Outro ponto a salientar que, inclusive, joga uma pá de cal sobre o assunto é o fato de que ao se referir à lei, Cristo utiliza-se de termos técnicos, ou seja, termos jurídicos muito claros para os judeus, que acostumados às exegeses jurídicas a respeito da lei quer por parte dos jurisconsultos romanos, quer por partes dos fariseus, saduceus, escribas e afins, puderam compreender muito bem quando Cristo lhes dissera: “Não Cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim AB-ROGAR, mas cumprir”. (Mateus 5.17). Cristo poderia muito bem ter dito apenas “revogar” (ou seja, termo genérico para a extinção de uma lei), não, ele não disse revogar, disse “ab-rogar” e aqui vale adentrarmos ao campo do Direito para esclarecer que existem duas maneiras, duas espécies de revogação (termo genérico) de uma lei, a saber: derrogar e ab-rogar (espécies de revogação). DERROGAR quer dizer: extinguir uma lei parcialmente, ou seja, parte de determinada lei continua a viger, enquanto parte dela se extingue com a entrada em vigor de uma NOVA LEI. AB-ROGAR, ao contrário, quer dizer revogar ou extinguir uma lei por completo. Pois bem. Cristo não veio para extinguir a lei por completo – AB-ROGA-LA, mas parcialmente, ou seja: DERROGA-LA. Ao lançar mão do termo técnico AB-ROGAR, (extinguir uma lei por completo) Cristo deixou entendido muito claramente para os seus ouvintes judeus – romanizados, que veio sim, para DERROGÁ-LA, ou seja, revogá-la ou extingui-la parcialmente. Note-se: “não vim AB-ROGAR, mas cumprir, ou seja, não veio para extinguir a lei por completo, mas parcialmente: derrogá-la. Não fosse assim, limitar-se-ia em dizer e utilizar-se da expressão genérica “revogar” a lei. Ora, ao dizer “ab-rogar”, automaticamente excluiu a possibilidade de revogar a lei por completo, mas sim revogar parcialmente, ou seja, derrogá-la, isso sim. Então ao texto Pode-se dar a seguinte interpretação: Não Cuideis que vim destruir a lei ou os profetas, mas sim derrogá-la. Vale dizer que Cristo, na Cruz, cumpriu toda a lei, porém, derrogou-a, extingui-a parcialmente para excluir, inclusive, o cumprimento do sábado pela igreja que observa uma nova lei sancionada por Ele. Tanto revogou parcialmente (derrogou-a) que nos versículos que se seguem preleciona que: versículo 21: “Ouvistes que foi dito aos antigos: não matarás… EU, PORÉM, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão será rel de juízo…” Nesse sentido vide: v. 27-18; v. 31-32; v.33-34. v. 38-39. Ora, não se pode dizer, ao menos sem causar embaraço, que a lei não foi modificada por Cristo, aperfeiçoada, melhorada, derrogada, portanto; entrando em vigor, a partir da modificação da lei imposta por Ele, uma nova norma – a de Cristo que é o senhor da lei, e não o contrário. Para melhor exemplificar, e agora, falando empiricamente em relação ao tema: a Constituição Federal Brasileira de 1988 manteve em seu bojo muitas das normas que vigoravam na época da Ditadura, conservou algumas daquelas normas por não apresentarem afronta às normas que vigoram sob um novo regime, a saber o Estado Democrático de Direito. De outro lado, aboliu outras normas que vigoravam sob aquele regime. Sem falar de inúmeras normas que levam para o texto de uma nova lei, parte do texto antigo. De forma análoga, a Igreja é comparada a antiga nação de Israel, quando é denominada de Ekklêsia. Os Apóstolos em particular, Paulo, aproveita a descrição de Israel no AT, aplicando à igreja do NT o termo “povo de Deus” – II Co 6.16. Urge rememorar que Israel enquanto permanecia no Egito era apenas uma espécie de Tribo, um povo sem território, sem leis com força erga omines (normas que a todos vinculam indistintamente – leis que emanam de um Estado) e sem governo. Somente após Israel aceitar a aliança proposta por Jeová eles se tornam a nação de Israel, com leis, governo e, futuramente com um território. A Igreja da Nova Aliança tomou o lugar da nação de Israel – não é sem razão que o apóstolo Paulo usa termos específicos inerentes à nação de Israel para atribuí-los à Igreja – vide Fp 3.20 para a palavra pátria ou cidadania; ainda Pedro reporta-se à Igreja como nação em I Pe 2.9. Termos estes que implicam serem os cristãos não meramente um ajuntamento indiscriminado de pessoas, mas uma nova nação, com uma nova lei, sob um novo governo, possuindo uma nova pátria e …porque não, um novo dia ?!. Neste contexto muitas coisas da antiga lei foram incorporadas e ajustadas à nova realidade da lei de Cristo. A lei de Cristo contém em certos aspectos, alguma correspondência com a lei de Moisés, uma vez que esta era “sombra das coisas que haviam de vir”. Por exemplo, os nove mandamentos são novamente reiterados no NT com ligeiras modificações como, por exemplo, no quinto mandamento, há referencia à terra de Canaã, mas Paulo modifica-o em Ef 6.2 generalizando-o. Os cristãos não são um povo anárquico, sem lei (Rm 6.15), estamos debaixo da lei de Cristo (Gl 6.2). A lei de Moisés era constituída por proibições, ameaças e penalidades. Seu objetivo era reprimir os homens de crimes abertos. Tratava principalmente com o exterior. Mas a nova lei vem escrita em nossos corações (II Co 3.3,7,8,10,11).
Colaboração neste artigo:
Dr. Eliezer Mello
Prof° Paulo Cristiano da Silva
Prof° João Flávio Martinez