Os que insistem na impossibilidade de poder resistir à vontade de Deus confundem o que Deus quer incondicionalmente com o que quer condicionalmente. Deus deseja a salvação de todas as pessoas condicionalmente — a condição é o arrependimento (2Pe 3.9). Por conseguinte, o coração não-arrependido pode resistir a vontade de Deus nesse sentido.
Há muitas passagens claras afirmando que se pode resistir ao Espirito Santo. Isso se aplica tanto a vontade de Deus (gr.: thelo, “desejar”) quanto ao seu plano (gr.: boulomai, “planejar”). Considere os seguintes textos da Escritura:
Lucas 7.30 declara: “Os fariseus e os peritos da lei rejeitaram o propósito de Deus para eles, não sendo batizados por Joao”.
Atos 7.51 afirma: “Povo rebelde, obstinado de coração e de ouvidos! Vocês são iguais aos seus antepassados: sempre resistem ao Espírito Santo”.
O próprio Calvino comentou esse texto, dizendo que Lucas esta falando da “inflexibilidade desesperada” deles quando e dito que “eles resistiram ao Espirito”. Mas como pode a obra de Deus neles ser irresistível, se na verdade resistiram?
Também Mateus 23.37 afirma enfaticamente que Jesus desejava trazer os judeus que o rejeitaram para o aprisco, mas eles não quiseram:
“Jerusalém, Jerusalém, você, que mata os profetas e apedreja os que lhe são enviados! Quantas vezes eu quis reunir os seus filhos, como a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das suas asas, mas vocês não quiseram‘.
A Graça de Deus não e irresistível para os que não a querem. Finalmente, ha muitos outros textos indicando que o ser humano pode rejeitar a vontade de Deus. Isso é verdadeiro tanto para incrédulos (v. Mt 12.50; 7.21; Jo 7.17; lJo 2.17) quanto para crentes (lTs 4.3). Naturalmente, em certo sentido, no fim à vontade de Deus prevalecerá, quando soberanamente desejar que os que rejeitaram sua oferta de salvação sejam perdidos. Nesse sentido, a vontade predominante de Deus esta sendo feita através da vontade deles de rejeitá-lo.
Mas com respeito a sua vontade de que todos sejam salvos (lTm 2.4; 2Pe 3.9), esta claro que se pode resistir a ela. Em resumo, e a vontade suprema e soberana de Deus que tenhamos livre-arbítrio para resistir a sua vontade de que todos sejam salvos.
C. S. Lewis faz alguns comentários esclarecedores nesse sentido. No livro Cartas do Diabo ao seu aprendiz, escreveu: “O Irresistível e o Indisputável são as duas armas que a própria natureza de Seu [de Deus] plano o proíbe de utilizar. Sobrepor-se meramente a uma vontade humana […] seria para Ele algo inútil. Ele não pode violentar, pode apenas persuadir”. No livro The Great Divorce, Lewis acrescenta: “Ha somente duas espécies de pessoas no final: aquelas que dizem a Deus: ‘Seja feita a tua vontade’, e aquelas a quem Deus diz, no final: ‘Seja feita a tua vontade’. Todas as que estão no inferno estão lá porque o escolheram. Sem essa auto-escolha, não poderia haver inferno algum”.
R. C. Sproul, calvinista ardente, recorda-nos de que “o erro terrível dos hipercalvinistas e que ele implica que Deus coage ao pecado”. O que ele não parece ver é que coagir para o bem é também um erro terrível. Uma liberdade forçada, relacionada ao bem ou ao mal, e contraria a natureza amorosa de Deus e a natureza dada por Deus ao ser humano, de ser livre. Liberdade forçada é contradição de termos. No limite da coação, os calvinistas discordam a respeito do grau de persuasão que Deus imprime a uma pessoa com relação ao grau de soberania que se esta disposto a atribuir a Deus. Os “calvinistas” extremados, do Agostinho mais velho até R. C. Sproul, não relutam em usar os termos “compelir” ou “coagir” relacionados com a Graça de Deus. Agostinho escreveu: “Deixe-os [os donatistas] reconhecer a Cristo em seu caso [o de Paulo] primeiramente compelindo e depois ensinando; primeiramente atacando, e depois consolando”. Ele também disse: “O próprio Senhor pede primeiramente que os convidados sejam convocados para participar da grande ceia; depois, que sejam compelidos” Sproul acrescenta: “Se Deus não tem o direito de coagir, então ele não tem o direito de governar a sua criação”. Eu e outros estamos dispostos a afirmar que Deus pode ser tão persuasivo quanto deseja ser, mas sem coação. Em termos teológicos, isso significa que Deus pode usar a “Graça irresistível” naquele que a deseja. Mas essa espécie de persuasão divina será igual a de alguém que corteja. Deus tentara conseguir, cortejara tão persuasivamente que os que desejam podem responder e ser conquistados por seu amor.
Extraído e adaptado do livro “Eleitos, mas Livres” – Norman Geisler – Ed. Vida