Encontramos três declarações no versículo “no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus” (João 1.1). Primeiro, o Verbo já existia no “princípio”; em segundo lugar, é uma pessoa distinta; em terceiro “o Verbo era Deus”.
1 – O VERBO DE JOÃO 1.1 E AS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ
O vocábulo “Verbo” é às vezes traduzido por “Palavra”, pois na língua grega é “logos”. Para os gregos o “logos” era um princípio divino que governava o universo. O vocábulo por si só significa: “razão, palavra, pensamento” etc… Não tem correspondente em língua moderna. O “logos” da filosofia era impessoal, mas o de João é uma pessoa. O “logos” da filosofia não é o mesmo de João 1.1. O Verbo eterno tornou-se Filho encarnado, quando foi gerado pelo Espírito Santo no ventre de Maria, cumprindo-se assim a promessa de Deus: “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Salmo 2.7; Atos 13.33). A partir daí “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (João 1.14). A ideia de João 1.1 é progressiva, uma declaração vai esclarecendo a anterior até culminar com a declaração enfática: “e o Verbo era Deus”.
Essa passagem é o tropeço das Testemunhas de Jeová. Vertem na Tradução do Novo Mundo: “e a Palavra era [um] deus”. Tal (tter) versão os torna uma movimento religioso heterodoxo politeísta: creem em mais dc um Deus. O próprio Jeová declara em sua Palavra: “antes de mim deus nenhum se formou e depois de mim nenhum haverá” (Isaías 43.10); “além de mim não há Deus” (Isaías 44.6). O que fazem agora as Testemunhas de Jeová com Jesus? Há um só Deus verdadeiro (João 17.3), as demais divindades são falsas.
2 – MONOTEÍSMO CRISTÃO
A fé cristã não admite a existência de outros deuses. É verdade que a Bíblia faz menção de deuses falsos. Se são falsos, não podem ser Deus. Uma nota falsa de um dólar representa um dólar? Claro que não. Um remédio falso pode ser considerado medicamento? O que acontece a um paciente ao tomar medicamentos falsos? O tal não lhe fará efeito algum, pois não é remédio. Da mesma maneira, deus falso não é divindade. A crença em um só Deus e nas demais divindades é henoteísmo e o Cristianismo é monoteísta.
É verdade que encontramos inúmeras vezes na Bíblia a palavra “deus”, com letras minúsculas, em nossas versões, para designar os objetos de culto dos pagãos como Baal, deus dos fenícios (Juízes 6.31; lReis 18.24); Quemós ou Camos, deus nacional dos moabitas (lReis 11.7) e Malcam ou Milcom, deus dos amonitas (lReis 11.33) identificado, às vezes, com Moloque (2Reis 23.10-13; Jeremias 32.35); Astarote, deusa dos sidônios (lReis 11.5,33); Dagon, divindade nacional dos filisteus (Juízes 16.23-24; ISamuel 5.7); Baal-Zebube, deus de Ecron, uma das cinco cidades federadas da Filístia (2Reis 1.2-3, 6,16); Adrã-Meleque, deus dos assírios (2Reis 17.31); Nisroque, também dos assírios (2Reis 19.37; Isaías 37.38); porque para esses pagãos são deuses, mas nunca para os hebreus. A Bíblia diz que esses “deuses” desaparecerão da Terra (Jeremias 10.11).
São deuses apenas na mente de seus adoradores. Na realidade não passam de ídolos. A Bíblia diz que eles não são de fato deuses: “Mas, quando não conhecíeis a Deus, servíeis aos que por natureza não são deuses” (Gálatas 4.8). São demônios que estão por trás desses ídolos (ICoríntios 10.19-21).
Ou as Testemunhas de Jeová admitem a Trindade, ou descambam para o politeísmo. Ou Jesus é o Deus verdadeiro, ou é uma divindade falsa. A organização das Testemunhas de Jeová coloca Jesus em pé de igualdade com Satanás no livro Poderá Viver para Sempre no Paraíso na Terra (p. 40), e na brochura Deve-se Crer na Trindade? (pp. 28-29), ao passo que a Bíblia diz que Jesus é mais sublime que os céus (Hebreus 7.26), está acima de todo o nome que se nomeia (Efésios 1.20-21) e é adorado pelos próprios anjos e por todas as criaturas no céu e na Terra (Hebreus 1.6; Apocalipse 5.11-13) como “o verdadeiro Deus e a vida eterna” (1João 5.20).
3 – A FALÁCIA EXEGÉTICA
A organização das Testemunhas de Jeová justifica sua tradução “e a Palavra era [um] deus”, em João 1.1, na Tradução do Novo Mundo, dizendo que não aparece o artigo definido grego “no” antes do nome “theos” (Deus), que é predicativo nesta oração. Dizem:
“O artigo definido (o) aparece na frente da primeira ocorrência de the-ós (Deus), mas não na frente da segunda ocorrência. A construção articular do nome, quando o artigo aparece, indica identidade, personalidade, ao passo que um nome predicativo, no singular, sem artigo e anteposto ao verbo (como está construída a sentença no grego) indica qualidade de uma pessoa. Portanto, o texto não diz que a Palavra (Jesus) era o mesmo que o Deus com quem estava, mas, antes, que o Verbo (a Palavra) era semelhante a um deus, era divino, era um deus” (Raciocínios à Base das Escrituras, p. 213).
Em outras palavras, o que eles estão dizendo é que para ser correta a nossa tradução “e o Verbo era Deus” o artigo definido grego ò (ho) deveria aparecer antes do nome theos, ficando assim o texto grego (kai ho logos en ho theos). Mas, se o texto joanino aparecesse dessa forma, estaria ensinando que o Verbo seria o Pai, doutrina sabelianista. Eliminando-se o artigo definido antes de theos, assim kai ho logos en theos, ou seja, o predicativo posposto ao verbo, ficaria do jeito que as Testemunhas de Jeová querem.
O logos, ou seja, a Palavra ou o Verbo, é o sujeito e por isso vem o artigo definido. Agora perguntamos, por que theos foi posto na frente e por que a ausência do artigo definido? Porque “o que Deus era, a Palavra era”. Essa ausência do artigo mostra a identificação da pessoa de theos (Deus-Pai) e do logos (Verbo). Essa construção nos diz que Jesus Cristo não é o Pai, mas que é Deus com todos os atributos do Pai.
Martinho Lutero disse que “a falta de um artigo é contra o Sabelianismo e a ordem da palavra é contra o Arianismo”. O Senhor Jesus Cristo, portanto, é Deus e tem todos os atributos que o Pai tem, mas não é a primeira Pessoa da Trindade.
—————-
Pr. Esequias Soares, líder da Assembleia de Deus em Jundiaí/(SP.
Professor de Hebraico e Grego, graduado em Línguas e Literatura Hebraica pela Universidade de São Paulo.