E ele me disse: Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; e o santuário será purificado. Dn 8.14
A primeira objeção, à interpretação dada pelos ASD ao texto de Daniel 8.14, repousa sobre o contexto imediato. Daniel 8.14 não menciona de forma alguma a ideia de uma purificação sendo realizada nos céus. Se considerarmos o contexto no qual está inserido o versículo 14, a partir do versículo 14, notamos que a narrativa começa falando do império grego de Alexandre, o grande (v. 21), o qual é retratado pela figura de um bode com um grande chifre vindo do ocidente (v. 5), e que na “sua maior força” teve o chifre (Alexandre) quebrado. Após o chifre ter sido quebrado, surgiram outros quatro chifres em seu lugar (v. 8), que representariam quatro reis (v. 22). De fato, após a morte de Alexandre, o grande, o seu reino foi dividido em outros quatro menos expressivos, liderados por Lisíaco, Cassandro, Ptolomeu e Seleuco. Esta interpretação é inquestionável, visto que as figuras da visão foram todas esclarecidas pelo mensageiro a Daniel (v. 15-25). Portanto, não repousam dúvidas sobre a identificação dos antítipos.
Se observarmos com bastante atenção, perceberemos que o “pequeno chifre” PROCEDE exatamente de um dos chifres (reis) que surgiram após a morte de Alexandre (v. 8-9), encaixando-se perfeitamente esta descrição com a dinastia selêucida que se estabeleceu na Síria, de onde veio Antíoco IV Epifânio ao invadir Israel. O que ainda fortalece mais esta identificação, é que o texto afirma que este “pequeno chifre” cresceria muito para a “terra formosa” (v. 9 – Israel), lançaria por terra e pisaria as “estrelas” (v. 10 – judeus piedosos), eliminaria o sacrifício diário (impedido por Antíoco em sua invasão a Israel) e seria momentaneamente bem-sucedido (v. 12).
Antíoco IV Epifânio devastou Jerusalém e profanou o templo ao sacrificar uma porca sobre o altar. Após este fato, ergueu um altar a Zeus, proibiu o sacrifício no templo, como havia sido previsto, prendeu vários judeus, e os vendeu como escravos (Dn. 8.11-12,23,25). Matatias Macabeu iniciou uma revolta contra esta dinastia síria, até derrotar o exército selêucida em 165 a.C, e em comemoração, rededicaram o templo, instituindo assim a “festa da dedicação” ou “das luzes” (o Chanuká – Jo 10.22-23). O livro de Daniel menciona até mesmo o fato histórico relacionado à morte sofrida por Antíoco IV Epifânio, que de acordo com a profecia bíblica não seria morto por ninguém (Dn. 8.25). Ainda sobre o caráter de Antíoco Epifânio, Flávio Josefo, historiador judeu, declara:
“Sua insaciável avareza fez que ele não temesse violar também a sua fé, para despojar o templo de tantas riquezas que se sabia estava ele cheio. Tomou os vasos consagrados a Deus, os candelabros de ouro, a mesa sobre a qual se punham os pães da proposição e os turíbulos. Levou mesmo as tapeçarias de escarlate e de ouro fino, pilhou os tesouros, que tinham ficado escondidos por muito tempo; afinal, nada lá deixou… mandou também construir um altar no templo e lá fez sacrificar porcos, o que era uma das coisas mais contrárias à nossa religião. Obrigou então os judeus a renunciarem ao culto do verdadeiro Deus… Mandava queimar todos os livros das Sagradas Escrituras e nu perdoava a um só de todos aqueles em cujas casas se encontrava” (História dos Hebreus, Vol. 2, p. 25). Esta é uma das mais claras profecias do livro de Daniel, nac deixando dúvidas sobre o significado dos símbolos.
Os ASD vêm tentando encontrar no versículo 14 um evento que simplesmente não existe, de acordo com a sequência histórica tratada no capítulo oito. O que uma referência bíblica que trata de fatos históricos sequenciais a respeito de dois impérios e das quatro dinastias tem a ver com a obra de Cristo como juiz no céu? Por que uma passagem que trata de fatos históricos terrenos possui, repentinamente, uma mudança de direção para um sentido espiritual da obra de Cristo? Como o “templo celestial” poderia ser profanado por algo vindo do império grego (o “pequeno chifre”) para que fosse “purificado”? Como o “sacrifício contínuo” do templo celestial poderia ser tirado? Onde na Bíblia temos a informação de que se faz sacrifício no céu? Teria o mal prosperado no céu, como declara versículo 12? Só chegaremos a esta interpretação se desassociarmos o texto de seu contexto imediato.
As 2.300 tardes e manhãs do período no qual o templo seria purificado, de acordo com a profecia bíblica, correspondem exatamente ao período de tempo que o templo de Jerusalém permaneceu “profanado” sob a ordem de Antíoco IV Epifânio (168-165 a.C), até a vitória e rededicação dos Macabeus (se interpretarmos as “2.300 tardes e manhãs” como se referindo a 1.150 dias, esta linha de interpretação divide o número 2.300 por dois, ao crer que a expressão “tardes e manhãs” se refere apenas às duas partes da divisão em quartos do período de um dia de 24 horas). Uma prova deste fato é o seu uso para se referir a dias literais em Génesis 1.5,8, 3. Ainda outra linha interpretativa acredita que as 2.300 tardes e manhãs seria um período de dias literais um pouco mais extenso com relação ao período histórico que se conhece do governo de Antíoco Epifânio.
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Fonte: Livro – Os Sete Mitos do Adventismo, Paulo Sérgio Rodrigues Batista, 1ª edição, CEKAP, 2011.