Quando alguém tiver um filho contumaz e rebelde, que não obedecer à voz de seu pai e à voz de sua mãe, e, castigando-o eles, lhes não der ouvidos, Então seu pai e sua mãe pegarão nele, e o levarão aos anciãos da sua cidade, e à porta do seu lugar; E dirão aos anciãos da cidade: Este nosso filho é rebelde e contumaz, não dá ouvidos à nossa voz; é um comilão e um beberrão. Então todos os homens da sua cidade o apedrejarão, até que morra; e tirarás o mal do meio de ti, e todo o Israel ouvirá e temerá. Dt 21.18-21
É bem problemático quando tentamos olhar o passado com a cosmovisão do presente sobre a vida de pessoas do mundo bíblico. Fustel, em sua obra “Cidade Antiga”, explicita que é preciso de muito critério ao examinar o mundo das civilizações ancestrais. Costumes sociológicos estão sempre em mudanças. As mentalidades precisam ser atualizadas para não fazermos um juízo inadequado das decisões de um povo antigo.
O texto acima, diferente da visão de céticos maldosos, é visto por um estudioso do mundo antigo como uma lei muito sofisticada – uma lei que regulamenta problemas sociais e familiares. Aliás, toda a Torá judaica fez dos hebreus um povo singular entre as antigas nações. Imaginem, a três mil anos atrás, pelo menos, os hebreus era um povo todo alfabetizado, por causa da sua Lei. Isso não tem parâmetros ainda nos dias de hoje, pois ainda convivemos com nações com mais de 50% de analfabetismo.
Outra coisa, o texto não trata de uma criança, mas de um filho adulto. Conforme vemos no versículo 20, ele era devasso, e vivia bêbado. Se ele era devasso, então já conhecia a vida sexual e tinha erotismo e imoralidade à flor da pele, mas uma criança naquele tempo nem imaginaria o que era devassidão. Sem contar que um filho deste tipo, provavelmente, agredia os pais e parentes próximos com enorme agressividade. A lei procurava proteger os pais (a lei era uma vertente do 5º Mandamento: “Honra teu Pai e tua Mãe”) para que eles não fossem mortos pelo “filho contumaz”. O objetivo desta lei também era evitar e “eliminar o mal do meio do povo“, ou seja, para que outras pessoas não seguissem o mau exemplo do tal filho, conforme descrito no versículo 21.
“A execução de um filho adulto rebelde e incorrigível (que agredia com violência seus pais e parentes) é inconcebível na sociedade moderna, principalmente por faltar a essa sociedade dos padrões de uma comunidade teocrática (sociedade primitiva e governada por uma lei divina e rígida). A possibilidade aqui descrita dramaticamente a pesada responsabilidade que os pais israelitas assumiam. Eles obrigatoriamente precisavam certificar-se de que os seus descendentes cumpririam os elevados padrões morais, sociais e religiosos exigidos ao povo de Deus (Então, quando não davam conta, precisavam pedir socorro aos anciãos do povo). Os pais deviam ser os agentes do Senhor, em termos de autoridade e disciplina, no nível da família, assegurando que nenhuma influência anômala ou destrutiva entrasse na comunidade da fé, por causa deles”. (Bíblia Defesa da Fé, CPAD, Pg 340, parênteses meu)
É importante observar, que o filho levado a julgamento, teria ampla defesa diante dos anciãos da cidade. Se os anciãos considerasse aquele homem culpado, a sentença seria a morte. Não era exigido dos pais participação no ato. Entretanto, se fosse considerado inocente, ele seria solto e reconduzido a sua família, possivelmente com algumas reprimendas.
A lei deu tão certo, que não vamos encontrar este tipo de execução nas páginas do Velho Testamento, ou seja, as prescrições foram bem obedecidas, sendo que nenhum parricídio ou matricídio foi cometido, principalmente quando o povo estava vivendo num contexto de obediência a Torá. Nunca um pai precisou apelar aos anciãos para resolver esse tipo de problema.
No Novo Testamento os pais são exortados a não provocarem a ira dos seus filhos (Ef 6.4). Por outro lado, entretanto, o livro de Provérbios afirma que “aquele que retém a vara odeia a seu filho” (Pv 13.24).
- A. Thompson conclui o assunto dizendo que: “Há, no pensamento bíblico, um delicado equilíbrio nos relacionamentos entre pais e filhos”.