Em nenhum lugar a Bíblia ensina que a fé salvadora é um dom especial de Deus somente a uns poucos escolhidos. Ademais, em todo lugar a Bíblia supõe que todo o que deseja ser salvo pode exercer a fé salvadora. Cada passagem na qual a Escritura convoca os incrédulos a crer ou a se arrepender para ser salvos implica essa verdade.
Umas poucas passagens familiares serão suficientes para enfatizar esse ponto:
Lucas 13.3: “Se não se arrependerem, todos vocês também perecerão”.
João 3.16: “Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna”.
João 3.18: “Quem nele crê não e condenado, mas quem não crê já esta condenado, por não crer no nome do Filho Unigênito de Deus”.
João 6.29: “Jesus respondeu: ‘A obra de Deus e esta: crer naquele que ele enviou’”.13
João 11.40: “Disse-lhe Jesus: ‘Não lhe falei que, se você cresse, veria a gloria de Deus?”’.
João 12.36: “Creiam na luz enquanto vocês a tem, para que se tornem filhos da luz”.
Atos 16.31: “Eles responderam: ‘Creia no Senhor Jesus, e serão salvos, você e os de sua casa”’.
Atos 17.30: “No passado Deus não levou em conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam”.
Atos 20.21: “Testifiquei, tanto a judeus como a gregos, que eles precisam converter-se a Deus com arrependimento e fé em nosso Senhor Jesus”.
Hebreus 11.6: “Sem fé e impossível agradar a Deus, pois quem dele se aproxima precisa crer que ele existe e que recompensa àqueles que o buscam”.
Ha outras numerosas passagens da Escritura que afirmam a mesma verdade (v. Rm 3.22; 4.11,24; 10.9,14; lCo 1.21; G1 3.22; Ef 1.16; lTs 1.7; 4.14; lTm 1.16).
Finalmente, a Bíblia diz que a fé é nossa, e não de Deus. Ela fala de “sua fé” (Lc 7.50; Rm 4.5), da “fé que eles tinham” (Mt 9.2), mas nunca de uma “fé de Deus”.
EXERCER FÉ NÃO É OBRA MERITÓRIA
A disputa aqui é se a salvação e ou não baseada em obras. Todos os protestantes ortodoxos creem que a salvação não é baseada em obras, mas na Graça.
A questão é se um ato de “fé” da parte do ser humano constitui-se numa obra meritória. A resposta negativa a isso e apoiada tanto pela Escritura quanto pelo raciocínio correto.
Em primeiro lugar, a fé é claramente contrastada e oposta às obras na Bíblia. A Bíblia constantemente coloca a fé em oposição às obras, como é evidente nas passagens citadas acima e em muitas mais (Rm 3.26,27; G1 3.11). Romanos 4.4 afirma que “o salário do homem que trabalha não é considerado como favor, mas como divida”.
É fé ou obras, mas não ambas. Assim, a fé exercida para receber o dom da salvação não e uma obra. É a admissão de que não podemos trabalhar para tê-la, mas devemos aceitá-la por pura graça.
Além disso, o ato de receber um dom pela fé não é mais meritório do que e o de um mendigo ao receber uma ajuda. É uma lógica estranha a que assevera que o recebedor ganha crédito por receber uma dádiva, e não o doador! O ato de fé em receber o dom incondicional de Deus não granjeia nenhum mérito para o recebedor. Ao contrario, todo louvor e gloria vão para o Doador de “toda boa dadiva e todo dom perfeito” (Tg 1.17).
SERÁ QUE A FÉ PODE, APESAR DISSO, SER CONSIDERADA UMA OBRA?
J. I. Packer e O. R. Johnson acusam a teologia reformada de ter condenado o Arminianismo (e Weslyanismo), em principio, como um retorno a Roma “porque, no fundo, tornou a fé uma obra meritória…”. R. C. Sproul parece concordar, acrescentando: “O arminiano reconhece que a fé é algo que uma pessoa faz. E uma obra, embora não seja meritória. E uma boa obra? Certamente não é uma má obra. E bom para uma pessoa confiar em Cristo e em Cristo somente para sua salvação”. Assim, “o arminiano acha difícil escapar da conclusão de que, em ultima analise, a sua salvação repousa sobre alguns atos justos da vontade que ele realizou. Ele tem de fato merecido o mérito de Cristo, o que difere somente ligeiramente do pensamento de Roma”. Isso, contudo, envolve um equivoco (pra não dizer uma maldade) com a palavra “fazer”. Fé é algo que “fazemos” no sentido de que envolve um ato de nossa vontade sugerido pela graça de Deus. Contudo, a fé não é alguma coisa que “fazemos” no sentido de obra meritória necessária para Deus nos dar a salvação.
J. Gresham Machen, calvinista radical, nega enfaticamente que a fé seja uma espécie de boa obra: “A fé do ser humano, corretamente concebida, não pode nunca permanecer em oposição a plenitude com a qual a salvação depende de Deus: nunca pode significar que o ser humano faz uma parte enquanto Deus apenas faz o resto, pela simples razão de que a fé não consiste em fazer alguma coisa, mas em receber alguma coisa”.
RECEBER UMA DÁDIVA NÃO É MERITÓRIO
Armínio levanta estas questões pungentes: “Um homem rico concede a um pobre mendigo esmolas pelas quais ele pode ser capaz de manter a si próprio e sua família. Isso deixa de ser puro presente só porque o mendigo estende a mão para recebê-las? Pode ser dito com propriedade que ‘as esmolas dependem parcialmente da liberalidade do doador e parcialmente da liberdade do recebedor, embora este não as tivesse possuído a menos que as recebesse por haver estendido a mão?’”.
Ele continua: “Se essas asseverações não podem ser verdadeiramente feitas a respeito de um mendigo que recebe esmolas, muito menos podem ser feitas a respeito do presente da fé, cujo recebimento requer ainda mais atos da Graça divina!”.