O Fundamento da Teologia Católica
Mesmo de relance poder-se-á constatar ser a maior parte das doutrinas da dogmática católica procedente de fonte diversa da Bíblia.
Suas informações relativas aos sacramentos, a mariologia, a sucessão e colegialidade dos bispos, a infalibilidade e primado do papa, à sua organização eclesiástica, ao purgatório e sufrágio dos mortos, ao culto dos santos, alicerçada, aliás, na pretendida sucessão apostólica dos seus bispos?
Essa fonte diferente é chamada de TRADIÇÃO
E o que seria do catolicismo sem os sacramentos? Sem a mariologia? Sem a sua organização eclesiástica alicerçada, aliás, na pretendida sucessão apostólica dos seus bispos?
O que seria do catolicismo sem o purgatório e o sufrágio dos mortos?
O que seria do catolicismo sem o culto dos santos?
O que seria, enfim, do catolicismo sem a TRADIÇÃO que invalida a Palavra de Deus?
Em conseqüência, é impossível conhecer-se a dogmática católica sem o esclarecimento do conceito de sua TRADIÇÃO, vocábulo retirado etimologicamente do verbo latino TRANSDO, que quer dizer: entrego ou transmito qualquer coisa. Ë a transmissão de suas doutrinas de geração em geração, ou a própria doutrina recebida por esta via.
Os Teólogos católicos, na esteira do Concilio Tridentino, definem a TRADIÇÃO COMO O CONJUNTO DE DOUTRINAS REVELADAS REFERENTES À FÉ E À MORAL, NÃO CONSIGNADAS NAS ESCRITURAS SAGRADAS, MAS ORALMENTE TRANSMITIDAS POR DEUS À IGREJA (Sessão IV, de 8 de Abril de 1546, sob o pontificado de Paulo III).
Pelo próprio fato de haver o catolicismo engendrado outra fonte de Revelação Divina que não a Bíblia, demonstra o seu menosprezo a esta. Conseqüentemente, se ele quisesse agora aceitá-la com todo o seu valor de único e exclusivo depósito de fé, deveria, alto e bom som, proclamar sua repulsa à Tradição, pantanal da congérie de suas aberrações.
O Concilio Vaticano II, porém, e em que pesem suas propostas ecumenistas, «seguindo as pegadas dos Concílios Tridentino e Vaticano 1!» (Constituição Dogmática «Dei Verbum>>, promulgada na sessão IV do Concílio Vaticano II, em 18 de Novembro de 1965, sob o pontificado de Paulo VI – § 1), deliberou confirmar a atitude católica perante o alicerce de suas doutrinas.
Realmente no § 9 dessa sua Constituição promulgada nas vésperas do seu encerramento, se lê: «… A SAGRADA TRADIÇÃO.., transmite integralmente aos sucessores dos Apóstolos a Palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos para que, sob a luz do Espírito de Verdade, eles em sua pregação, fielmente, a conservem, exponham e difundam».
Por conseguinte, a Tradição se apresenta como outro manancial de informes dentro da própria Revelação Divina. Manancial anterior, mais completo, mais claro três mais seguro do que as Escrituras.
E sob este aspecto que o Concilio Vaticano II lembra: Pela mesma Tradição.., as próprias Sagradas Escrituras são nela cada vez melhor compreendidas e se fazem sem cessar atuantes» (Constituição Dogmática «Dei Verbum — § 8).
Reconhecem os teólogos católicos haver, às vezes, coincidência em algum ponto doutrinário entre a Bíblia e a Tradição, no caso, chamada INESIVA, como por exemplo, a ressurreição de Cristo.
A TRADIÇÃO EXCEDENTE ou CONSTITUTIVA, o verdadeiro arsenal da dogmática católica, abrange todas as doutrinas não encontradas na Bíblia e que se constituem em totalidade na dogmática católica.
Ë evidente que esta Revelação Oral, posteriormente pôde conservar-se e propagar-se por escrito. Essa escrita, distinta das Sagradas Escrituras, encontra-se, por exemplo, nas obras de escritores eclesiásticos do catolicismo primitivo.
E julgadas como um mesmo e integro depósito da Revelação, o Concilio Vaticano II, cumprindo o seu desígnio de seguir as pegadas dos Concílios de Trento e Vaticano 1, exige o mesmo sentimento de reverência e piedade para a Tradição e para a Bíblia: «ambas (Escritura e Tradição) devem ser recebidas e veneradas com igual sentimento de piedade e reverência» (Constituição Dogmática «Dei Verbum» — § 9).
Destarte, assim como o cristão, reverentemente, se vale das Escrituras para argumentar as razões de sua fé, o católico esclarecido — coisa raríssima! — busca os motivos de suas crenças na Tradição.
Certa feita vi uma discussão entre um pastor evangélico e um católico, por sinal congregado mariano, sobre a assunção corporal de Maria. O pastor queria do seu controversista um texto bíblico onde se pudesse ao menos vislumbrar o dogma debatido. É natural que não se poderá encontra-lo. Mas, a disputa ficou sem resu1tado porque cada um se baseava em terreno diferente. E o mesmo ardor do evangélico pela Bíblia se repetia no mariano pela Tradição.
De maneira alguma, neste último Concilio, o catolicismo abriria mão desta fonte de suas doutrinas a menos que concordasse em deixar de ser catolicismo.
Aliás, é fácil depreender-se o porquê do seu maior interesse pela Tradição considerada por ele como regra de fé mais importante por ser anterior, mais ampla e mais clara do que a Bíblia.
Ela é elástica, amoldável e acomodatícia. Sacia-lhe melhor a sede de sofismar!
Se bem que recomende «igual sentimento de piedade e reverência» para a Escritura e para a Tradição, a verdade é que esta lhe merece mais atenções porque as próprias Sagradas Escrituras são nela (Tradição) cada vez melhor compreendidas» (Constituição Dogmática «Dei Verbum» — § 8).
Destaque-se a seguinte observação: estas expressões que sobrelevam a Tradição em desapreço da Bíblia, não são do Concilio de Trento, realizado no século XVI, que, como movimento de contra-Reforma, objetivou elevar a& máximo o valor de sua principal fonte doutrinária. Estas expressões são recentíssimas. São deste último Concilio Ecumênico de cujos interesses se destacam os acenos de convites aos “irmãos separados» (?!)
Em favor das Sagradas Escrituras, como depósito de fé, militam abundantíssimos argumentos. O catolicismo, porém, se vê em. palpos de aranha para argumentar em defesa de sua tradição.
Sua argumentação no caso é tão raquítica que causa compaixão. Ë mais fraca do que o café muito fraquinho. Conta se que foi feito um café muito fraco, mas tão fraquinho que não tinha ânimo e coragem nem para sair do bule.
Os argumentos em que o catolicismo baseia a sua Tradição são anêmicos em extremo e pasmam a qualquer pessoa de inteligência mediana.
Dentre eles vamos considerar o seguinte:
Antes de Moisés nada havia escrito. Deus se revelava lentamente e sua doutrina foi transmitida oralmente. Só muito mais tarde veio a Escritura.
Desde a origem do mundo até Moisés, a primitiva revelação de Deus, verbalmente dada aos homens, foi conservada por sucessão entre os patriarcas e não em escrituras.
Já se vê, cavilam os teólogos católicos, que o próprio Moisés, ao escrever o Gênesis precisou abeberar-se na Tradição, esse primeiro e genuíno canal da Revelação Divina.
Foi na Tradição que o autor do Pentateuco colheu informes sobre a criação do mundo ex nihilø e a queda do primeiro homem, sobre a propagação do gênero humano e sua geral corrupção, sobre o dilúvio, os descendentes de Noé e a confusão das línguas, sobre a vocação de Abraão e sua empolgante biografia, sobre Isaque e as peripécias dos filhos de Jacó, sobre José e a ida dos seus irmãos para o Egito.
Para o catolicismo, na conformidade de sua argumentação e esquecido de que Moisés fora divinamente inspirado e assistido, o primeiro livro da Bíblia, o Gênesis, nada mais é do que a Tradição estampada em letras de forma.
A BÍBLIA DESDE OS PRIMÓRDIOS.
Todos os acontecimentos relatados em Gênesis se deram séculos antes de serem escritos por Moisés, o Autor divinamente inspirado do Pentateuco.
A transmissão oral ou escrita de fatos históricos não se constitui em fonte de Revelação Divina!
Não negamos haver Moisés colhido informes aqui e ali, com uns e outros. Mas, a esta simples verificação de fatos históricos atribuir-se uma importância de fonte de Revelação é negar ou pelos menos depreciar a inspiração divina da primeira parte do Velho Testamento. O passo é muito grande. Ë um salto mortal de causar arrepios!
A simples leitura de Gênesis demonstra que Deus não confiou na Tradição Oral.
Abraão é o primeiro dos patriarcas e vocacionado para formar uma grande nação. ‘de ti farei uma grande nação… ‘ (Gên. 12:2). ‘Far-te-ei fecundo extraordinariamente, de ti farei nações, e reis procederão de ti’ (Gên. 17:6). Foi ao estabelecer este concerto com o patriarca que Deus lhe mudou o nome de Abrão para Abraão, que quer dizer pai de muitas nações ou duma multidão. «Dar-te-ei e à tua descendência a terra das tuas peregrinações, toda a terra de Canaã, em possessão perpétua, e serei o seu Deus» (Gên. 17:8).
Da mesma maneira como Deus se revelara, em circunstâncias especiais diretamente a Adão e Noé, e interferira também diretamente em certos episódios, como por ocasião da queda do homem, do dilúvio, da confusão das línguas, agora interfere diretamente e vocaciona Abraão, estabelecendo um concerto especial, para ser o pai de um povo peculiar e santo de cujo seio sairia o Redentor.
Isaque é o segundo personagem da estirpe da promessa e tem dois filhos: Esaú e Jacó, sendo o terceiro elo nessa corrente de formação do povo eleito.
A Jacó disse o seu pai Isaque, lembrando-se da bênção do Senhor: «Levanta-te, vai a Padã-Arã, à casa de Betuel, pai de tua mãe, e toma lã por esposa uma das filhas de Labão, irmão de tua mãe. Deus Todo-Poderoso te abençoe e te faça fecundo, e te multiplique para que venhas a ser uma multidão de povos; e te dê a bênção de Abraão, a ti, e à tua descendência contigo, para que possuas a terra de tuas peregrinações, concedida por Deus a Abraão (Gên. 18:2-4).
‘Acaso não seria suficiente essa tradição oral da promessa e da bênção? E uma tradição muito curta, apenas entre Abraão e Jacó, mediando somente Isaque!
O Senhor, porém, não aceita a tradição oral como fonte ou mesmo sustento de sua Revelação e interfere diretamente. E na visão de Betel, Jacõ ouve o Senhor:
Eu sou o Senhor, Deus de Abraão, teu pai, e Deus de Isaque. A terra em que agora estás deitado, eu ta darei, a ti e à tua descendência. A tua descendência será como o pó da terra; estender-te-ás para o Ocidente, e para o Oriente, para o Norte, e para o Sul. Em ti e na tua descendência serão abençoadas todas as famílias da terra» (Gên. 18:13-14).
A mesma Promessa agora repetida diretamente pelo Senhor a Jacó e não através de Tradição alguma! — quase com as mesmas palavras fora dita ao seu ancestral mais próximo, a Abraão, logo após separar-se de Ló (Gên. 13:14-16).
E a vida de Jacó é toda pontilhada de interferências diretas de Deus! Seu nome também é mudado no incidente de Peniel quando lutou com o anjo até prevalecer e ser abençoado. Passou-se a chamar Israel, pois como príncipe lutara com Deus e com os homens. E prevalecera! (Gên. 32:28).
No futuro, Israel seria o nome do povo eleito do Senhor!
Dentre os doze filhos de Israel, destaca-se José, que, em circunstancias memoráveis, foi para o Egito (Gên. 37:41), onde mais tarde recebeu seu velho pai e seus irmãos acossados pela fome (Gên. 42-50).
Mesmo para esta viagem, o servo do Senhor esperou a Sua manifestação direta. «Eu sou Deus, o Deus do teu pai; não temas descer para o Egito porque lã eu farei de ti uma grande nação» (Gên.46:3).
Deus a repetir a mesma Promessa! Em 1706 antes de Cristo é que, no Egito, se fixou esse povo peculiar de Deus, cumprindo-se assim a Palavra do Senhor a Abraão (Gên. 15:13).
Não se pense que era um povo grande em número.. Em Gên. 46:1-27 são relacionados os nomes dos membros desse pequenino povo composto apenas de setenta pessoas.
Setenta pessoas! Filhos, noras e netos do velho patriarca!
Nos primeiros 126 anos de sua permanência no Egito, esse povo muito prosperou e cresceu. E ..• os filhos de Israel foram fecundos, aumentaram muito e se multiplicaram… (Êx. 1:7). Os setentas se multiplicaram em dois milhões!
Levantando-se, entretanto, uma nova dinastia, mudou-se a situação e esse povo vocacionado para urna incumbência especial, cativo, passou a sofrer duras peripécias durante mais de um século, quando Deus promoveu sua libertação suscitando Moisés. Fala-lhe da sarça ardente o Senhor: «Certamente tenho visto a aflição do meu povo… (Ëx. 3:7). … Pois o clamor dos filhos de Israel chegou até Mim… »(Ex.3:9).
Irá Deus permitir o retorno na conformidade de Gên.15:16.
Como a recordar a Sua Promessa, o Senhor se identifica: Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó» (Êx. 3:6,15,16). E aquele povo que é o Seu, Ele chama: «meu povo» Ëx. 3:9,10,11,13,14,15). Ë a lembrança da Promessa de Deus a Moisés! Não mandou Moisés consultar os anciãos sobre ela. Mencionou-a diretamente!
E o argumento da teologia católica em favor de sua Tradição?
Já está por terra!
Prossigamos em nossa consideração grata a Deus por sua maravilhosa Revelação contida na Bíblia em nosso beneficio.
Nesta conjuntura da História de Israel, o Senhor suscita em Moisés o grande líder para libertar o Seu povo, levando-o à Canaã Prometida, a Palestina, o centro geográfico do mundo de então para de lá, como de centro irradiador, difundir a Sua Palavra e fazer cumprir o Seu Plano Salvífico.
As peripécias da jornada, os desalentos dos tímidos e as murmurações dos descontentes não puderam embargar aquela nação de contemplar, na maior de todas as epopéias da História, as manifestações palpáveis do Poder de Deus.
As pragas do Egito, a libertação memorável do seu cativeiro, a passagem espetacular do Mar Vermelho, a abundância de maná, o vôo razante das codornizes, o jorrar abundante da água no deserto de Sim, a vitória surpreendente sobre os amalequitas, tudo empolgava os filhos de Israel, quando, exatamente no instante de seu sucesso na campanha dos amalequitas, pela primeira vez, Deus ordena a Moisés: ESCREVE ISTO PARA MEMÓRIA NUM LIVRO» (Ëx. 17:14).
Por que o Senhor não confiou na Tradição Oral?
Se antes, quando se tratava de Sua Promessa não confiou na Tradição Oral, mas diretamente Ele falou aos patriarcas desde Abraão, não seria agora ao separar o Seu povo, tirando-o do Egito, que iria confiar Sua Lei e Sua Revelação à Tradição Oral!
«ESCREVE ISTO PARA MEMÓRIA NUM LIVRO»!!!
Recorde-se à dificuldade imensa que envolvia a arte de escrever antes da descoberta da imprensa por Gutenberg em meados do século XV.
Naqueles remotíssimos tempos o instrumento apto para ensinar e legislar era a palavra oral.
Este veículo do pensamento teve sua ampla aplicação no setor da religião. Compulsando-se a História das religiões mais antigas, verifica-se que elas dependiam de um patrimônio doutrinário transmitido de geração a geração por via meramente oral. Em certos sistemas religiosos os fiéis se negaram sempre a escrever alguns dos seus preceitos mais caros.
Ë de se observar, por• exemplo, a fórmula freqüentíssima: «Eu ouvi… » adotada na primitiva religião chinesa, da qual procedem o taoísmo e o confucionismo.
Chama a atenção para o nosso caso ainda mais a circunstância assaz agravante de estar o povo de Israel acampado no deserto, com dificuldades humanamente instransponíveis para executar a arte da escrita.
A História das religiões dos homens revela o apreço à Tradição Oral por ser esta mais fácil em amoldar-se aos seus capricho4s circunstanciais.
São notáveis os inúmeros pontos de contato do catolicismo com essas religiões, inclusive o seu apego a esse veiculo de transmissão doutrinária e depósito dos seus ensinos.
Em condições dignas de nota, surgiu a Escritura Santa!
Anteriormente Deus se revelara a pessoas individuais. A Adão e Eva. A Noé. A Abraão. A Jacó. Falava-lhes! Interferiu em acontecimentos! Mas, quando se revelou ao Seu Povo já separado dos egípcios, à coletividade, mandou escrever.
A marcha triunfante e cheia de percalços continuou.
Acampou-se o povo ao sopé do Monte de Sinai em circunstanciais solidíssimas. «Todo o Monte do Sinal fumegava, porque o Senhor descera sobre ele em fogo; a sua fumaça subiu como a fumaça de uma fornalha, e todo o monte tremia grandemente» (Ëx. 19:18). E «Deus falou… » Ëx. 20:1). Proferiu o Seu Decálogo. Apresentou as Suas Leis acerca dos servos, dos homicidas, da propriedade, da imoralidade, da idolatria, dos que amaldiçoam os pais ou ferem qualquer pessoa, do testemunho falso e das injustiças, do descanso e das três festas. Não se limitou Moisés relatá-las ao seu povo (Ex. 24:3), mas, ‘escreveu todas as palavras do Senhor’ (Ex. 24:4).
‘… Erigiu um altar ao pé do monte (Êx. 24:4)… e tornou o livro da aliança, e o ~eu ao povo, e eles disseram: tudo o que falou o Senhor, faremos, e obedeceremos’ (Êx. 24:7).
Note-se: Moisés ouviu. Em seguida relatou ao povo. E depois ESCREVEU. E, então, leu ao povo o que havia escrito no livro da aliança.
Por que? É porque o Senhor não queria TRAIÇÃO ORAL alguma! A Tradição é traição contra a fidelidade!
ACABEMOS COM OUTRO ARGUMENTO FALSO!
Este segundo arrazoado na pretendida defesa da Tradição católica é uma repetição do anterior tendo, porém, como cenário outras circunstâncias episódicas.
Tão raquítica é a sua argumentação que a teologia católica muda apenas o cenário e a roupagem, enquanto o esqueleto do sofisma continua o mesmo.
A referida teologia, contudo, é traída no seu próprio desespero à falta de argumentos.
Alega que Cristo nunca mandou escrever seus ensinos e mandamentos e nada deixou escrito. Aos Apóstolos apenas determinou pregassem pelo mundo como testemunhas dele e da doutrina por eles aceita e proclamada.
Em endosso deste arrazoado e no objetivo de confundir os menos avisados, invoca as seguintes pericopes:
«… e, a medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos céus» (Mt. 10:7).
PREGAI! Não mandou escrever!!!.
«Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; ensinandoos a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século» (Mt. 28:18-20).
ENSINAI! Não mandou escrever!!!
«E disse-lhes: Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura» (Mc. 16:15).
PREGAI! Não mandou escrever!!!
Sinto calafrios de compaixão por ver esse pobre argumento tão tísico.
Coitados dos católicos! Com seus teólogos assim ignorantes e de consciência encroada!
Jesus nunca mandou escrever?
Em Apocalipse encontramos dez oportunidades em que o Senhor manda escrever: — 1:11,19;2:1,8,12,18;3:1,7,14 ;21:5.
ESCREVE! Ë assim com o verbo no modo imperativo.
Existem excelentes oculistas e óticas especializadas onde os reverendos teólogos podem resolver o seu problema de miopia. A não ser que seu germe seja má vontade. Ai a cegueira consciente é incurável.
Prossegue, todavia ,o desenvolvimento da argumentação esdrúxula!
Os próprios Apóstolos ex professo nunca escreveram como se estivessem desincumbindo uma obrigação própria e especial, embora houvessem executado a contento a sua missão. Alguns, apenas em ocasiões esporádicas ou oportunidades ocasionais consignaram alguma coisa por escrito, mas sem a intenção de transmitir por escrito toda a Revelação e sim no propósito apenas de inculcar ou explicar alguma Verdade, ou forçados pelos pedidos dos fiéis ou dos bispos — «sed vel ad veritatem aliquam magis inculcandam aut explicandam, vel precibus fídelium aut episcoporum compulsi» (J.M. Hervé De Vera Religione De Ecclesia Christi — De Fontibus Revelationis
1929 — Paris — pág. 531).
É mesmo de se tirar o chapéu!
Precisa-se de muita coragem para se embarcar nessa canoa doutrinária de casco tão podre! Tamanha coragem como a disposição de se agarrar um leão à unha. Leão vivo!
Engolfados nesse trernendal dogmático não se apercebem os teólogos católicos que o seu arrazoado em defesa da Tradição labora contra ela? Pois que, se precisaram os Apóstolos escrever para inculcar ou explicar a doutrina cristã esta desmerecida a Tradição Oral.
E de fato, João da ênfase ao seu objetivo escrevendo: «… para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu Nome» (João 20:31).
Paulo, ao escrever aos coríntios, destaca: «… as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor» (1 Cor. 14:37). E aos filípenses: «Não me aborreço de escrever-vos as mesmas coisas, e é segurança para vós» (Fil. 3:1).
Paulo não se aborrece de escrever as mesmas coisas… Por que? Para SEGURANÇA dos fiéis!
Não se fiava da Tradição nem a curto prazo e nem a curta distância.
Ele havia pregado aos Filipenses e por medida de segurança doutrinária, escreveu-lhes.
Para não perder a desenvoltura no meio de tanta coincidência, o teólogo católico, com ares de muito entendido, invoca o verso 25 do capitulo 21 do Evangelho segundo João: «Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio eu que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos>>.
Até em cartas pastorais os «amantíssimos ordinários>> invocam este versículo.
Quando Deus me despertou para o exame consciencioso de sua Palavra, observei nesse passo escriturístico essa informação joanina.
O Autor sacro, constatei logo, se refere a coisas que Jesus fez, a fatos, a prodígios e não a doutrinas.
Fiquei, porém, mais desapontado ainda quando, confrontando, verifiquei o verso 31 do capitulo 20 do mesmo Livro Sagrado, que é o bastante, outrossim, para se acabar com a alegria dos teólogos católicos, acrobatas do sofisma ‘Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu Nome’.
Insiste maldosamente o desesperado teólogo. Reconhece de sobejo que, destruída a Tradição Oral, como fonte de Revelação, adeus fantasmagoria católica. E traz à baila os três primeiros versículos do capítulo 1 de Lucas: «Visto que muitos houve que empreenderam urna narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o principio foram deles testemunhas oculares, e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em urdem».
Pronto! Lucas antes de escrever obteve informações minuciosas de tudo junto das testemunhas presenciais dos fatos sobre os quais se dispõe escrever.
Pronto! Lucas foi, como Moisés ao escrever Gênesis, abeberar-se na Tradição!
Pronto! O Evangelho segundo Lucas é simplesmente produto da Tradição, a mais antiga, a mais completa Fonte de Revelação. A própria Fonte da Bíblia!
Declaramos crer inteiramente que Lucas ao escrever os seus dois livros,o Evangelho e os Atos dos Apóstolos, estava inspirado pelo Espírito Santo de Deus. E nestas condições é que ele colheu e selecionou a verdade no meio de tantos fatos e comentários divulgados oralmente e por escrito em inúmeros apócrifos. Lucas, divinamente inspirado, foi o garimpeiro que separou o ouro puríssimo!
Pululavam apócrifos! Lucas resolveu descrever ao excelente Teófilo os fatos conhecidos por ouvir da tradição oral para que ele tivesse a certeza das coisas sobre as quais já estava informado. Deseja Lucas que Teófilo e todos os demais se livrassem do risco de serem ludibriados pela Tradição Oral.
‘Quem conta um conto aumenta um ponto’, diz o adágio popular. Se não fossem as Escrituras não teríamos mais hoje a Revelação Divina!
Porque o catolicismo fundamenta suas doutrinas na Tradição é que evolui a sua teologia, surgem novos dogmas e sempre muda. O católico de vinte anos passados desconhece o católico atual. Mesmo o de dois anos atrás!
No seu arrazoado o teólogo da seita papal se lembra somente dos três primeiros versículos do capitulo 1o de Lucas. Esquece-se do quarto porque, concluindo o pensamento exarado nos versos anteriores, Lucas reconhece ser desmoralizada e inconsistente a Tradição como Fonte de Revelação. Ele escreveu para se ter certeza!
«PARA QUE TENHAS PLENA CERTEZA DAS VERDADES EM QUE FOSTE INSTRUÍDO».
Teófilo estava já informado de tudo por ouvir dizer. .A Tradição Oral, todavia, não lhe dava certeza alguma. .E Lucas, divinamente inspirado, resolveu escrever para lhe dar essa certeza.
Se a Tradição Oral dispõe do valor que lhe atribui o catolicismo, por que escrever?
Lucas escreveu os seus livros na língua grega. No original desta pericopes o vocábulo empregado é Asphaleia que quer dizer certeza, segurança, firmeza, solidez.
‘Ut cognoscas ea quae de Christo edoctus es, esse certissima, firmissíma et solidissima’, comenta Cornélio a Lápide em seu Comentário das Sagradas Escrituras. Teófilo, o destinatário do livro, já sabia por via oral e Lucas lhe escreveu para que o seu conhecimento fosse certíssimo, firmíssimo, solidíssimo. Não confiava na Tradição. Logicamente, a Tradição não pode ser fonte de Revelação!
Para um exame do real significado do vocábulo asphaleia é interessante notar-se a sua posição significativa em outros textos. Usa-o Lucas outra vez em Atos 5:23, em que, depois de relatar a prisão dos Apóstolos decretada pelo sumo sacerdote e a libertação miraculosa dás mesmos, transcreve-&– explicação dos servidores:
«Achamos o cárcere fechado com toda a segurança (asphaleia). Usa-o Paulo em Fil. 3:1: … e é segurança (asphaleia) para vós outros…». Não bastava falar. Escrevia por medida de segurança.
Na forma asphales, emprega-o Lucas em Atos 21:34;22:30;25:26 e se encontra em Hb. 6:19.
Na modalidade de verbo, é aplicado por Mt. quando se refere à segurança da guarda do sepulcro de Jesus. «Ordena, pois, que o sepulcro seja guardado com segurança (asphalistenai.) … Disse-lhes Pilatos: ai tendes uma escolta; ide e guardai como bem vos parecer (Asphalisaste).
O próprio Lucas em Atos 16:24, contando a prisão de Paulo e Suas em Filipos, ainda outra vez, aplica-o: «O qual (carcereiro), tendo recebido tal ordem, os lançou no cárcere interior, e lhes segurou (esphalisato) os pés no tronco.
Na forma de advérbio, no mesmo relato, Lucas, com ênfase informa: «e, depois de lhes (Paulo e Suas) darem muitos açoites, os lançaram no cárcere, ordenando ao carcereiro que os guardasse com toda a segurança
— seguramente (asphalós). Ainda Lucas, ao transcrever o sermão de Pedro no dia de Pentecostes, aplica-o: «Esteja pois absolutamente certa — segura — (asplialós) toda a casa de Israel de que a este Jesus que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo» (At. 2:36).
O advérbio Asphalós é empregado por Mc. 14:14 ao anotar a recomendação do Iscariotes: «Aquele a quem eu beijar, é esse; prendei-o, e levai-o com segurança (seguramente).
De todas estas observações é evidente, é lógico, é patente ressaltar, em conseqüência, que Lucas escreveu o seu Evangelho para firmar seguramente a Revelação de Jesus Cristo, demonstrando, outrossim, ser muito deficiente e falho o conhecimento através do ouvir dizer.
De quantos 1ivros, se compõe o Novo Testamento?
Vinte e sete!
E destes, com certeza, treze foram escritos pelo Apóstolo Paulo. E cinco pelo Apóstolo João.
Por João, o Apóstolo Amado de Jesus, chamado a testificar dËle porquanto com Ele estivera desde o princípio (Jo. 15:27), que, no final do Quarto Evangelho disse, referindo-se aos sinais de Jesus: ‘Estes, porém foram registrados para que creais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu Nome’.
(Jo. 20:31).
Pelo Apóstolo João que, na sua Primeira Epístola destinada aos já conhecedores do Evangelho de sua lavra, dirigida às mesmas igrejas, porquanto a simples leitura de ambos os documentos demonstra ser essa Primeira Epistola um suplemento daquele, declara: «O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos próprios olhos, o que contemplamos e as nossas mãos apalparam, com respeito ao Verbo da Vida.., o que temos visto e ouvido anunciamos também a vós outros, para que vós igualmente mantenhais comunhão conosco. Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com o Seu Filho Jesus Cristo. ESTAS COISAS, POIS, VOS ESCREVEMOS PARA QUE A NOSSA ALEGRIA SEJA COMPLETA» (1 Jo. 1:1,3,4). João, testemunha ocular! Observe-se a sua insistência em destacar esta particularidade notável: o que ouviu, o que viu com os seus olhos, o que contemplou e as suas mãos tocaram… Todo êste martelar contra qualquer pretensa Tradição apenas no primeiro verso do capítulo primeiro de sua Primeira Carta. E a seguir, após um parêntesis no verso 2, torna a insistir: «o que temos visto e ouvido… ‘ Tudo o que ele escreveu foi presenciado e ouvido por ele! Não foi colher dados e informações com ninguém!
Dos vinte e sete livros do Novo Testamento cinco procedem da pena divinamente inspirada do Apóstolo João.
Do Apóstolo João que leva a morder o pó da inutilidade o arrazoado balofo do catolicismo em prol de uma Tradição Oral como regra de fé mais importante do que a Bíblia por ser-lhe anterior e sua própria fonte.
Do Apóstolo João que, ao encerrar o seu Livro Apocalíptico, escangalha com a presunção católica porque estampa, por escrito, esta advertência de Jesus Cristo:
“Eu testifico a todo aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro: Se alguém lhes acrescentar alguma coisa, Deus lhe acrescentará as pragas que estão escritas neste livro; e se alguém tirar qualquer coisa das palavras do livro desta profecia, Deus lhe tirará a sua parte da árvore da vida, e da cidade santa, que estão descritas neste livro”. (Apoc. 22:18-19). ENFIM, O ÚLTIMO SOFISMA…
Se os dois argumentos expendidos pela dogmática católica em abono de sua Tradição são caquéticos, o terceiro e último é o acervo de todas as nuances da malicia. Ë um sofisma sintomático da mais deslavada irresponsabilidade.
Firmada no carunchado segundo argumento alega que, por não haver Cristo e nem os Seus discípulos escrito ou mandado escrever (?!) isso mesmo demonstra ~ existência de muitas doutrinas transmitidas apenas oral-mente, as quais devem ser aceitas como reveladas.
Ora! Vejam só! Nem de leve o catolicismo irá encontrar nas palavras de Jesus alguma coisa que lhe possa endossar a presunção. Aliás, bem ao contrário, porquanto Jesus foi severo no combate à Tradição. ….. invalidastes a Palavra de Deus, por causa da vossa Tradição» (Mt. 15:6), recriminava Ele aos fariseus. E nessa única vez que o Senhor fala sobre a Tradição, vergastando-a lembra: “E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens” (Mt. 15:9).
Desesperada por não encontrar nada nos Evangelhos que lhe pudesse, ao menos de longe, fornecer arremedo de argumento, no intuito de corroborar o seu raciocínio, a dogmática católica apresenta esta passagem bíblica extraída de Paulo: Assim, pois, Irmãos, permanecei firmes e guardai as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa (2 Tes. 2:15). Os Apóstolos, conclui, não nos transmitiram tudo por escrito; uma grande parte do seu ensino foi oral que nos chegou pela Tradição através dos séculos.
Ao objetivo católico nesta Escritura saltam à vista os embargos.
O significado do vocábulo «tradições» nesse texto não é sinônimo da Tradição no conceito católico. Lá no original grego, o termo é paradoseis que tem o significado de doutrina ou ensinamentos para o caso. Paradoseis é o conjunto das doutrinas ou o depósito exposto por Paulo aos fiéis. Este depósito que ele não recebeu de nenhum dos Doze e de ninguém, mas diretamente de Jesus Cristo (Gal. 1:9,11 e 12).
Paulo, portanto, depois de prevenir os tessalonicenses contra os deturpadores do Evangelho, inculca-lhes a necessidade de se manterem firmes nas doutrinas por ele ensinadas através também das suas pregações.
Ainda mais. O próprio texto ressalta a sintonia entre a pregação e a escrita das doutrinas ensinadas pelo mesmo Apóstolo. De maneira alguma ele sugere apoio a ensinamentos alheios ou diversos das Escrituras.
E de se levar em conta, outrossim, que esta Segunda Carta aos tessalonicenses é o segundo documento de Paulo, escrito logo após à Primeira Carta aos mesmos destinatários, datada do ano 50 ou 51. Ë evidente, pois, que, no afã de preveni-los da «operação do erro>> (2 Tes. 2:11), o Apóstolo se reporte às doutrinas que oralmente ele havia ensinado quando de sua atribulada estada em Tassalónica porque «os judeus desobedientes, movidos de inveja, tomaram consigo alguns homens perversos, dentre os vadios e, ajuntando o povo, alvoroçaram a cidade… » (Atos 17:5).
Seu curto ministério nessa localidade, porém, permitiu-lhe disputar numa sinagoga dos judeus sobre as Escrituras, pelo que alguns deles creram e se organizaram em igreja (Atos 17:1-4; e 2 Tes. 1:1).
Ao se referir Paulo aos seus ensinamentos por palavra não quer isto dizer que se constituíam eles em ensinamentos diferentes dos escritos em suas cartas. Tanto assim que, desejando prevenir os crentes contra as investidas de Satanás, adverte energicamente: «caso alguém não preste obediência à nossa palavra dada por esta epístola, notai-o; nem vos associeis com ele, para que fique envergonhado» (2 Tes. 3:14)
Dos seus treze documentos, as duas pequenas Cartas à Igreja de Tessalônica são os dois primeiros. Evidentemente que, ao se referir às doutrinas que por palavra havia ensinado lá, não demonstra ser a Tradição Oral Fonte de Revelação como querem os teólogos católicos.
Acresce outra observação de máximo destaque é que Paulo, como Apóstolo, era órgão oficial, divinamente inspirado, da Revelação Bíblica que durou até a morte de João, o Apóstolo. Por conseguinte e não implicando isto que sua pregação oral era diversa de sua pregação nas epístolas, pelo fato de ser a pregação de Paulo instrumento da Revelação de Deus aos homens, não se há de concluir que outros gozem desta mesma missão e sua palavra também seja inspirada até quando expõem doutrinas contrárias às Escrituras.
O catolicismo aprecia sobremaneira retirar um versículo do seu contexto e encaixá-lo a muque no cenário das suas heresias. E, como sempre, desta vez também falhou o seu arrazoado.
Insiste, porém, a dogmática católica e, no apogeu de seus estertores, vai buscar outro texto escriturístico no anseio de coonestar a sua Tradição. E arroga, como defesa desta sua falida fonte de doutrinas, as recomendações de Paulo a Timóteo: .. . sei em quem tenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia. Mantém o padrão das sãs palavras que de mim ouviste com fé e com o amor que está em Cristo Jesus. Guarda o bom depósito, mediante o Espírito Santo que habita em nós» (2 Tim. 1:12-14).
Nesta pericope encontramos duas vezes mencionado o vocábulo depósito. A primeira no verso 12, onde significa a confiança do Apóstolo em Deus, que não falta em suas promessas. Todos os seus trabalhos, todos os seus sofrimentos culminados agora em sua prisão em Roma nas vésperas de sua morte, se constituíram num riquíssimo depósito entregue nas mãos do Senhor, como num maravilhoso relicário, donde esplenderiam todos os seus galardões, como de uma fonte inexaurível. A segunda no verso 14. Para qualquer leitor desprovido de preconceitos, esta passagem bíblica no panorama das relações de Paulo com Timóteo, salienta o cuidado especialíssimo do Apóstolo em preservar o depósito (parathéke) isento de macular-se com as fãbulas e doutrinas vãs. O Apóstolo teve de enfrentar aguerridas lutas contra os «falsos irmãos>> (Gál. 2:4), os judaizantes que perturbavam os crentes com palavras e transtornavam as suas almas (Atos 15:24) porque deturpavam a pureza do Evangelho imiscuindo-lhe doutrinas espúrias. Além, pois, de missionário entre os gentios, Paulo teve de sustentar essa batalha imensa para o que contou com a cooperação pronta e eficaz de Timóteo, do qual davam bom testemunho os irmãos (Atos 16:2).
O vocábulo grego parathéke empregado por Paulo é de alta significação por ser, no seu tempo, um termo técnico da linguagem jurídica entre gregos, romanos e judeus. Parathéke, depósito, indicava um tesouro valioso confiado pelo seu proprietário à guarda de um amigo de irrestrita confiança, que se obrigava a guardá-lo e a restitui-lo, não lhe sendo licito, ainda, uti1izar-se dele em proveito pessoal ou na conformidade do seu bel-prazer. Severas penas, outrossim, se impunham aos que violassem as normas da absoluta fidelidade exigidas nesse caso do parathéke ou depósito.
Pois bem! Paulo escrevendo ao seu caríssimo Timóteo exorta-o à fidelidade na guarda desse parathéke divino, que é a doutrina do Evangelho não permitindo, em hipótese alguma, fosse eivada de retoques, desvios ou fãbulas.
Certa ocasião, enquanto foi à Macedônia, Timóteo permaneceu em Éfeso para advertir alguns que não ensinem outra doutrina, nem se ocupem com fãbulas e genealogias sem fim, (1 Tim. 1:34).
Além de preservar o «bom depósito», o parathéke, nesta emergência, competia a Timóteo a habilidade de selecionar homens capazes e firmes na fé, aptos para ensinar.
“… aplica-te à leitura, à exortação, ao ensino». (1 Tim. 4:13).
(Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. (1 Tim.4:16).
Ó Timóteo, guarda o depósito que te foi confiado, tem horror aos clamores vãos e profanos e às obrigações da falsamente chamada ciência; a qual professando-a alguns, se desviaram da fé (1 Tim. 6:20 e 21).
…Guarda o bom depósito, mediante o Espírito Santo que habita em nós (2 Tim. 1:14).
Lembra a Timóteo em sua Primeira Carta de que, nos últimos tempos, alguns apostatarão da fé, por obedecerem a espíritos enganadores e a ensinos de demônios (1 Tim. 4:1); suplica-lhe que rejeite «as fábulas profanas e de velhinhas caducas» (1 Tim. 4:7): assemelha a Janes e Jambres que resistiram a Moisés os que resistem à verdade, sendo (homens de todo corrompidos na mente, réprobos quanto a fé (2 Tim. 3:8); recomenda-lhe que persistisse em ler (1 Tim. 4:13); e agora, nas vésperas de sua morte em Roma, donde remetera esta Carta a Timóteo, concita-o: «Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o aprendeste. E que desde a infância sabes as Sagradas Letras que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra>> (2 Tini. 3:14-16).
Todas estas recomendações de Paulo visavam exatamente preservar a pureza do Evangelho, a genuinidade da doutrina, a fidelidade na guarda do «bom depósito», parathéke, contra a intromissão de ensinamentos espúrios por parte dos judaizantes insubordinados e impostores, bem como de outros inovadores e corruptores.
Os textos que a dogmática católica arrola em defesa de sua Tradição militam desfavoráveis à sua pretensão de corromper a limpidez do ‘bom depósito’, parathéke. Incorre ela, outrossim, em anátema, consoante advertência do mesmo Apóstolo aos falsos irmãos, quando escreveu aos gálatas: ‘… se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema’ (Gál. 1:9).
Nem em nome de uma outra pretensa e utópica fonte de revelação extrabíblica, pode-se acrescentar ou retirar nada às Sagradas Escrituras a menos que se queira incorrer no desagrado do Senhor como acontece à dogmática católica, pervertedora da Revelação Divina.
É de se pasmar que quase toda a teologia clerical esteja lastreada sobre essa base de areia movediça. É um castelo de cartas que, com um sopro, se derruba, mas, vem, através dos séculos, se constituindo na arma mais eficaz do inferno para desviar as almas de Jesus Cristo, O nosso Único e Todo-Suficiente Salvador.