possibilita a remissão de pecados; 2 — A fé no Senhor Jesus torna-a disponível; e 3 — O batismo em nome do Senhor Jesus a demonstra.

A palavra, grega para “remissão” é aphesis e é usada em vários contextos no Novo Testamento. Ocorre, por exemplo, no “Pai nosso”, onde é traduzida por perdoar. Mateus 6.12-15 diz: perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores”. Em Mateus 18.21, Pedro pergunta até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?” O Senhor responde: “Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. A palavra perdoar aqui evidentemente diz respeito à eliminação da ofensa de nosso irmão, da nossa mente e do registro. Não se refere à purificação do pecado diante de Deus, que é assunto a ser tratado entre Deus e a pessoa, à base da purificação do pecado por meio do Calvário. O assunto é desenvolvido na primeira epístola de João.

Os mórmons prosseguem no seu argumento pela salvação por meio do batismo, insistindo que certas outras Escrituras se referem ao batismo com água. Alegam, por exemplo, que quando Paulo escreve a esse respeito para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra” (Efésios 5.26) ele fala do batismo com água.

Aplicam também o batismo pela água à declaração de Paulo “segundo sua misericórdia, Ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tito 3.5). A palavra aí é loutron e nada tem a ver com batismo, referindo-se antes à palavra de Deus como água que purifica.

Cometem o mesmo erro na aplicação das palavras de Jesus dirigidas a Nicodemos “Quem não nascer da água (udor e não baptizo) não pode entrar no reino de Deus” (João 3.5). Isso evidentemente não se aplica ao batismo como também acontece com água em João 4.14 e 7.38-39. Essas passagens, conforme declara o evangelista, se referem à operação purificadora do Espírito Santo. É o que João explica em 7.39.

Os mórmons dão muita ênfase à autoridade dos seus sacerdotes para batizarem para remissão de pecados. Alegam que somente eles, na atual dispensação, possuem essa autoridade, e que lhes foi outorgada em 15 de maio de 1829 por João Batista. Vejamos a narrativa. Nessa ocasião significativa, Joseph Smith e Oliver Cowdry receberam ordem para batizarem um ao outro. O mensageiro identificou-se como João Batista.

Aí há alguns problemas. Segundo as Escrituras, a ressurreição não se deu ainda, assim sendo João Batista está na sepultura. Não existe evidência de que ele tenha reaparecido conforme Smith alegou, como homem ressurreto e glorificado. João Batista nunca foi autorizado a ordenar alguém ou a conferir algum sacerdócio. Esse campo é exclusivo domínio da Cabeça da Igreja, Jesus Cristo, entretanto Smith alega que João o ordenou como sacerdote arônico por ocasião de seu batismo.

Seja quem for que apareceu a Smith e Cowdry, se é que alguém o fez, era evidentemente um impostor. Ademais, Joseph Smith foi batizado por Oliver Cowdry, que logo se tornou apóstata, segundo depoimento do próprio Smith. Assim se vê que a autoridade de Joseph Smith se baseia em proposição não bíblica, administrada por um apóstata, mediante ordem de um impostor.

Continua…

Por Gordon H. Fraser

Tradução de W. J.Goldsmith

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