A discussão sobre a alma vem ganhando maior atenção nos últimos anos. Principalmente depois que o aniquilacionismo foi adotado como doutrina oficial de alguns grupos cristãos, entre eles, os adventistas.
Nesta discussão, o livro de Eclesiastes se torna uma importante ferramenta para aniquilacionistas defenderem a doutrina do sono da alma. Um dos motivos é o versículo 3.19 deste livro:
Porque o que sucede aos filhos dos homens, isso mesmo também sucede aos animais, e lhes sucede a mesma coisa; como morre um, assim morre o outro; e todos têm o mesmo fôlego, e a vantagem dos homens sobre os animais não é nenhuma, porque todos são vaidade. (Ec 3.19)
Por que este versículo é tão importante? Samuelle Bacchiocchi, teólogo adventista, explica isto:
É evidente de textos como estes que possuir o fôlego ou o espírito de vida não significa ter uma alma imortal. O fôlego de vida é simplesmente o dom de vida dado aos seres humanos e animais pela duração de sua existência terrena. O espírito ou fôlego de vida que retorna para Deus por ocasião da morte é simplesmente o princípio de vida concedido por Deus tanto para os seres humanos quanto para os animais. Este ponto é claramente exposto em Eclesiastes 3:19: “Porque o que sucede aos filhos dos homens, sucede aos animais; o mesmo lhes sucede; como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida [ruach], e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais”. Os que alegam que os animais não possuem o espírito [ruach] de vida, mas somente o fôlego [neshamah] de vida ignoram o que tanto Eclesiastes 3:21 quanto Gênesis 7:15, 22 claramente expressam que os animais possuem o mesmo espírito-ruach de vida concedido aos seres humanos. [1] “Imortalidade ou Ressurreição? – Samuele Bacchiocchi”
Assim, o fato de Salomão ter colocado o espírito humano e animal no mesmo patamar, indicaria que este se trata apenas do “dom da vida”. Mas é verdade que este fôlego é colocado no mesmo patamar? Para responder esta pergunta, vamos analisar o livro e o contexto do versículo.
A visão materialista de Eclesiastes.
A temática de Eclesiastes é a vaidade das coisas terrenas e a inutilidade dos esforços humanos, conforme encontramos nos primeiros versos do livro:
Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade. Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, que faz debaixo do sol? (Ec 1.2-3)
Muitos entendem que a temática do livro está focada nas coisas terrenas, pelo amplo uso da expressão “debaixo do sol”, como foi feito nos versículos acima, como mencionado no comentário Jamieson, Fausset e Brown: “debaixo do sol: ou seja, nesta vida, em oposição à vida futura. A frase sempre ocorre, mas somente em Eclesiastes”[2]. O comentário Keil e Delitzsch diz: “‘Debaixo do Sol’ é a designação da terra peculiar a este livro, – o mundo do homem, que estamos acostumados a chamar de mundo sublunar” [3]. Se não houvesse o emprego da expressão, poder-se-ia entender que “tudo é vaidade” aplica-se também às coisas celestiais, o que seria inconsistente com o próprio sentimento que o autor demonstra depois, em respeito a Deus (Ec 2.6, Ec 3.13, Ec 5.1-7, Ec 5.19,20, Ec 12.13).
Tudo é vaidade, e Salomão usa isto para defender que a vida terrena não traz verdadeira alegria, se não temos em vista Deus e suas obras. Salomão conclui depois de sua análise da vida debaixo do sol: De tudo o que se tem ouvido, o fim é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo o homem. (Ec 12.13)
É o temor a Deus que Salomão enfatiza, e para isto ele demonstra como são vãs as obras terrenas dos homens. “Vaidades” é usada 37 vezes neste livro, para expressar esta idéia. Devemos, portanto, ter em mente que muito do que é dito em Eclesiastes está limitado ao materialismo, para que a mensagem do autor tenha um significado válido. Com isto em mente, vamos analisar o capítulo 3 de Eclesiastes.
A ignorância humana
O capítulo 3 de Eclesiastes é iniciado com uma discussão sobre o tempo. Salomão arrazoa que há tempo para tudo: tempo de nascer, morrer, plantar, colher… Salomão em sua descrição do tempo, sempre coloca um exemplo juntamente com seu oposto, para mostrar que realmente tudo tem seu tempo.
Salomão então interrompe sua descrição do tempo. É neste momento que Salomão declara a ignorância humana, ao dizer:
(Ec 3.11 – Almeida Corrigida Fiel) Tudo fez formoso em seu tempo; também pós o mundo no coração do homem, sem que este possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até ao fim.
(Ec 3.11 – Almeida Atualizada) Tudo fez formoso em seu tempo; também pôs na mente do homem a ideia da eternidade, se bem que este não possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até o fim.
Apesar das traduções serem diferentes quanto ao sentido da palavra ‘olâm neste versículo, em uma coisa eles concordam: o homem desconhece as obras de Deus. Esta não será a única vez que Salomão declarará que o homem desconhece algo (Ec 7.14, Ec 8.17, Ec 9.1, Ec 11.5).
Mas qual a relação do desconhecimento com as declarações sobre o tempo que iniciaram o capítulo? É neste momento que Salomão estabelece esta ligação.
Ele primeiro declara que só tem visto injustiça e iniquidade no mundo. Não havia paz, não havia amor… Para Salomão, estava claro que estamos vivendo, desde os tempos dele e tempos anteriores, do tempo da iniquidade. E como no início do capítulo, Salomão diz que há tempo para tudo. Se agora é tempo de iniquidade, então é de se esperar que haja um tempo de justiça. Então, Salomão conclui:
(Ec 3.17) Eu disse no meu coração: Deus julgará o justo e o ímpio; porque há um tempo para todo o propósito e para toda a obra.
Sim, haverá um julgamento. E é exatamente por que o homem ignora isto, é existe esta iniquidade também. O homem poderia usar suas vãs obras para fazerem o bem. Se o homem conhecesse as obras de Deus, ele certamente faria o bem. Mas ele desconhece. E é por isto que Salomão diz que Deus o prova. A palavra para provar é bârar, que indica uma separação, uma manifestação. Deus vai manifestar “quanto à condição dos filhos dos homens”, o que eles são. E o que eles seriam? Não é por acaso que Salomão diz que Deus vai mostrar que eles são como animais. A Bíblia faz comparações entre os seres humanos e animais, e ressaltando nestas comparações, a ignorância:
(Sl 32.9) Não sejais como o cavalo, nem como a mula, que não têm entendimento, cuja boca precisa de cabresto e freio para que não se cheguem a ti.
(Sl 49.12) Todavia o homem que está em honra não permanece; antes é como os animais, que perecem….
(Sl 49.20) O homem que está em honra, e não tem entendimento, é semelhante aos animais, que perecem.
(2Pe 2.12) Mas estes, como animais irracionais, que seguem a natureza, feitos para serem presos e mortos, blasfemando do que não entendem, perecerão na sua corrupção,
(Jd 1.10) Estes, porém, dizem mal do que não sabem; e, naquilo que naturalmente conhecem, como animais irracionais se corrompem.
Quão oportuna mais esta comparação aqui. Salomão falando sobre a ignorância humana, mais uma vez retoma uma figura de linguagem comum na época. Agora que está demonstrado o quê Deus quer mostrar para o homem, deve-se aqui identificar, como Ele faz isto.
Nota-se que é a igualdade com os animais que faria esta ignorância humana ficar clara. Todos morrem, todos tem o mesmo espírito. Esta demonstração de Deus, portanto, não será uma demonstração futura. A igualdade existe hoje, portanto esta demonstração deve existir hoje também.
E como aconteceria esta demonstração? Vimos que é a ignorância humana que o faz não se preocupar com o julgamento. À medida que se torna mais ignorante sobre este assunto, ele passa a adotar para si, as mesmas condições que ele adotaria para um animal. Tanto ele como o animal não serão julgados, esta é a visão dele.
Da mesma forma, a morte passa a ser para ele, algo que o iguala ao animal. Pois o que ele vê é que da mesma forma que ele morre, o animal morre. Para ele não há diferenças. Para aquele que não entende as obras de Deus, sua morte é igual à morte do animal. Ele conclui que não possui nenhuma vantagem sobre os animais, como Salomão mesmo diz. E é através desta igualdade vista pelo homem sem entendimento, que Deus demonstra para ele que ele não sabe nada das obras de Deus.
E é por isto que Salomão pergunta depois de tudo:
(Ec 3.21) Quem sabe que o fôlego do homem vai para cima, e que o fôlego dos animais vai para baixo da terra?
Ninguém sabe disto. É por isto mesmo que se encaram como animais, e em consequência disto, fica claro para eles que eles não possuem entendimento sobre as coisas celestiais. O que eles entendem está restrito apenas aos fatos que acontecem debaixo do sol.
E nesta visão de incredulidade, é que Salomão termina o capítulo, dizendo:
(Ec 3.22) Assim que tenho visto que não há coisa melhor do que alegrar-se o homem nas suas obras, porque essa é a sua porção; pois quem o fará voltar para ver o que será depois dele?
Como disse Paulo, se Cristo não ressuscitou, comamos e bebamos que amanhã morreremos. A máxima do epicurismo se torna realidade aqui.
O problema aniquilacionista
Qual o problema da visão aniquilacionista, quando entendemos o que está sendo dito por Salomão? A questão é clara: o aniquilacionista declara como válida e verdadeira, a visão do homem que não entende as obras de Deus. O aniquilacionista abraça a falta de entendimento, e a comemora como algo válido. Ironicamente, o aniquilacionista se declara como o animal, e acaba sendo provado por Deus que ele não tem entendimento.
A própria pergunta de Eclesiastes 3.21 já deveria mostrar para o leitor da Bíblia que existe uma diferença entre o ser humano e o animal. Não só isto: o próprio julgamento mostrado por Salomão deveria mostrar isto. Mas vamos observar de novo o versículo 21:
(Ec 3.21) Quem sabe que o fôlego do homem vai para cima, e que o fôlego dos animais vai para baixo da terra?
A própria diferenciação que Salomão faz dos destinos de animal e homem já mostra uma diferença. O fôlego do homem vai para cima, e o dos animais vai para baixo da terra. Já mencionei esta diferenciação para aniquilacionistas, e fui criticado, inclusive ridicularizado por isto. No entanto, gostaria de mostrar a opinião de alguns estudiosos da Bíblia sobre o assunto, estudiosos respeitados.
A versão King James deste verso é a única que traduz, como agora apontado, conforme permite o texto hebraico. Está de acordo com os melhores intérpretes judeus e modernos. Uma pequena diferença de pontuação seria requerida para traduzir, “Quem sabe se o espírito dos filhos do homem vai para cima, e, se o espírito do animal vai para baixo?” etc., o qual não parece nem necessário nem apropriado, é sancionado pela Septuaginta e outras versões e por alguns intérpretes modernos.
Quem sabe – Esta expressão (usada também em Ec 2.19; Ec 6.12) não implica necessariamente em completa e absoluta ignorância. Em Sl 90.11, ela é aplicada para o que é parcialmente entendido: compare formas similares da expressão em Pv 31.10; Sl 94.16; Is 53.1. Além disto, é evidente de referências marginais que Salomão não duvidava da futura existência e destino da alma. Este verso só pode ser construído como uma confissão da grande ignorância no assunto.
“Albert Barnes”
A palavra רוח ruach, que é usada neste e no décimo nono versículo, tem duas significações, fôlego e espírito. Ela significa espírito, ou substância incorpórea, em distinção à carne, ou à uma substância corpórea, 1 Re 22.21, 1Re 22.22 e Is 31.3. E ela significa o espírito ou alma do homem, Sl 31.6; Is 57.16, e neste livro, Ec 12.7, e em muitos outros lugares. Neste livro é usado também para significar fôlego, espírito, ou alma de um animal. Enquanto se diz no versículo 19, que eles todos possuem um mesmo fôlego, ou seja, o homem e o animal vivem o mesmo tipo de vida animal; neste verso, uma apropriada distinção é feita entre o רוח ruach, ou alma humana, e o רוח ou alma animal: o primeiro vai para cima, o outro vai para baixo. A tradução literal destas importantes palavras é esta: “Quem considera que o רוח ruach, o espírito imortal dos filhos de Adão, que sobe? Ele é de cima (היא למעלה hi lemalah); e o espírito ou fôlego do animal que desce? Ele é de debaixo da terra”, isto é, ele tende para a terra somente. Este verso não dá suporte para a materialidade da alma; e ainda é o mais forte ponto que os frios e infrutíferos materialistas podem se refugiar.
Salomão mais evidentemente faz uma essencial diferença entre a alma humana e a animal. Ambos possuem almas, mas de diferentes naturezas: a alma do homem foi feita por Deus, e para Deus ela deve retornar: Deus é sua porção, e quando uma alma santa deixa o corpo, ela vai para o paraíso. A alma do animal foi feita para derivar sua felicidade de seu mundo inferior. Brutos deveriam ter uma ressurreição, e viver em uma alegria sem fim em uma nova terra. O corpo do homem deveria levantar, e juntar à sua alma que já está no alto; e ambas gozariam das bênçãos finais nas realizações de Deus. Que Salomão não acreditava no mesmo tipo de espírito, e na mesma sorte, como alguns materialistas e infiéis dizem, é evidente baseado em Ec 12:7: “O espírito deve retornar para Deus que o deu.”
“Adam Clarke”
Ec 3.21 – Quem conhece o espírito do homem que vai para cima?… Há realmente uma diferença entre um homem e um animal; apesar deles terem um fôlego, eles não tem um espírito ou alma; homem tem uma alma racional e imortal, a qual, quando morre, vai para cima para Deus que a deu; para ser julgada por Ele, e desfazer-se dele, em seus próprios aposentos, até o dia da ressurreição do corpo; e o espírito dos animais que vão para baixo da terra? Quando o animal morre, seu espírito vai para baixo da terra, de onde ele veio, e é transformada nela, e não mais existe. Mas quem é que vê isto, ou pode ver e saber com os olhos deste corpo, a diferença destes dois espíritos, ou a subida de um, e a descida de outro? Ou quem sabe pela força da razão, pela força de seu próprio entendimento, sem a divina revelação, que o homem tem uma alma imortal que vai para cima na morte, enquanto que a do animal vai para baixo? Nenhum homem, claramente e totalmente, como parece das dúvidas e meia fé do mais sábio Gentio sobre isto: ou preferivelmente quem sabe e considera esta diferença entre o espírito do homem e o espírito do animal, e pensa sobre si mesmo sobre a preciosa alma imortal que ele tem, e está preocupado com a salvação dela? Muito poucos; e portanto é como vivem e morrem como animais, da forma que fazem. A Midrash interpreta isto da alma dos justos que vão para o céu, e a alma dos injustos que vão para o inferno.
“John Gill”
Vv. 16-22: Sem o temor ao Senhor, o homem não é coisa alguma, senão vaidade; se ele for deixado de lado, os juízes não usarão o seu poder adequadamente. Há outro Juiz que está à porta. Com Deus há tempo para que as aflições sejam tiradas, embora em muitas ocasiões não o vejamos. Salomão deseja que os homens se dêem conta de que, ao escolherem este mundo como sua porção, colocam-se no mesmo nível dos animais; os homens não estão livres das aflições presentes e da futura prestação de conta, e retornarão ao pó do qual foi tomado. Pouca razão há de nos ensoberbecermos por causa de nosso corpo ou dos nossos dotes físicos! Porém, como ninguém pode compreender perfeitamente, poucos são os que consideram a diferença entre a alma racional do homem, e o fôlego ou a vida do animal. O espírito do homem ascende para ser julgado e logo é colocado em um estado imutável de felicidade ou miséria. Tão certo quanto a alma do animal desce à terra, perecendo na morte. É certamente lamentável o caso dos que têm como suas esperanças e maiores desejos, morrer como os animais. Que a nossa pergunta seja: Como pode uma eternidade de existência ser para nós uma eternidade de prazer? Responder isto é o grande desígnio da revelação. Jesus é revelado como o Filho de Deus e esperança dos pecadores.
“Matthew Henry – comentário conciso”
Ec 3.21 – Quem sabe – Nenhuma dúvida sobre o destino do espírito do homem (Ec 12.7); mas “como poucos, pela razão da moralidade exterior na qual o homem é tão responsável quanto o animal e na qual é a base da argumentação cética, compreende a grande diferença entre homem e o animal” (Is 53.1). O hebraico expressa a diferença fortemente, “O espírito do homem que ascende, pertence ao alto; mas o espírito dos animais desce, pertence para baixo, mesmo da terra.” Seus destinos e próprios elementos diferem completamente [Weiss].
“Jamieson, Fausset e Brown”
Ec 3:21 – “Quem sabe a respeito do espírito dos filhos dos homens, se eles vão para cima; e a respeito do espírito de um animal, se ele vai para baixo da terra?”. O sentido interrogativo de העלה e הירדת é reconhecido por todos os antigos tradutores: LXX, Targ., Siríaca, Jerônimo, Venet., Lutero. Entre os modernos, Heyder (vid. Psychol. P. 410), Hengst., Hahn, Dale, e Bullock tomam o h em ambos os casos como o artigo: “Quem sabe se o espírito dos filhos dos homens, os quais vão para cima…?” Mas (1) apresentada deste modo a questão não concorda com a conexão, que requer uma pergunta cética; (2) seguindo “quem sabe” após Ecl 2.19; 6.12 e Jos 2:14, uma continuação interrogativa da sentença seria esperada; e (3) em ambos os casos היא permanece como designação do sujeito somente para o propósito de marcar a cláusula interrogativa (cf. Jer 2.14), e de ressaltar que ha’olah e hayorěděth não são apostos pertencentes como objetos a רוח e ורוח. È questionável, de fato, se a pontuação dessas palavras, העלה e היּרדת , como elas se nos apresentam, procedem de uma passagem interrogativa. Saadia em Emunoth c. vi, e Judá Halevi em Kuzri ii.80, negam isso; o que fazem também Aben Ezra e Kimchi. E eles podem estar certos. Isso porque ao invés de העלה , a pontuação deveria ter sido העלה (cf. העלה, Jó 13.25) quando usada como interrogativo um ascendente; mesmo antes de א o comprimento compensatório do interrogativo há não é encontrado certamente em nenhum lugar.
(Note: ה deve ser lido com um Pattach em Juízes 6.31; 12.5; Ne 6.11; conforme Gn 19.9, 27.21. Em Números 16:22 o ה de האישׁ é o artigo, e a questão não está formalmente designada.
Em vez da reduplicação virtual; e portanto também o paralelo היּר não é para ser julgado após היּי, Lev_10.19, הדּ, Eze_18.29, – nós devemos permitir o que a pontuação busca, através da remoção dos dois interrogativos ha (ה), para colocar o que aqui é dito de acordo com Ec 12.7. Mas não há necessidade disso. Porque יודע מי realmente não cai naquilo que Lucretius diz (Lib. I):
“Ignoratur enim quae sit natura animai,
Nata sit an contra nascentibus insinuetur?
An simul intereat nobiscum morte diremta?”
Isto pode certamente ser dito de mi yode’a, assim como de ignoratur, o que não exclui todos os tipos de conhecimento, mas somente um conhecimento seguro e certo sobre áreas suficientes; interire e ירד לם são também raramente diferentes, porque nenhuma das duas palavras necessariamente significam aniquilação, mas ambas representam a descontinuação de uma existência individual independente. Entretanto, a colocação dessa questão pelo Koheleth (O Pregador) é diferente, porque revela mais definidamente do que o que Lucretius disse, a possibilidade de um fim diferente para o espírito de um homem em relação àquilo que espera o espírito do animal, e, portanto, de uma distinção específica entre esses dois princípios de vida. Na própria formação do dilema temos: se para cima ou para baixo, aqui reside um conhecimento inquisitivo; e não pode nos surpreender se Koheleth finalmente decide que o caminho do espírito de um homem é para cima, muito embora não seja dito que ele afirmou isso no campo da certeza demonstrativa. É suficiente que, com a necessidade moral de um julgamento final além da esfera da vida presente, ao mesmo tempo também a existência continuada do espírito do homem se apresenta a ele como um postulado de fé.
Alguém pode concluir do desiderium aeternitatis (Ec 3.11) implantado no homem pelo Criador, que, como os instintos implantados nos animais, isso será considerado não para decepção, mas para satisfação; e de למעלה, Pro 15.24 – i.e., o caminho de um homem sábio se movendo para cima das coisas temporárias, comuns, terrenais, – que a morte não porá um fim a este caminho, mas o ajudará a atingir o seu alvo. Entretanto, esta é uma prova indireta, a qual, entretanto, é sempre inferido à direta em força de argumento. Ele pressupõe que a Onipotência e Sabedoria que formaram o mundo são, ao mesmo tempo, Amor. Portanto, ainda que finalmente, é a fé que resolve o dilema, e nós vemos de Ecl 12.7, que é a fé que exerce influência sobre Koheleth. No Livro de Siraque, também, a velha concepção do Hades se mostra ainda dominante; mas após o ουκ ατηάνατος υιὸς αντηρώπου, 17.25, nós lemos até o final, onde ele fala de Elias: καὶ τὰρ ημεις ζωη ζησόμεθα, 48.11.
Nesta passagem que está diante de nós, Koheleth permanece em dúvida, sem ultrapassar isso pela mão da fé. Numa certa referência a questão que ele propõe aqui permanece não respondida até o presente dia; para a alma, ou, mais corretamente, de acordo com o modo bíblico de concepção do espírito do qual a vida-alma de todos os seres corporais procedem, é uma “monas”, e como tal é indestrutível. No futuro, a alma dos animais e a alma dos homens permanecerão em uma relação mútua e solidária, uma em relação à outra? De fato, a vida futura nos apresenta mistérios cuja solução se encontra além do poder do pensamento humano, e nós não precisamos imaginar que Koheleth, esse homem inteligente de mente sóbria, que era inacessível a uma fantástica auto-decepção, chega, pela linha de pensamento começada em Ec 3.6, uma vez mais ao ultimato.
“Keil e Delitzsch”