Isso aconteceu porque os remonstrantes sequer tiveram a oportunidade de ser realmente ouvidos no Sínodo.
Para dar uma aparência de justiça, o Sínodo contou com alguns depoimentos de remonstrantes, mas sob as seguintes regras: os treze remonstrantes intimados para comparecer ao Sínodo não teriam assentos como delegados, pois estavam sendo convocados como réus, logo todos teriam seu direito de voto impedido; os remonstrantes não poderiam participar das reuniões e de seus debates – eles ficavam em uma outra sala, esperando serem chamados pelo presidente do Sínodo para falar apenas o que fosse pedido –; depois de darem um depoimento, voltavam imediatamente à tal sala, sem terem direito à tréplica; os remonstrantes não escolheram seus representantes, mas, sim, o Sínodo; e os remonstrantes só poderiam responder em latim. Somente na vigésima segunda sessão do Sínodo lhes foi permitido aparecer para defender sua posição, sendo que só um poderia falar, representando todos (no caso, Simão Episcópio); depois, eles só puderam apresentar sua posição por escrito e, meses antes do Sínodo acabar, os remonstrantes foram simplesmente dispensados do Sínodo(sic)!
Como se não bastasse, o presidente sinodal era John Bogerman (1576-1637), um calvinista que chegara ao encontro com fama de defender a pena de morte aos “hereges arminianos”. Aliás, alguns calvinistas que estavam no Sínodo defendiam o mesmo, embora não fossem maioria, enquanto todos os remonstrantes pediam “a tolerância e a indulgência em relação às diferenças de opinião sobre assuntos religiosos”.
Bogerman também fora aquele que,juntamente com Gomarus, em um dos debates deste com Armínio, afirmou:
“As Escrituras devem ser interpretadas de acordo com o Catecismo de Heidelberg e a Confissão Belga”. Ao que Armínio respondera: “Como alguém poderia afirmar mais claramente que eles estavam decididos a canonizar estes dois documentos humanos e instituí-los como os dois bezerros idolátricos em Dã e Berseba?”.
Havia no sínodo 18 comissários políticos nomeados pelos Estados-Gerais, o Sínodo foi supervisionado pelos Estados-Gerais e todas as suas despesas foram pagas pelos Estados-Gerais, incluindo as dos delegados estrangeiros convidados. As sessões eram públicas, chegando a ser assistidas por grande número de espectadores.
O resultado do Sínodo de Dort foram cerca de 200 pastores destituídos de suas funções e exilados, e Oldenbarnevelt, paralelamente a Dort, condenado à decapitação como traidor do país. Uma verdadeira vergonha, da qual se arrependeriam depois os pastores e teólogos Daniel Tilenus (1563-1633), Thomas Goad (1576-1638) e John Hales (1584-1656), que participaram do Sínodo de Dort, mas depois se tornaram arminianos.
Entre os que participaram do Sínodo, estavam ainda Matthias Martinius (1572-1630) e Ludwig Crocius (1586-1655), professores na Universidade de Bremen, na Alemanha. Admiradores declarados da teologia de Felipe Melanchton, ambos foram ardorosos defensores de que a Expiação de Cristo foi ilimitada, suficiente para salvar toda a humanidade, apesar de ser eficiente só para os eleitos, razão pela qual, ao participarem do Sínodo de Dort, tiveram discussões homéricas naquele concílio com calvinistas rígidos, como, por exemplo, Francisco Gomarus, principal inimigo de Armínio. Crocius chegou, inclusive, a fazer uma crítica pública ao presidente do Sínodo, o também calvinista rígido Johannes Bogermann, por sua dureza para com os seguidores de Armínio. Ademais, ele manifestou várias vezes simpatia em relação aos posicionamentos arminianos durante Dort e pós-Dort. Martinius, por sua vez, ameaçou até abandonar o Sínodo.
Conta-se que foi “principalmente” pela “influência” deste “que o infralapsarianismo obteve vitória sobre o supralapsarianismo no Sínodo de Dort”.
Mesmo tendo a posição pró-Expiação Ilimitada derrotada no Sínodo de Dort, Martinius e Crocius, a contragosto, subscreveram a decisão daquele concílio. Lembrando que também defenderam a Expiação Ilimitada em Dort, ao lado dos dois teólogos alemães, os teólogos ingleses John Davenant (1572-1641), Joseph Hall (1574-1656), Samuel Ward (1572-1643), Johan Heinrich Alsted e Thomas Goad (1576-1638), sendo que este último, depois do concílio, se tornaria arminiano juntamente com os já mencionados
teólogos ingleses John Hales e Daniel Tilenus.
…
Aliás, sobre Dort, disse Martinius: “Havia ali alguns divinos, alguns humanos e alguns diabólicos”. Sobre o Sínodo de Dort, o rei Tiago I, da Inglaterra, que inicialmente aprovara a realização do conclave, enviando uma representação britânica, diria também, um ano após aquela decisão: “Essa doutrina [definida nos Cânones de Dort] é tão horrível que eu estou persuadido de que se houvesse um concílio de espíritos imundos reunidos no inferno, e seu príncipe, o Diabo, fosse colocar a questão a todos eles em geral, ou a cada um em particular, para obter sua opinião sobre o meio mais provável de incitar o ódio dos homens contra Deus, seu Criador, nada poderia ser inventado por eles que seria mais eficaz para este propósito, ou que poderia colocar uma afronta maior sobre o amor de Deus pela humanidade, do que esse infame decreto do recente Sínodo [de Dort]”.
Somente após a morte de Maurício de Orange-Nassau, ocorrida em 1625, quando o príncipe Frederico Henrique de Maurício (1584-1647), seu irmão, assumiu seu lugar, os arminianos foram autorizados a retornar à Holanda. Um deles, o já mencionado Simão Episcópio (1583-1643), aluno de Armínio, substituiria Gomarus na cadeira de professor de Teologia na Universidade de Leiden.
——–
– Extraído do livro de Silas Daniel, Arminianismo, a mecânica da salvação, np. Editora CPAD.