Embora pareça contraditório dizer que há excesso de reuniões em um movimento que tem apenas um culto por semana, é o que o modelo acaba exigindo dos fiéis. Principalmente os da primeira geração de 12, quando estes não trabalham em tempo integral na igreja.
A visão celular é idolatrada. Por várias vezes vi líderes incentivando outras denominações a aderirem ao modelo. Faziam marketing do G-12.
Sob esse prisma de que a visão é a solução dos nossos problemas, o Ministério Monte Sião, em um dos artigos postados em seu site pergunta “o que acontece quando não há trabalho celular?”[1] O próprio autor do estudo enumera pelo menos nove desvantagens de não ser gedozista:
• Igrejas pequenas.
• Pessoas não são pastoreadas.
• As pessoas entram pela porta da frente e saem pela dos fundos.
• Pastor carrega o trabalho.
• O potencial de liderança não é aproveitado – uns poucos se perpetuam na liderança.
• Pessoas desmotivadas. A estrutura centralizadora favorece a acomodação.
• Crescimento lento.
• Incapacidade de reprodução.
• Insatisfação (necessidades individuais não atendidas – falta de oportunidades).
Cada um dos pontos são passíveis de refutação, entretanto, vou me concentrar em apenas dois: 1) Pessoas não são pastoreadas e 2) Pastor carrega o trabalho.
1. Pessoas não são pastoreadas – No modelo celular, as reuniões que edificam o corpo em conhecimento, tais como cultos de ensinamento e EBD são retiradas, restando apenas um culto dominical, que é o de celebração (Igrejas em células, não com células).
A proposta da visão é discipular mais de perto as ovelhas, como um pastor não teria a capacidade de fazê-lo sozinho para milhares de membros, ele se concentra então em apenas 12.
Toda semana, o pastor se reúne com esse discípulo e teoricamente, ensina-o a guardar todas as coisas que Jesus ordenou (Mt 28.20). Digo teoricamente porque os estudos que são utilizados são voltados para a visão e não teológicos. Basta olhar no site do MIR, na aba de estudos para os 12.
São materiais direcionados e não com o verdadeiro teor bíblico. Além disso é empreendido tempo para remexer na intimidade de alguns seguidores e até mesmo alinhar o que está acontecendo nas células.
Dessa forma a probabilidade de sair fofocas é grande (e sempre sai), pois fatos da vida de outras pessoas são contados e por mais que se defenda que entre os 12 há aliança e que não deve sair nada, isso não é o suficiente, sempre alguém tem um “amigo confidente” que divide até mesmo os segredos de estado.
Essa informação pode ser confirmada através do relato da pastora Roselaine Perez que fez parte do movimento por aproximadamente cinco anos. Veja um trecho de seu “tristemunho”:
Quase perdi Jesus de vista. Minha família ficou relegada ao que sobrava de mim, minha filha mais velha, hoje com 23 anos, demorou um bom tempo para me perdoar por eu ter repartido a maternidade com tantas sanguessugas que me usavam para satisfazer sua sede de poder. Minha mãe teve dificuldade para se abrir comigo durante muito tempo porque, segundo ela, só conseguia me ver como a Pastora dura e ditadora. Tenho lutado diariamente para que ela me veja somente como filha. Fui responsável por manter minha Igreja em regime escravo (mesmo que isso estivesse numa embalagem maravilhosa), por ajudar a alimentar a ganância de muitos, por não guardá-los dessa loucura. Colaborei com a neurotização da fé de muitos, por causa da perseguição desenfreada pela perfeição e por uma santidade inalcançável. Fiquei neurótica eu mesma, precisando lançar mão de ajuda psicológica devido a crises interiores inenarráveis, ao passo que desenvolvia uma doença psíquica de esgotamento chamada Síndrome de Burnout, hoje sob controle. Vendi a idéia da aliança incondicional do discípulo com o discipulador, afastando sutilmente as pessoas da dependência de Deus. Invadi a vida de muitos a título de discipulado, cuidando até de quantas relações sexuais as discípulas tinham por semana, sem que isso causasse ofensa ou espanto. Opinei sobre o que o discípulo deveria comprar ou não, tendo “direito” de vetar o que não achasse conveniente. A menor sombra de discordância por parte do discípulo era imediatamente reprimida, sem qualquer respeito. Quando isso acontecia os demais tomavam como exemplo e evitavam contrariar o líder. Aceitei que fosse tirada do povo a única diretriz eficaz contra as ciladas do diabo: a Bíblia. Não que ela não fosse utilizada, mas isso era feito de forma direcionada, para fortalecer os conceitos da Visão. Paramos de estudar assuntos que traziam crescimento para nos tornarmos robôs de uma linha de montagem, manipuláveis, dogmatizados. Fomentei a disputa de poder entre os irmãos ignorando os sentimentos dos que iam ficando para trás (…) Dentro da Visão, nossa Igreja esteve entre as que mais cresceram e deram certo na região, mas desistimos porque, acima de todo homem e todo método, somos escravos de Cristo.[2]
Diante dessa falsa aparência de pastoreio mais eficaz é que a visão vai escondendo suas falhas. São reuniões e mais reuniões. Reunião de 12 uma vez por semana com o pastor, reunião de 12 com os da segunda geração uma vez por semana, células uma vez por semana, reuniões dos ministérios (quem ensaia em grupos de louvor, por exemplo), visitas para novos convertidos, consolidação, visita para os discípulos, reuniões, reuniões, reuniões…
O que estava acontecendo comigo e com os demais era um cansaço crônico, em função do ativismo religioso. Não tinha um dia que não estávamos cansados. Os irmãos que trabalhavam em atividade mais pesada então, pareciam zumbis em alguns momentos.
Sempre ouvíamos reclamações de cansaço físico, porém, a culpa era do diabo, segundo a visão deles. Ai de quem discordasse, pois tínhamos uma aliança (mais a frente falarei sobre isso).
O desgaste físico era reflexo da batalha espiritual, pois o inimigo estava furioso com a conquista das vidas. Era assim que enxergavam.
Esse cansaço havia atingido o corpo e a mente das pessoas. Algumas vezes éramos surpreendidos por respostas grosseiras de alguns líderes em função da falta de paciência. Muitos estavam estressados e tinham posturas reativas. Era automático, de repente já tinham falado.
2. Pastor carrega o trabalho – De acordo com o estudo do Ministério Monte Sião, nas igrejas tradicionais (é assim que tratam os que não são gedozistas) o pastor fica sobrecarregado. Bom, depois de entender como é o sistema do G-12 fica claro que quem pastoreia a igreja não é o pastor e sim os 12. O pastor se encarrega de pastorear apenas os doze homens que caminham consigo.
Eu poderia na verdade, parafrasear o estudo já citado da seguinte forma: “o que acontece quando não há trabalho celular? Ah, o pastor trabalha, faz jus ao salário que possivelmente ganha. Apascenta o rebanho, ensina-os, distribui as responsabilidades, visita as ovelhas, cuida, motiva, sustenta, apoia no caminho da Justiça, sem todavia, ser movido por torpe ganância, mas de boa vontade e espontaneamente, ao passo que no G-12 o pastor tem tempo para cuidar de si mesmo, de sua casa e de seus negócios”.
Como são os 12 que pastoreiam a igreja, caso eles não sejam obreiros de tempo integral, como era o meu caso e é o de muitos, fica muito difícil ter tempo hábil para realizar todas as atribuições. Com isso, o tempo para a família vai sendo sugado e as pessoas servem à visão, ao invés de Cristo Jesus, o nosso Salvador.
[1] Monte Sião. Voltar aos princípios do primeiro século para enfrentar os desafios do último. Disponível em: http://www.montesiao.pro.br/estudos/visao/proposta_celular.html. Acesso em 18/05/11.
[2] PEREZ, Roselaine. Uma Sobrevivente da Visão Celular de Renê Terra Nova Conta Tudo. Disponível em: http://www.genizahvirtual.com/2010/11/uma-sobrevivente-da-visao-celular-de.html. Acesso em 05/05/11.
Extraído do livro “A Verdade Sobre o G12″, Couto