A perda da salvação implica em salvação pelas obras?

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Nota: Não existe problema nos que argumentam que o “salvo perseverará até o fim e não se perderá” – essa é uma opinião teológica e válida pra muitos. Segue abaixo a cosmovisão wesleyana da salvação, por isso, a explicação se quem acredita assim está crendo em salvação pelas obras – o que não é factual e o texto abaixo mostra isso.

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Um argumento final dado pelos calvinistas na tentativa de refutar o ensinamento bíblico da perda da salvação é que, se a salvação é perdida quando alguém cai em pecados deliberados e recorrentes, ela estaria dependente das obras, e, consequentemente, a salvação seria por obras e não pela fé. Se é a fé que nos salva, então o pecado ou a falta de boas obras não podem ocasionar a perda da salvação, segundo o raciocínio deles.

O problema com essa lógica calvinista é que o que determina a perda da salvação não é a perda das obras, mas a perda da fé, que ocasiona a perda das obras. Da mesma forma que é a fé que nos salva, mas essa fé gera frutos (obras) de nossa parte (Tg.2:14-26), senão é uma fé morta (Tg.2:17), aquele que volta aos vícios e ao estado de pecados deliberados e recorrentes[1] faz isso em função da perda da fé, que, consequentemente, gerou a perda das obras.

O fator determinante e causativo em primeira instância para a perda da salvação não foi, portanto, a perda das obras, mas a perda da fé. A perda das obras é meramente uma consequencia natural da perda da fé. Se a fé genuína é a fé que gera obras e sem essa fé com obras o homem não é salvo (Tg.2:14-26), então a perda das obras significa que o homem perdeu a fé. Em termos práticos, a fé é a causa e as obras o efeito. Tendo a fé verdadeira (causa), temos as obras (efeito) que provém da fé. Mas, quando as obras (efeito) se vão, é porque a fé (causa) não está mais operando. É assim que entendemos o texto de Tiago, que disse:

“Assim também a fé, por si só, se não for acompanhada de obras, está morta. Mas alguém dirá: ‘Você tem fé; eu tenho obras’. Mostre-me a sua fé sem obras, e eu lhe mostrarei a minha fé pelas obras” (Tiago 2:17-18)

Tiago não estava pregando a salvação por obras, mas a salvação pela fé genuína que gera obras. Mas, se as obras são geradas pela fé, a consequencia lógica da perda do efeito é a inoperância da causa. Não é à toa que Jesus disse que o amor de muitos se esfriaria (Mt.24:12). É possível que uma fé “quente” se torne uma fé “fria”, até o ponto de desaparecer, como disse Paulo:

Mantendo a fé e a boa consciência que alguns rejeitaram e, por isso, naufragaram na fé” (1ª Timóteo 1:19)

Desta forma, vemos que é possível manter a fé ou não manter a fé, que significa rejeitar a fé. É por isso que temos que ter “cuidado para que nenhum de vocês tenha coração perverso e incrédulo, que se afaste do Deus vivo” (Hb.3:12). Se é possível esfriar e perder a fé, tornando-se “incrédulo”, a consequencia será a perda daquilo que era gerado pela fé, no que se refere à santidade e às obras. É por isso que a Bíblia diz que “sem santidade ninguém verá ao Senhor” (Hb.12:14).

Não é que a santidade salve, mas que ela mostra quando alguém tem a fé genuína que produz santidade e quando alguém tem uma fé morta que não produz nada, e que mantém o homem nos mesmos pecados de antes. Assim sendo, sem santidade ninguém será salvo, não porque a santidade salve, mas porque a falta dela mostra que alguém não tem fé. A fé, no sentido bíblico real, não é uma simples convicção intelectual de que Deus existe (como creem alguns), pois esse tipo de fé até os demônios tem:

“Você crê que existe um só Deus? Muito bem! Até mesmo os demônios crêem – e tremem! Insensato! Quer certificar-se de que a fé sem obras é inútil?” (Tiago 2:19-20)

A fé verdadeira não é um “sentimento” ou uma convicção intelectual, mas algo tão profundo que nos leva a amar a Deus de tal maneira e de tal modo que venhamos a buscá-lo e a corresponder neste amor. Da mesma forma que um marido que realmente ama sua esposa fará questão de demonstrar isso sendo fiel, mas aquele que trai está demonstrando que não ama da forma que amava antes, quem ama a Deus demonstra este amor com atitudes, e a falta dessas atitudes mostram que o primeiro amor se esfriou.

O mecanismo não funciona tendo as obras como o fundamento, mas com a fé sendo a base de tudo. É a fé que nos justifica (Ef.2:8), e a justiça do Evangelho é “do princípio ao fim pela fé” (Rm.1:17). Da mesma forma que é pela fé que somos salvos, é pela falta dela que perdemos a salvação. A consequencia desta perda da fé será o pecado deliberado e a falta das obras do primeiro amor. Elas são aquilo que mostra que o homem está em declínio espiritual, prestes a cair por completo (Ap.2:5).

[1] Há uma distinção que deve ser feita entre pecado deliberado e pecado não-deliberado. O pecado deliberado é o pecado consciente onde a pessoa planeja o pecado, depois peca e não se arrepende verdadeiramente do pecado cometido. Em outras palavras, ela peca porque quer pecar. Este é o tipo de pecado mencionado em Hebreus 10:26. O pecado não-deliberado é o pecado por fraqueza, quando um cristão, mesmo sem querer pecar, peca. Em um momento de fraqueza, a tentação vem e você, mesmo lutando contra aquele desejo, não consegue resistir e peca, se arrependendo verdadeiramente pelo pecado cometido. Este é o tipo de pecado mencionado em Romanos 7:15-23. O pecado que pode tirar a salvação é o pecado deliberado, e não o não-deliberado. Embora ambos sejam pecados e ambos tenham suas consequências no mundo espiritual, é o pecado consciente que coloca o homem em uma condição em que ele diz “não” a Deus e “sim” ao pecado.

Extraído do livro “Calvinismo X Arminianismo: quem está com a razão?”

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