Crucificando o velho homem

A expressão “velho homem” se deriva do primeiro Adão, ou seja, daquele que viveu antes da graça, antes de haver surgido a ima­gem do segundo Adão – Jesus Cris­to. Refere-se também à natureza an­tiga, ao homem não-regenerado. que vive como se Deus não existisse, com disposições profanas e afetos pecaminosos. Este homem é chama­do “velho” porque é contrastado com o “novo homem”‘, que agora c a nova expressão de seu ser (Ef 4.22 e Cl 3.9-10).

O “velho homem” faz do corpo físico seu escravo, pois o pecado é concebido como o senhor para quem o corpo pertence e é obediente. Mas esse escravo pode mudar de senho­res, conforme nos mostra o contexto do capítulo 6 de Romanos.

O pecado, na teologia paulina, é visto como o feitor de escravos em cujas mãos estava o domínio de nos­sa vida antes de nos entregarmos a Cristo. Desde que morremos para o pecado, somos declarados libertos dessa servidão. Foi a cruz que matou Jesus, cm sua natureza humana; por semelhante modo, a cruz deve matar o nosso “velho homem”, para que a novidade de vida seja concreta.

A expressão “corpo do pecado”, utilizada pelo apóstolo, refere-se tan­to ao corpo físico como veículo do pecado, por conta dc os membros aparecerem como instrumentos da injustiça (vl3), como faz alusão ao próprio pecado, sob a figura simbó­lica do corpo.

O ensino de Paulo com respeito ao pecado é que estamos mortos e sepultados, e como Cristo foi ressus­citado dentre os mortos através do glorioso poder de Deus, assim pelo poder do Cristo ressurreto devemos experimentar e exibir uma vida de nova virtude e santidade. “Porque, se fomos plantados juntamente com ele na semelhança da sua morte, também o seremos na da sua ressurreição”. v5. Paulo estende-se ao relacionar a ideia da morte ao pecado, lembrando-nos que, como crentes, nosso homem ve­lho foi crucificado com Cristo. Isso equivale a dizer que nossas antigas disposições, apetites e desejos impró­prios foram postos à morte. São trata­dos como um “corpo de pecado” que foi morto na cruz com Cristo.

Nova vida

A vida cristã, entretanto, não con­siste apenas em libertação do peca­do. É uma vida ressurrcta, vivida pelo poder do Cristo ressurreto. Paulo de­clara que “se já morremos com Cristo, cremos que também com ele vi­veremos”, v8. Assim como Ele mor­reu de uma vez para sempre e vive agora para Deus, também nós somos considerados como mortos para o pe­cado de uma vez por todas, de sorte que daqui por diante possamos viver em obediência a Deus. E isto o que o apóstolo quer dizer quando exorta: “Assim também vós considerai-vos como mortos para o pecado, mas vi­vos para Deus em Cristo Jesus”, v1l.

A expressão “considerai-vos” tra­ta de um apelo no sentido de que os crentes se apropriem da posição que possuem em Cristo, mediante ações espirituais certas, que refletem na conduta diária a comunicação real do Espírito Santo, ensinando como é Cristo às nossas vidas.

O pedido paulino a que nos con­sideremos mortos para o pecado e vi­vos para Deus é outra maneira de di-zer-nos que devemos ter o cuidado de alcançarmos progresso em nossa espiritualidade. O crente sincero, sa­bendo o que Cristo fez. bem como o destino glorioso que proveu para os sal­vos, não pode dei­xar de sentir um senso de obrigação de viver piedosa­mente, tanto no to­cante à santificação íntima como no que se refere à ação altruísta em favor dos semelhantes, que é a manifestação do amor de Cristo em nós. E assim que nos devemos considerar.

Resistir ao pecado

Conquanto possamos afirmar que a crucificação do “velho homem” seja verdade indiscutível, consuma­da, não negamos o fato de que nos­sas disposições e paixões vis ainda são ativas e poderosas. Devemos, po­rém, rejeitar-lhes o domínio. Preci­samos confiar em Cristo para rece­bermos forças. A vida do crente não precisa ser um viver simplesmente de incessante conflito; deve ser uma existência de vitória cada vez mais acentuada.

Esta é a verdade que Paulo tem em mente ao fazer sua exortação fi­nal. Insta conosco a que não reconhe­çamos o reino do pecado, a que re­cusemos obedecer aos desejos im­próprios, a que não ofereçamos o corpo como instrumento de injustiça, mas, ao contrário, como quem faz parte dos que ressuscitaram dentre os mortos, que apresentemos nossos membros a Deus como instrumentos de justiça. A razão que o apóstolo estabelece para tal exortação é que como crentes em Cristo, a Ele liga­dos em vital união, o pecado sobre nós nenhum domí­nio terá. O versículo 14 declara que não estamos debaixo da Lei, mas de­baixo da graça.

A Lei não tem em si mesma po­der algum para livrar. Antes, torna-se um incentivo para o pecado, au­mentando, inclusive, a culpa. A gra­ça, por outro lado, é suficiente para suprir todas as nossas necessidades; e o método de justificação que é pela fé e se origina na graça resul­ta em uma experiência que se pode verdadeiramente designar como es­tando morto para o pecado e vivo para Deus.

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Fonte: Paulo Cesar Lima da Silva (Revista Pentecostes – cpad – Junho/2000).

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