Calvino não abria exceções para o fatalismo divino. Para ele, tudo, tudo mesmo, incluindo pensamentos humanos e coisas inanimadas, foi tudo determinado por Deus por Seu decreto antes da fundação do mundo, de modo que “nada acontece, a não ser por sua determinação” [Institutas, 1.17.11.], uma vez que “não há nada mais absurdo do que alguma coisa acontecer sem que Deus o ordene” [Institutas, 1.16.8.]. Que era assim que Calvino via as coisas, isso fica claro em outras analogias que ele faz, como quando diz que os assassinatos são fruto do decreto divino: “Imaginemos, por exemplo, um mercador que, havendo entrado em uma zona de mata com um grupo de homens de confiança, imprudentemente se desgarre dos companheiros, em seu próprio divagar seja levado a um covil de salteadores, caia nas mãos dos ladrões, tenha o pescoço cortado. Sua morte fora não meramente antevista pelo olho de Deus, mas, além disso, é estabelecida por seu decreto” [Institutas, 1.16.9.] Portanto, para Calvino, Deus não apenas tem presciência do crime, mas ele também estabelece o crime. Os crimes não são fruto de um livre-arbítrio humano mal utilizado e antevisto por Deus, mas são frutos diretos do decreto divino e tais homens são meramente instrumentos nas mãos de Deus, que não podiam fazer nada a não ser executar o crime. É por isso que ele diz que todo o mal dos ímpios procede do decreto divino que lhes é infligido: “Do quê concluímos que nada de mal eles sustém que não proceda do justíssimo juízo de Deus que lhes é infligido” [Institutas, 3.23.9.].
Como podemos ver claramente, quem disse que o decreto de Deus na Bíblia é horrível e horripilante não foram os arminianos ou wesleyanos, mas João Calvino… “certamente confesso ser esse um decretum horribile” [Institutas, 1.16.9.]. Então, sim, no calvinismo Deus é despótico. E no arminianismo, Ele é o Soberano que se resigna por amor (Jo 3.16; I Jo 4.8) – assim fez Jesus – tornou-se homem (I Tm 2.5 Jo 1.1) e menor que os Anjos (Hb 2) e em nenhum momento ele foi um Deus menos soberano. Afinal de contas, o Deus da Bíblia tem soberania até para resignar-se…”Voltaram atrás, e tentaram a Deus, e limitaram o Santo de Israel.” (Sl. 78.41 ARC)
Explicação sobre a Palavra “Soberano”:
Há duas palavras gregas comumente traduzidas por “soberano” no Novo Testamento. Uma é dunastes, que, de acordo com a Concordância de Strong, significa: “príncipe, potentado; cortesão, alto oficial, ministro real de grande autoridade” (1414), e a outra é despotes, que significa: “mestre, Senhor” (1203). É digno de nota que não há nenhum léxico que inclua determinar cada ação como um sinônimo ou mesmo um atributo necessário para essa soberania. São coisas diferentes. Ser soberano é ser senhor sobre tudo, é ter controle e domínio sobre todas as coisas; determinismo, por outro lado, é determinar cada ato do indivíduo, o que vai muito além do conceito básico de soberania.
Nota do Pr. Martinez:
PARAFRASEANDO JOÃO CALVINO – “Imaginemos, por exemplo, uma criancinha Síria que, havendo entrado em uma embarcação junto com seus genitores, fugindo dos horrores da guerra em seu país, imprudentemente nas mãos de coiotes (homens que traficam pessoas) é levado a um naufrágio trágico e seu corpinho e de toda sua família são encontrados mortos na praia. Suas mortes foram não meramente antevista pelo olho de Deus, mas, além disso, é estabelecida por seu decreto” [Institutas, 1.16.9.]
É POR ISSO QUE NÃO SOU CALVINISTA. É POR ISSO QUE NÃO TEMOS CALVINISMO NA BÍBLIA.
Nota: Extraído do livro “Calvinismo X Arminianismo: quem está com a razão?”, cedido pela comunidade de arminianos do Facebook