O evangelho de João
A igreja onde congrego possui missões na América Central, em países como Honduras, Peru e Nicarágua. Quando recebemos cartas dos missionários brasileiros eles geralmente referem-se aos acontecimentos do povo no qual se encontram como os “nicaragüenses”, “os peruanos”, o “pessoal de Lima” e assim por diante. Por outro lado quando enviamos nossas correspondências a eles, não precisamos usar esta linguagem nos referindo como “os brasileiros”, “os paulistas” ou os “cariocas”, quando falamos de acontecimentos de nossa nação. Há uma simples razão para tudo isso: é que estamos escrevendo a outra pessoa de nossa própria nação, um brasileiro. Ele não precisa dessas referências, pois conhece muito bem sua pátria. Mas, por outro lado, os acontecimentos que eles relatam estão falando de um povo diferente do nosso, com costumes e línguas diferentes, então aí se faz necessário o uso de tais expressões.
Os judeus no evangelho de João
Este mesmo exemplo que relatamos acima é encontrado no Evangelho de João. Lucas e João usa mais de oitenta vezes a expressão “os judeus”. Isto prova que nós estamos lendo um livro “não judaico” escrito para pessoas de outra nacionalidade.
Veja alguns poucos exemplos e tire você mesmo a conclusão: “E este foi o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para que lhe perguntassem: Quem és tu?” (João 1.19)
Esta é a primeira referência feita por João aos judeus em seu Evangelho.
Tão logo ele introduz esta referência em sua narrativa, ele os denomina de “os judeus”. Ele os identifica como de uma nação diferente daquela a qual ele está a escrever. De outro modo por que então ele iria dar esta explicação? João escreveu seu evangelho para não-judeus de nacionalidade grega.
Considere outro exemplo:
“E grande número dos judeus chegou a saber que ele estava ali…” (João 12:9)
Veja que para seus leitores ele faz uma referência, ele diz “grande número dos judeus”. Seria desnecessário ele mencionar esta explicação se seus leitores fossem judeus?!
Ele usou este recurso para dizer às pessoas as quais estava escrevendo que os judeus eram uma nação diferente.
A mulher samaritana
No episódio de Jesus e a mulher samaritana, João nos mostra alguns exemplos de como a língua é utilizada para fazer distinções entre povos:
“Disse-lhe então a mulher samaritana: Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana? (Porque os judeus não se comunicavam com os samaritanos.)” (João 4.9)
Ora, qualquer judeu, saberia muito bem da rixa existente entre judeus e samaritanos. Seria desnecessário João escrever desta maneira para um judeu. Por outro lado, um grego desconhecia por completo este fato. Sendo assim, João introduz no final da narrativa uma explicação de que os judeus não se davam com os samaritanos. Isto seria desnecessário a um judeu, mas não a um grego.
Por usar o termo “os Judeus” João atesta a distinção entre as pessoas judias e não judias.
O evangelho de Lucas
Lucas é outro exemplo de como o Novo Testamento foi escrito em grego.
Lucas era um médico de nome gentio. Seu nome é uma forma abreviada de Lucios (nome grego). Seu evangelho foi escrito também para um gentio grego, Teófilo que significa “amigo de Deus”.
Lucas era companheiro de Paulo e viajou muito com o apóstolo em terras gregas (Cl. 4.10-14).
Ele era grego por nascimento e conseqüentemente falava a língua grega.
Um grego escrevendo para outro grego. É óbvio que este evangelho só poderia estar na língua grega e não hebraica.
O estilo introdutório de Lucas
Tanto o livro de Atos como o evangelho segue as características do estilo de cartas usadas pelos escritores gregos.
Se este livro foi escrito em hebraico, é estranho que ele possui traços e estilos de uma escrita grega.
Existem algumas explicações nos escritos lucano que não deixam margem para a constestação de que tal evangelho foi escrito em grego, para um grego. Eis a primeira:
“Aproximava-se a festa dos pães ázimos, que se chama a páscoa.” (Lucas 22.1)
Ora, se Teófilo fosse judeu, Lucas não teria de gastar explicações com coisas basilares do judaísmo. Qualquer judeu, desde sua tenra infância sabe que a festa dos pães ázimos é a páscoa. Mas ele precisou explicar isso a Teófilo, pois ele não era judeu, mas grego.
A outra se encontra em Lucas 23.50:
“Então um homem chamado José, natural de Arimatéia, cidade dos judeus, membro do sinédrio, homem bom e justo”
Ora, Lucas não precisaria dizer para um judeu que Arimatéia era uma “cidade dos judeus”. Não faz sentido. Mas como um gentio não conhece estas coisas foi necessário dar esta explicação.
Duas traduções
No decorrer do seu evangelho Lucas mostra que Teófilo não era de fato judeu. Os judeus daquela época falavam o aramaico, mas Lucas precisou explicar e traduzir duas palavras simples que qualquer judeu poderia saber perfeitamente.
“Então José, cognominado pelos apóstolos Barnabé (que quer dizer, filho de consolação)”(Atos 4.36)
Barnabé é um nome aramaico. Esta era a língua falada por Jesus e os apóstolos na palestina e pela maioria dos judeus daquela região. Mas Lucas viu uma necessidade de traduzir para o grego o nome aramaico do discípulo.
Outro exemplo temos em Atos 9.36:
“Havia em Jope uma discípula por nome Tabita, que traduzido quer dizer Dorcas”
Lucas novamente socorre seu amigo grego ao traduzir uma simples palavra aramaica para o grego. Tabita traduzido para o grego é Dorcas que significa gazela.
Ora, tradução só é possível quando duas línguas estão envolvidas. Uma palavra não pode ser traduzida dentro da língua que ela mesma faz parte. Uma palavra dentro de seu próprio idioma pode ser no máximo explicada e não traduzida. Mas Lucas usou o termo “traduzir” para explicar o nome da menina em grego.
Palavras e frases da língua hebraica traduzidas para o grego
Existem várias palavras e frases hebraicas e aramaicas traduzidas pelos autores do Novo Testamento que torna injustificável a defesa de um original hebraico para o Novo Testamento. Iremos mostrar abaixo algumas delas:
EMMANUEL
Muitos adeptos do nome Yehochua acreditam que Mateus foi escrito em hebraico. Todavia existem certas marcas em Mateus características de um original grego e não hebraico ou aramaico.
Por exemplo, Mateus faz uma citação profética de Isaías sobre a virgem e aplica-a em Jesus.
“Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, o qual será chamado EMANUEL, que traduzido é: Deus conosco.” (Mateus 1.23)
Isto é o que Isaías havia dito centenas de anos antes de Cristo nascer.
Mateus ao aplicar esta profecia a Cristo traduz a palavra hebraica Emanuel. Se Mateus estivesse escrevendo em hebraico para pessoas que compreendiam o hebraico, certamente ele nunca iria traduzir uma palavra de sua própria língua para pessoas que estavam familiarizadas com ela!
Isso fica mais evidente quando sabemos que Isaías ao escrever essa profecia em seu livro, ele a escreveu para leitores de fala hebraica (Isaías 7.14). Ele não dá nenhuma tradução para o nome Emanuel, pois seus leitores judeus sabiam o que significava tal palavra na sua língua natal. Desnecessário era fazer qualquer explicação. Mas porque será que Mateus precisou traduzir essa palavra? Simplesmente porque seus leitores não eram judeus e nem ele escreveu em hebraico, mas em grego.
TALITHA CUMI
No Evangelho de Marcos temos outros exemplos de palavras traduzidas:
“E, tomando a mão da menina, disse-lhe: Talita cumi, que, traduzido, é: Menina, a ti te digo, levanta-te.” (Marcos 5:41)
Marcos traduziu esta frase aos seus leitores por que nenhum deles conhecia o aramaico, mas somente o grego no qual foi escrito seu evangelho.
ELOI, ELOI
Outro exemplo de uma frase aramaica que Marcos sentiu necessidade de traduzir aos seus leitores foi o lamento de Jesus na cruz:
“E, à hora nona, bradou Jesus em alta voz: Eloí, Eloí, lamá, sabactani? que, traduzido, é: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Marcos 15.34)
Jesus estava falando em aramaico e Marcos desejava que seus leitores soubessem o significado daquelas palavras em grego, então resolveu traduzi-las. Isto mostra que Marcos também escreveu seu evangelho em grego. Algo interessante ainda é saber que Jesus usou o nome Eloi e não Yá, ou YHWH.
RABI E RABONI
Outro exemplo nós temos na palavra Rabi e Raboni:
“Voltando-se Jesus e vendo que o seguiam, perguntou-lhes: Que buscais? Disseram-lhe eles: rabi (que, traduzido, quer dizer Mestre), onde pousas?” (João 1.38)
“Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, voltando-se, disse-lhe: Raboni (que quer dizer Mestre)!” (João 20.16)
Rabi é uma palavra hebraica, enquanto raboni é aramaico, ambas querem dizer a mesma coisa. Isto prova que os leitores de João não entendiam nenhum dos dois idiomas. João precisou traduzir ambas para o grego afim de torná-las compreensível aos seus leitores gregos.
MESSIAS
João utilizou a palavra Messias duas vezes em seu Evangelho:
“Ele achou primeiro a seu irmão Simão, e disse-lhe: Havemos achado o Messias (que, traduzido, quer dizer Cristo).” (João 1.41)
“Replicou-lhe a mulher: Eu sei que vem o Messias (que se chama o Cristo); quando ele vier há de nos anunciar todas as coisas.” (João 4.25)
A palavra Messias fazia parte da vida dos judeus. A esperança messiânica estava no auge quando Jesus nasceu. Portanto, era inconcebível que um judeu não soubesse o significado desta palavra. Contudo, João precisou traduzi-la para o grego. Pois os gregos não estavam familiarizados com expressões judaicas.
Ao contrário de João, Daniel usou a palavra messias duas vezes em seu livro (9.25,26), mas não precisou dar explicação alguma. Simples, os leitores de Daniel sabiam o hebraico e aramaico no qual foi escrito seu livro. Daniel escrevia para judeus em hebraico e João para gregos em idioma grego.
Os leitores de João não sabiam que a palavra hebraica Messias significava “ungido”. Mas a palavra “ungido” em grego era Cristo. Então foi fácil para João fazer a tradução para uma melhor compreensão de seus leitores.
CEPHAS
O sobrenome que Jesus deu a Simão é mais uma tradução que encontramos no primeiro capítulo de João.
“E o levou a Jesus. Jesus, fixando nele o olhar, disse: Tu és Simão, filho de João, tu serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro).” (João 1.42)
Cefas é uma palavra aramaica muito conhecida para um judeu. Mas João precisou traduzi-la como “Petros” que em grego significa pedra.
GABATÁ
“Pilatos, pois, quando ouviu isto, trouxe Jesus para fora e sentou-se no tribunal, no lugar chamado Pavimento, e em hebraico Gabatá.” (João 19.13)
“…saiu para o lugar chamado Caveira, que em hebraico se chama Gólgota,” (João 19.17)
Nestas duas frases João primeiro dá o significado delas em grego e depois mostra a seus leitores como os judeus chamam estes lugares em hebraico. Se seus leitores fossem hebreus, seria até ridículo João tentar explicar o significado destes lugares a eles. Mas o caso é que João escreveu em grego para leitores de nacionalidade grega.
ACÉLDAMA
Lucas também lança mão do mesmo artifício quando escreve ao seu amigo grego Teófilo:
“E tornou-se isto conhecido de todos os habitantes de Jerusalém; de maneira que na própria língua deles esse campo se chama Acéldama, isto é, Campo de Sangue)” (Atos 1.19)
Lucas distingui as pessoas de Jerusalém por chamar os judeus de “eles” (“na própria língua deles”) e em seguida dá o significado aramaico do campo de sangue, isto é “Acéldama”.
Até aqui nós temos visto que todos os cinco primeiros livros que compõe o Novo Testamento foram escritos em grego. Os destinatários destes livros não entendiam hebraico, por isso muitos nomes próprios da língua hebraica ou aramaica precisou ser traduzidos para o grego. Também a distinção entre os povos do qual se fala (judes) e para o qual o escritor está escrevendo (gregos) também é clara. As evidências cumulativas provam sem sombra de dúvida que esses livros foram escritos em grego e não hebraico ou aramaico.
Paulo e os gregos
Certa vez precisei usar um artigo de um Instituto de Pesquisa norte americano. Como eu sabia que os norte americanos falam o inglês, redigi meu e-mail em língua inglesa pedindo autorização para usar o referido artigo. Eu não poderia escrever em português, pois sabia que eles eram americanos e o idioma oficial é o inglês. Eu não poderia escrever em qualquer outra língua, alemão, chinês, italiano. Não. Tinha de ser em inglês o pedido de autorização.
Paulo procedeu da mesma maneira ao redigir suas cartas às igrejas ou pessoas individualmente. Todos eles foram escritos em grego porque o idioma de tais pessoas era o grego e não o hebraico.
Pondere nas seguintes verdades: Paulo não era somente judeu, mas também cidadão romano. Como cidadão romano ele poderia viajar livremente pelo império. Paulo visitou várias cidades gregas e conheceu seus costumes, arte, cultura e religião.
Todas as epístolas que ele escreveu foram para igrejas gregas: Corinto, Gálatas, Éfeso, Colossos, Filipos, Tessalonica; ou para pessoas gregas como Tito, Timóteo e Filemon. É óbvio que ele iria escrever em grego e não em hebraico!
Paulo conhecia bem de perto os jogos Olímpicos, ele chega a usar termos esportivos como figura de linguagem a fim de ilustrar as verdades espirituais: ele fala em coroa (I Co. 9.25) e atleta (II Timóteo 2.5).
Ele conhecia os poetas gregos e até cita uma fala deles em Atos 17.28 e I Corintios 15.33, como aos filósofos cretenses em Tito 1.12.
ABBA
“…pelo qual clamamos: Aba, Pai!” (Romanos 8.15)
Paulo escrevendo aos romanos que não conheciam a língua aramaica precisou traduzir uma palavra que para qualquer judeu era fácil o significado, trata-se da palavra “abba” que significa pai. Isto prova que o livro aos romanos não foi escrito em hebraico ou aramaico, mas em grego.
A epístola aos hebreus
Mas o que dizer então da epístola aos hebreus? Não foi Paulo quem a escreveu?
Ora, se esta epístola foi escrita de fato para crentes hebreus, foi na língua hebraica e não grega!
A objeção levantada acima apesar de sustentar um verniz de lógica, não procede pelas seguintes razões:
1. A epístola é anônima;
2. É diferente das cartas paulinas cuja introdução ou desfecho trazia o nome do autor;
3. Não sabemos quem são seus destinatários.
4. Apesar do Velho Testamento ser citado em abundância, todas as citações são da Septuaginta e não do texto massorético hebraico. A septuaginta era o velho Testamento em grego. É claro que seus leitores, se não fossem gentios, eram judeus helenizados que conheciam o grego. O certo é que todo o livro de Hebreus foi escrito em grego para judeus (?) que falavam esta língua.
Os manuscritos do Novo Testamento
Uma outra prova esmagadora a favor da origem grega do Novo Testamento são os milhares de manuscritos antigos.
São mais de cinco mil manuscritos do Novo Testamento descobertos pelos estudiosos. Todos estão escritos em grego. NÃO HÁ NENHUM EM HEBRAICO. Isto é prova suficiente que Todo o Novo Testamento foi escrito em grego. Até mesmo os manuscritos encontrados nas cavernas de Qumran no mar morto, atribuídos ao Novo Testamento estão em grego. Isso se torna mais importante pelo fato de que os essênios eram judeus extremistas de fala hebraica. Todos os manuscritos do velho Testamento encontrados nas cavernas estão em hebraico.
Até mesmo os Novos Testamentos traduzidos para o hebraico são versões das cópias de manuscritos gregos! Isto é um fato muito importante! Agora pense um pouco: se o Novo Testamento, como dizem os adeptos do “nome sagrado” foi originalmente escrito em hebraico, por que todas estas edições em hebraico precisou ser traduzidas do grego, se por ventura existisse um manuscrito em hebraico? Há uma resposta simples para esta pergunta: é porque NÃO HÁ nenhuma cópia antiga Hebraica do Novo Testamento. Todo os manuscritos antigos estão em grego.
Para tentar derrubar esta prova clara a favor do Novo Testamento em grego, os adeptos do Movimento do Nome Sagrado apelam para especulações e teorias infundadas. Alguns dizem que o original hebraico está escondido na biblioteca do Vaticano, outros acreditavam que as pesquisas nas cavernas do mar morto poderão ainda trazer a tona estes manuscritos em hebraico.
Mas o caso é que nenhuma e nem outra é verdadeira.
Primeiro, que não há prova alguma de que o Vaticano esteja escondendo nenhum manuscrito em hebraico. Este é o mesmo argumento usado pelos fanáticos por “óvinis” (discos voadores). Dizem que o governo norte americano esconde em suas bases militares uma nave com extraterrestres capturados. Segundo eles, o governo norte americano, estaria escondendo a verdade para o mundo.
Segundo, as pesquisas nos manuscritos do mar morto nas cavernas de Qumran, já terminaram e não foi encontrada nenhuma ligação entre a seita essênica e Jesus, como especulavam alguns e muito menos manuscritos do Novo Testamento em hebraico como delirantemente sugerem outros do Movimento do Nome Sagrado. (revista Galileu na edição de Março de 2002, pág. 29)
Sendo assim, este movimento sectário labora em grave erro ao persistir numa tese que não tem o mínimo de fundamento, nem na Bíblia ou na história.