Nostradamus – Profeta ou adivinho?

Dentro de um contexto secular, quando o assunto é profecia, o nome mais comum que vem à mente das pessoas não é Isaías, Jeremias, Daniel ou até mesmo Jesus, embora tenham proferido grandes e impressionantes predições. O nome mais sugerido é Nostradamus. No pensamento popular, ele quase chega a ser identificado como um dos profetas bíblicos e o grau de acerto de suas previsões é considerado altíssimo. Marques da Cruz, professor, gramático, poeta, escritor e um dos maiores pesquisadores brasileiros da obra de Nostradamus, classifica-o como “o mais minucioso vidente que o mundo já conheceu”. Nostradamus foi realmente um profeta?


O que se pode dizer de sua vida e de suas obras, à luz das Escrituras?

Qual é o perigo por trás de suas profecias?

Será que ele possui de fato a infalibilidade que lhe é atribuída?

Quem foi Nostradamus?

Michel de Nostre Dame (1503–1566) ou Notredame, mais tarde Nostradamus, nasceu no dia 14 de dezembro de 1503, na cidade de Saint-Rémy, Provence, França. Seus pais eram judeus e, aos 9 anos de idade, ele e sua família ingressaram no catolicismo.

Desde cedo, demonstrou interesse pela matemática e pela astrologia, tendo recebido orientação nesse sentido do seu avô, Jean. Fez o curso de medicina e trabalhou intensamente no tratamento de vítimas da peste, epidemia que se alastrava na França no século XVI. Em 1530, sua primeira mulher e seus dois filhos morreram de peste.

Em 1555, então com 52 anos, ele publicou a primeira parte das suas ditas “centúrias”. Ao todo são dez livros ou centúrias e cada centúria é composta de cem quadras, daí o nome centúria, dado a cada um dos livros, embora a autoria de uma parte de sua obra seja controvertida.


O problema da fonte

Como crentes na Bíblia, nossa primeira preocupação com os escritos de Nostradamus não é se suas predições se cumpriram ou não, mas, sim, qual é a alegada origem dessas predições. O fato de uma predição se cumprir não encerra a questão: “Quando um profeta ou sonhador de sonhos se levantar no meio de ti, e te der um sinal ou prodígio, e suceder o tal sinal ou prodígio, de que te houver falado, dizendo: vamos após outros deuses, que não conheceste, e sirvamo-los; não ouvirás as palavras daquele profeta ou sonhador de sonhos; porquanto o Senhor vosso Deus vos prova, para saber se amais o Senhor vosso Deus com todo o vosso coração, e com toda a vossa alma” (Dt 13.1-3).

Os profetas bíblicos não eram meros prognosticadores do futuro. Suas mensagens não se resumiam em falar o que ia acontecer. A inspiração divina em seus lábios tinha por objetivo revelar os planos de Deus e manifestar a vontade do Senhor. O povo estava acostumado a buscar os necromantes e adivinhos para saber a respeito do futuro. Os profetas bíblicos anunciavam todo o propósito de Deus, relacionando-os com o futuro somente quando assim era necessário.

Mas Nostradamus nada teve em comum com esses profetas. Seus métodos estavam mais de acordo com os oráculos pagãos da Grécia e de Roma, ou com os bruxos da Idade Média, ou mesmo com os atuais praticantes do espiritismo, do que com os profetas de Deus. Essa distinção é vital!

Em verdade, não é o fato de prever ou não o futuro que distingue os mensageiros de Deus, mas o poder que está por trás de suas palavras. E, neste caso, a fonte do suposto poder de Nostradamus não está oculta aos pesquisadores. Vejamos o que revela a seguinte declaração: “Diz (Nostradamus) na Carta a Henrique II que se utilizou em parte da mesa de três pés, isto é, do tripé de bronze (Tripode Aeneo), usado desde a antiguidade, como, por exemplo, pela pitonisa Pítia, de Delfos, e, hoje, pelos espíritas, a partir de Allan Kardec, que usavam mesa de três pés, mesmo de madeira […] Parece que esta declaração espontânea, ao começar as Centúrias, indica que ele praticava a magia […] Sabe-se que este processo foi praticado pelos sacerdotes assírios, caldeus, egípcios, persas, gregos e de outros povos”.1

Diante disso, é fácil perceber, mesmo por seus textos mais famosos, elementos comuns às artes mágicas e ao ocultismo, como fogo, transe e fumaça de enxofre. Em sua famosa carta ao seu filho César, há inúmeras declarações nas quais ele deixa transparecer seu ocultismo. Num trecho desta ele diz: “Certamente, meu filho, falo de modo um tanto incompreensível. Mas os fatos ligados a previsões secretas, transmitidos pelo espírito sutil do fogo, confundem, às vezes, o entendimento […] Todavia, uma vez por semana caio numa espécie de estado de transe. Por meio de apurados cálculos, limpo posteriormente minhas anotações noturnas dos vapores de enxofre, conferindo-lhes aroma agradável”.2

Não é novidade para nenhum biógrafo de Nostradamus que quando ele esteve em Avinhão (cidade do Sul da França), surgiu-lhe grande interesse por tudo o que se referia ao ocultismo, pois a biblioteca daquele lugar possuía muitos livros sobre o assunto. Também é sabido que quando morava na cidade de Salon o andar superior de sua casa foi convertido em um estúdio e, como ele mesmo narra em suas profecias, fechava-se ali de noite com seus livros de ocultismo. Embora tenha declarado haver queimado essas literaturas em ocasião posterior (o que prova que os tinha e se utilizava deles), isso, provavelmente, foi uma manobra para despistar a inquisição.


Mudando os termos

O título de “profeta”, aplicado a Nostradamus, conferiu-lhe, com o passar dos séculos, uma aura de santidade e credibilidade indevidas. Identificou-o erroneamente com os profetas bíblicos. Mas em verdade, se queremos ser bíblicos, o título correto a ser aplicado a ele seria “agoureiro”, “prognosticador” ou “feiticeiro”, pois estes estão mais de acordo com a natureza e as práticas de Michel de Notredame. Nostradamus jamais empregou expressões tais como “assim diz o Senhor”. Longe de ser um profeta, ele nada mais foi do que um adivinho ocultista.

Esta simples manipulação de títulos tornou simpático à sociedade um personagem que exerceu uma atividade completamente condenada por Deus nas Escrituras. Nele, a bruxaria e a feitiçaria adquiriram glamour. Depois de tantos séculos, ficou difícil convencer as pessoas de que uma consulta a Nostradamus equivale a uma consulta aos praticantes de bruxaria, tão comuns em toda a história e em todos os povos.


Cumprimentos reais ou aparentes?

Outra fama adquirida por Nostradamus e que precisa ser devidamente analisada está ligada à exatidão de suas previsões e do grande número de acertos. Até que ponto suas previsões foram exatas? Quantas realmente podem ser comprovadas?


Ambigüidade

Um dos problemas que ocorria com as previsões dos adivinhadores pagãos sempre foi as ambigüidades, ou seja, os duplos sentidos que suas profecias apresentavam, de modo que qualquer cumprimento se encaixava em suas palavras.

Um célebre exemplo histórico que envolveu o oráculo de Delfos foi narrado por Heródoto, considerado o pai da História. Ele conta que havia na cidade de Lídia um rei muito rico, de nome Creso, que estava sendo atacado por Ciro, o persa. Como Ciro, para chegar às suas terras, teria de atravessar um rio, Creso consultou o oráculo para saber se aguardava a travessia do rio para lhe dar combate ou se ele atravessava o rio para ir ao encontro de Ciro. A resposta do oráculo foi: “Se tu atravessares o rio, um grande reino cairá”. Confiante que derrubaria então o reino da Pérsia liderado por Ciro, Creso atravessou o rio e lhe deu combate. Foi completamente vencido e aprisionado e, de fato, um grande reino caiu – o dele. A ambigüidade está no fato de que ambos os reinos eram grandes e, portanto, independente do resultado, o oráculo tinha assegurado seu “acerto”.

Comentaremos um exemplo de ambigüidade nos textos de Nostradamus, em uma análise feita por um estudioso de suas profecias, referente à guerra em Kososvo, em 1999.

O conflito que aconteceu na província de Kosovo, na Iugoslávia, foi interpretado por muitos astrólogos e estudiosos das profecias de Nostradamus como o início da guerra prevista pelo francês, que em sua centúria X, quadra 72, teria dito:

“No ano de 1999, sétimo mês

Do céu virá um grande rei de assustar

Ressuscita o grande rei de Angoulmois,

Antes depois Marte reina

pela felicidade”.

Veja só o que Fábio Araújo, criador do site “profecias on-line”, disse sobre a quadra 72 em 1999: “A primeira linha é clara e diz somente ‘em julho de 1999’. Entendo que a expressão do céu virá pode ser entendida como um extraterrestre. Mas pode ser também que esteja usando uma expressão para dizer que “um rei de assustar” será um rei bom, ou seja, ele virá do céu e não do inferno […] A terceira linha diz: ‘Ressuscita o grande rei de Angoulmois’, que designa, provavelmente, dois personagens: o anticristo, vindo da Ásia, e o futuro salvador da Europa, que seria descendente de Luís XVI, morto na guilhotina com sua esposa na Revolução Francesa, em 1792. Bem, o conflito na Iugoslávia começou em março deste ano (1999) e a hipótese de uma guerra mundial já foi colocada em cena pelo presidente da Rússia, Boris Yeltsin, que ameaçou apontar mísseis russos para os países da Otan, a aliança ocidental liderada pelos Estados Unidos que atacou a província de Kosovo. Seria este o estopim da Terceira Guerra Mundial?”.3

Como vemos pelas expressões “pode ser”, “provavelmente”, “seria”, etc., seus textos podem oferecer diversas aplicações. Seu relacionamento com a guerra de Kosovo mostrou-se sem fundamento desde então e, provavelmente, voltará a ser aplicado a outro evento qualquer. E o pior, provavelmente será crido por muitos.


Hermenêutica duvidosa

Como sabemos, as centúrias foram escritas em uma linguagem de códigos, símbolos e imagens. Não há referências diretas a acontecimentos futuros, mas para se chegar a isto se faz necessário uma interpretação, ou seja, uma hermenêutica de seu texto.

Na teologia bíblica foi desenvolvida, com o decorrer dos anos, uma hermenêutica que possibilitasse interpretar corretamente seu significado. Portanto, existem regras de interpretação que devem ser obedecidas.

Com relação às profecias de Nostradamus isto não ocorre. Os que se propuseram a interpretar seus escritos não possuem uma regra e criam várias delas arbitrariamente sem qualquer base segura. Desta forma, se torna fácil adaptar eventos históricos às centúrias, fazendo que estas signifiquem o que aconteceu. Como exemplo, tomemos uma interpretação feita por um dos maiores estudantes das profecias de Nostradamus, Jean-Charles de Fontbrune. Vejamos, a seguir, a tradução da centúria 84 que, segundo Fontbrune, versa sobre o nascimento do anticristo na Ásia e sua penetração até a França:

“Ele nascerá da infelicidade e numa cidade incomensurável (cidade chinesa ou japonesa), filho de pais obscuros e pérfidos; quando o poder do grande rei (da França) for reconhecido, ele destruirá (o Ocidente) até Rouen e Evreux”.4

Na própria tradução o autor já interpreta os textos, alterando-o segundo sua própria opinião. Por que a referida cidade incomensurável tem de ser chinesa ou japonesa e não outra qualquer? O que determina esse posicionamento? Por que o grande rei tem de ser o da França? Por que a destruição se refere ao Ocidente?

“As chamadas profecias de Nostradamus foram escritas numa linguagem tão herméticas (de compreensão difícil) que todos — absolutamente todos — os acontecimentos fundamentais da história da humanidade podem ser por elas explicados: mas somente depois de acontecerem (nunca antes do acontecimento), e isso graças aos aguerridos intérpretes das famosas centúrias. Elas não são herméticas por serem proféticas, mas são proféticas por serem herméticas”.5


Cumprimento pós-fato

Todas as vezes que se relacionaram as profecias de Nostradamus com algum acontecimento, não foi previamente. Ninguém predisse a história com alguma centúria dele. Mas quando algum fato marcante aconteceu, ou durante algum estudo da história, foi dito: “Nostradamus já havia predito isto em tal e tal lugar”. Vejamos o exemplo da execução de Maria Antonieta (rainha da França, esposa de Luís XVI), na Sextilha 55:

“Ante o povo, pouco depois a rainha será guilhotinada e sua alma subirá ao céu. Será lamentada por muitos. Seus parentes ficarão aflitos: as lágrimas e suspiros de sua filha. Deixará de luto seus dois (cunhados)”.

Mas o texto original em francês não diz guilhotinada, até porque esta ainda não tinha sido inventada no tempo de Nostradamus. Diz apenas que sua alma foi para o céu e seu corpo para a lama. A expressão “cunhados”, que aparece entre parênteses na tradução, foi apenas uma tentativa de adaptar a suposta profecia ao suposto cumprimento.


Uso arbitrário dos textos

Um exemplo muito curioso está relacionado ao período hitlerista (Hitler). Goebbels, o ministro de comunicação do terceiro Reich (período nazista), responsável por toda a propaganda nazista, utilizou-se freqüentemente de Nostradamus. Ele escreveu em seu diário, em 1942: “Foi traçado um plano, mostrando como podemos obter ajuda do ocultismo em nossa propaganda. Estamos realmente fazendo progressos […] Portanto, estamos contratando os serviços de todos os peritos que podemos encontrar em ocultismo, profecias, etc. Nostradamus terá, novamente, de conformar-se em ser citado”.6

Ele (Goebbells) se apropriou de uma suposta profecia da centúria 3, quadra 8, que parecia indicar uma derrota total da França, para incentivar seus soldados de que a vitória já estava garantida. Quando ele começou a campanha contra a França, Nostradamus estava em todas as bocas. Até nos EUA se ouvia dizer: “Ele predisse tudo”. Mas, em seguida, houve tanta confusão e o fim foi a derrota total de Hitler e de sua Alemanha.

Podemos então perceber como é fácil interpretar Nostradamus para qualquer propósito.


A profecia bíblica

“Nenhuma ciência é mais bem comprovada do que a religião da Bíblia” (Isaac Newton).

Uma breve comparação com a exatidão das profecias bíblicas já é o suficiente para perceber a diferença entre esta e as centúrias de Nostradamus. Embora tenha sua linguagem própria e sua própria hermenêutica, alguns fatores devem ser levados em consideração:

Existem cerca de trezentas profecias que se cumpriram literalmente na vida de Jesus, como o Messias de Israel. Entre essas predições, muitas delas envolviam lugares e acontecimentos exatos, como a cidade onde nasceu, a forma como falou, a forma como morreu e o resultado de sua obra. Não há nada escondido, não é necessário tecer conjeturas e suposições arbitrárias para “interpretá-las”. Tudo é muito claro! Um especialista em probabilidade, Peter Stoner, em seu livro A ciência fala, calculou que a chance de um homem que tenha vivido até hoje cumprir somente oito das mais de trezentas profecias messiânicas é de 1 para 1017.

Existem profecias no Antigo Testamento sobre cidades como Nínive, Babilônia, Tiro, Petra, etc, que tiveram cumprimento literal. Tomando somente uma das cidades para exemplo, temos que a probabilidade de se cumprirem todas as predições acerca de Tiro é de 1 para 75.000.000. Isso prova que só Deus conhece infalivelmente o futuro.

Profecias sobre o retorno e o renascimento de Israel à Palestina (Is 66.8), que se encontram em toda a Escritura, são um cumprimento histórico significativo, muito superior às supostas previsões do adivinho francês, e estão diante dos olhos do mundo inteiro.

Mas se isso tudo é assim, por que então as pessoas não se voltam para as profecias bíblicas? Por que preferem ficar a mercê do subjetivismo e manipulação das centúrias? Por que se predispõem a crer num “agoureiro”, considerado por alguns estudiosos do assunto como o “profeta” da moda? Cremos que é possível encontrar nas palavras do apóstolo Paulo pelo menos um indício disso: “O deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus” (2Co 4.4).


Fontes:

Revista Defesa da Fé

1 O pensamento vivo de Nostradamus, coordenação de Martin Claret, Editora Martins Claret, p. 68,70.

2 Ibid., p. 14,19.

3 http://www.fenomeno.trix.net/fenomeno_inexplicavel 1 textosprofecia.htm

4 Nostradamus – historiador e profeta, Jean-Charles Fontbrune, Círculo do Livro, 1980, p. 519.

5 Adaptado do site http://www.abdias.jor.br/ desamores.html

6 Doutor Goebbels, Roger Manvell e Heintich Fraenkel. Record, 1960, p. 203.

Por Lídio Hamon


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