As Vacinas: ‘Um Crime Contra a Humanidade’

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Clayton J. Woodworth (1870-1951)

Uma das maiores irritações de estimação de C. J. Woodworth revelava-se na sua tirada contínua contra as vacinas. Ao longo dos séculos grandes pestes e doenças causaram centenas de milhões de vítimas, nalguns casos até devastaram civilizações. Agora, a humanidade estava à beira de uma nova era, em que pestes tão antigas como a humanidade estavam prestes a ser extintas. O meio de fazer isto eram programas de vacinação obrigatórios. Especialmente a varíola, uma das doenças mais mortíferas na história, estava destinada a ser exterminada, e graças ao programa de vacinação isto foi conseguido.

Woodworth não considerava que este programa fosse um benefício para a humanidade:

“Pessoas ponderadas prefeririam ter varíola em vez de serem vacinadas, porque as vacinas propagam as sementes da sífilis, cancros, eczema, erisipelas, escrófula, tuberculose, até a lepra e muitas outras doenças nojentas. Portanto, a prática da vacinação é um crime, um ultraje, e um engano.” (Golden Age [A Idade de Ouro], 5 de Janeiro de 1929, p. 502)

Sim, uma vacina era “um crime” e era por vezes comparada a uma violação (como as Testemunhas de Jeová actualmente dizem acerca das transfusões de sangue). Mais ainda, como quase tudo o resto, isto foi usado como um “sinal dos últimos dias”:

“As vacinas nunca preveniram nada e nunca o farão, e são a prática mais bárbara…. Nós estamos nos últimos dias, e o diabo está a perder lentamente a sua influência, fazendo entretanto um esforço enérgico para provocar todo o dano que pode, e tais males podem ser-lhe atribuídos…. Usem os vossos direitos como cidadãos Americanos para abolir para sempre a prática diabólica das vacinações.” (Golden Age [A Idade de Ouro], 12 de Outubro de 1921, p. 17)

Na visão do mundo das Testemunhas de Jeová, naquele tempo e hoje, as três maiores forças no mundo são a religião falsa, governos que são controlados por Satanás, e o opressivo Alto Comércio. Era o último o responsável pela campanha de desinformação de que as vacinas beneficiavam:

“O público não está em geral consciente de como a produção de soros, anti-toxinas e vacinas é uma grande indústria, ou de como o Alto Comércio controla toda esta indústria…. os conselhos de saúde esforçam-se para começar uma epidemia de varíola, difteria, ou [febre] tifóide para que possam ceifar uma colheita dourada ao inocularem uma comunidade que não pensa, com o exacto propósito de dispor desta porcaria manufacturada.” (The Golden Age [A Idade do Ouro], 3 de Janeiro de 1923, p. 214)

Estas teorias conspirativas fazem-nos lembrar artigos mais recentes na mesma revista, agora intitulada Awake! [Despertai!], que publicou uma série de artigos sob este tema de capa:

“Vender Sangue É um Grande Negócio”

O objectivo desta série de artigos era dar a impressão de que o sangue era “vermelho dourado” (compare com a expressão “colheita dourada” usada acima) e que a Cruz Vermelha Internacional é culpada de fraude em massa ao usar métodos não éticos para vender sangue com o objectivo do lucro (Awake! [Despertai!], 22 de Outubro de 1990).

Felizmente, os fanáticos religiosos que se opunham aos programas de vacinação falharam. Se não tivessem falhado, seriam culpados demilhões de mortes até hoje.

O argumento principal de Woodworth contra as vacinas parece ter sido que estas eram “porcaria animal” que iria “poluir” a humanidade. Segundo a The Golden Age [A Idade de Ouro] as vacinas não apenas causavam toda a espécie de doenças pavorosas, incluindo a Gripe Espanhola, mas até retardavam o [desenvolvimento] do intelecto do homem e causavam a falência moral:

“… muito do relaxamento dos nossos dias em aspectos sexuais tem a sua origem na violação complacente e contínua dos mandamentos divinos no sentido de manter o sangue humano separado do sangue animal. Com células de sangue estranho correndo nas suas veias um homem não é normal, não é ele mesmo, mas falta-lhe o porte e o equilíbrio que contribui para o auto-domínio.” (Golden Age [A Idade de Ouro], 4 de Fevereiro de 1931, p. 293)

Veremos exactamente o mesmo argumento a ser aplicado mais tarde aos transplantes e às transfusões de sangue!

Curiosamente, a Watch Tower Society deu na mesma revista alguns argumentos “Bíblicos” para recusar as vacinas:

“A vacinação é uma violação directa do pacto eterno que Deus fez com Noé depois do dilúvio.” (ibid.)

Esta foi a primeira vez na história do movimento que a proibição do sangue foi aplicada aos Cristãos. Como vimos, anteriormente só era aplicada aos Judeus. Considerando a evidência que acabámos de ver, podemo-nos interrogar porque é que alguém iria confiar no julgamento e exegese de Woodworth e dos seus companheiros!

As transfusões de sangue ainda não eram um problema nesta altura. Contudo, na Consolation (Consolação, o nome posterior da The Golden Age [A Idade de Ouro]) de 25 de Dezembro de 1940, p. 19, encontramos um item noticioso acerca de um médico com espírito de auto-sacrifício que deu o seu próprio sangue e assim salvou a vida de uma mulher. Apenas no fim da década de 1940 é que a Watch Tower Society condena explicitamente as transfusões de sangue como “contrárias às Escrituras,” empregando exactamente os mesmos argumentos que tinham usado anteriormente para proibir as vacinas.

Ao mesmo tempo, a Watch Tower Society já não podia defender a ideia de que as vacinas não serviam para nada. Na The Watchtower [A Sentinela], de 15 de Dezembro de 1952, p. 764, a mudança dramática é escondida na secção Perguntas dos Leitores:

São as vacinas uma violação da lei de Deus que proíbe introduzir sangue no sistema? — G.C., Carolina do Norte.

O motivo do rápido volte face é imediatamente óbvio na resposta:

“O assunto da vacinação deve ser decidido pelo próprio indivíduo…. E a nossa Sociedade não tem recursos para ser envolvida legalmente no caso ou para tomar a responsabilidade pelo modo como o caso acaba.” [bold acrescentado]

Era perfeitamente óbvio para a Watch Tower Society que uma proibição sobre as vacinas podia facilmente custar muitas vidas, e não há dúvida que custou mesmo vidas. Contudo, a ameaça de custos financeiros para a Watch Tower Society foi o factor que trouxe rapidamente “nova luz” sobre a questão!

Todos os argumentos “Bíblicos” anteriores contra as vacinas foram subitamente considerados irrelevantes (ou, se preferir, a “Sociedade não tem recursos financeiros” para os continuar a defender). Woodworth deve ter dado voltas no seu caixão (ele tinha falecido exactamente um ano antes):

“Depois de considerar o assunto, não nos parece estar em violação do pacto eterno feito com Noé, conforme registado em Génesis 9:4, nem contrário ao mandamento de Deus em Levítico 17:10-14. Certamente não se pode argumentar à base da razão ou das Escrituras e provar que, por ser vacinada, a pessoa inoculada está a comer ou a beber sangue e a consumi-lo como comida ou a receber uma transfusão de sangue. A vacinação não tem qualquer relação nem semelhança com o casamento entre angélicos “filhos de Deus” e as filhas dos homens, conforme descritos em Génesis 6:1-4. Nem pode ser colocada na mesma classe do que é descrito em Levítico 18:23, 24, que proíbe as relações sexuais entre humanos e animais. [As vacinas] não têm nada a ver com relações sexuais.”

Pois não. E nem sequer uma palavra de desculpa foi alguma vez dirigida àqueles que arriscaram e — em alguns casos — desperdiçaram as suas vidas acreditando em contos de fadas de homens que diziam falar em nome de Deus. Mas a Watch Tower Society nem sequer se retratou completamente dos seus “argumentos médicos” usados anteriormente. Limitou-se a dizer:

“A ciência médica, de facto, alega que as vacinas na realidade resultam num fortalecimento da vitalidade do sangue para resistir à doença contra a qual a pessoa é inoculada. Mas, é claro, essa é uma questão que cada indivíduo preocupado deve decidir por si mesmo da maneira que vir que é a vontade de Jeová para ele.”

Que palavra de conforto foi dada àqueles que tinham acreditado no disparate?

“Nós só fornecemos a informação acima a pedido, mas não podemos assumir nenhuma responsabilidade pela decisão e rumo que o leitor possa tomar.”

Extraído de http://corior.blogspot.com/ em 24/04/2014

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