A Alma morre ? (Mt 10.28 na visão de um adventista)

Mateus 10.28 na visão de um adventista

DEBATE

Paulo Sérgio de Araujo (evangélico) X Azenilto G. Brito (adventista)

Introdução

Este estudo foi elaborado com a intenção de examinar a interpretação do Prof. Azenilto G. Brito (adventista do sétimo dia) ao texto de Mateus 10:28. Para quem não sabe, esse texto de Mateus é usado pelos imortalistas (eu sou um deles) como sendo uma prova indiscutível e clara de que o ser humano possui uma alma imaterial-imortal, diferente do corpo, que sobrevive à morte. Porém, o Prof. Azenilto (assim como os demais não imortalistas) nega que esse versículo ensine isso, e chega até ao ponto de dizer que esse texto na realidade contradiz aquilo que os imortalistas acreditam! Em linhas gerais, seu entendimento sobre esse texto está em sintonia com o que a Igreja Adventista do Sétimo Dia e as Testemunhas de Jeová (doravante IASD e TJ, respectivamente) pensam e ensinam. Será que a interpretação do Azenilto (que de certa forma expressa o pensamento dos não imortalistas) a Mateus 10:28 tem sustentação bíblica?
Com o mesmo fervor que o Prof. Azenilto combate a imortalidade da alma, ele igualmente defende e promove as doutrinas da imortalidade condicional, do sono da alma e do aniquilamento dos ímpios. Essas são doutrinas peculiares da IASD e das TJ. Para espalhar essas doutrinas para o maior número possível de pessoas, ele não mede esforços, e até se orgulha de já ter tirado algumas pessoas do “erro”, pois anteriormente elas não criam nessas três doutrinas.

A imortalidade condicional ensina que a imortalidade (vida eterna e consciente) só será concedida àqueles que crerem em Cristo. Para os incrédulos, Deus os aniquilará. O aniquilacionismo é a doutrina que ensina que os maus serão extintos, ou seja, eles deixarão de existir conscientemente por toda a eternidade. Essa doutrina evidentemente nega que os ímpios serão punidos infindavelmente no inferno. Já a doutrina do sono da alma ensina que, por não haver uma alma imaterial-imortal que sobreviva à morte do corpo, aqueles que morrem (seja crentes ou não) caem num estado de completa e literal inconsciência (uma espécie de “sono”), saindo desse estado somente na ressurreição, quando então eles serão ou galardoados (no caso dos crentes) ou condenados (no caso dos ímpios). Em síntese, essas três doutrinas de certa forma se relacionam entre si, e todas elas se apóiam sobre uma mesma base: os seres humanos não possuem uma alma imaterial-imortal. Neste estudo não falarei especificamente sobre nenhuma dessas três doutrinas mencionadas, mas centralizarei as atenções somente na resposta à pergunta: Mateus 10:28 ensina que o homem possui uma alma imaterial-imortal que sobrevive à morte do corpo? Porém, a busca por uma resposta a essa pergunta de certa forma acabará tocando um pouco em cada uma dessas três doutrinas mencionadas, e se uma resposta positiva puder ser dada a essa pergunta, então a base sobre a qual essas três doutrinas se apóiam sucumbirá.

Gostaria de lembrar aos leitores desse estudo que todos os argumentos do Azenilto que serão mencionados aqui fizeram parte de uma discussão que eu tive com ele numa lista de discussões bíblicas, a Defesa da Fé. Naquele período eu postei aqui um longo estudo chamado Aniquilando o Aniquilacionismo (com um pouco mais de 50 páginas), em que contra-argumentei aquilo que Samuele Bacchiocchi (erudito bem conceituado da IASD) escreveu no seu livro Immortality or Resurrection? (Imortalidade ou Ressurreição?). Em linhas gerais, nesse livro (que me parece já foi até traduzido pelo Prof. Azenilto para o português, e talvez já esteja até disponível nalguma livraria brasileira) Bacchiocchi contrasta a sua visão holística da natureza e destino humanos com a imortalidade da alma, mostrando as suas respectivas implicações. Em resposta a esse livro, eu resolvi na oportunidade postar o estudo Aniquilando o Aniquilacionismo.

Bem, quando na ocasião eu expus meus argumentos (um estudo dividido em 8 partes, postadas em dias diferentes) contrários ao ponto de vista de Bacchiocchi, foi o Prof. Azenilto – uma espécie de fiel escudeiro, procurador e devoto de Bacchiocchi – quem respondeu ao meu estudo. O Azenilto dispensa apresentações, visto que a grande maioria já o conhece, já sabe o seu jeito de dialogar, de fazer apologia, a sua maneira de lidar com aqueles que discordam dele… Porém, mesmo vocês já o conhecendo, eu gostaria de falar mais um pouco sobre como ele se comportou quando eu postei o meu estudo. Antes de eu terminar de postar o Aniquilando o Aniquilacionismo, o Azenilto na oportunidade disse (em msg enviada em 09/09/2003, às 12:59hs) para um outro participante da Defesa da Fé, o José Fernando:

Aguarde que ainda nem comecei a analisar as interpretações desse cavalheiro. Vamos dar resposta cabal, porque a verdade não teme sofismas, sejam eles os mais elaborados possíveis… Mas vamos ficar NO CAMPO DAS IDÉIAS e garanto-lhes que seus argumentos (que ainda não examinei) serão todos refutados. Eu já havia rebatido as teses do Pr. Airton Costa aqui, lembram-se? Não haverá muitas novidades nas argumentações do irmão Paulo… Esperemos até o fim da série e vamos começar a responder e refutar. A verdade vence. (as partes sublinhadas são minhas; a parte em negrito é do Azenilto).

Noutra mensagem dele, do mesmo dia, só que das 17:06hs, respondendo ao José Fernando sobre essa sua predisposição para responder a tudo aquilo que ele ainda nem sabia que fora escrito no meu estudo, o Azenilto disse:

Eu já conheço praticamente TODOS os argumentos que se levantam ou se levantaram contra as posições holísticas, em defesa da teologia medieval do inferno e da crença de origem pagã da imortalidade da alma, por isso mesmo sem ter lido tudo, posso dizer-lhe sem medo de errar que darei resposta total e cabal, refutando esse erro que se origina na primeira mentira satânica pronunciada sobre a face da Terra, “É certo que não morrereis”. Gên. 3:2. (parte sublinhadas e em negrito são minhas)

É interessante que essas palavras do Azenilto refletem ridícula e escancaradamente a sua maneira típica e já conhecida de iniciar qualquer tipo de discussão: ele se comporta como sendo o detentor da verdade. Como que ele pôde dizer que daria uma “resposta total e cabal” aos meus argumentos, se quando ele disse isso ele mesmo declarou que ainda nem tinha começado a examinar o teor do que estava escrito no estudo? Como que ele pôde dizer “garanto-lhes que seus argumentos (que ainda não examinei) serão todos refutados”, se ele ainda nem sabia quais eram esses argumentos? Ele disse que “todos” os meus argumentos seriam “refutados”, e que também não haveria “muitas novidades” nas minhas argumentações, embora ele nem soubesse ainda o que eu tinha exposto no estudo. Pelo visto, pode-se concluir legitimamente que o Prof. Azenilto é onisciente, visto que ele é capaz de refutar os argumentos daqueles que discordam dele antes mesmo de ele saber o que eles escreveram, escreverão ou o que eles pensam ou pensarão sobre o assunto em questão. Quando inicia um debate com alguém que ele já sabe que pensa diferente dele, o Azenilto “oniscientemente” já tem uma resposta pronta, na ponta da língua, “total e cabal”, para tudo aquilo que o debatedor ainda nem falou. Embora em suas mensagens o Azenilto negue enfática e demagogicamente que seja o dono da verdade, a sua prática apologética nessa lista e noutros ambientes de discussão desmente isso, pois qualquer um sabe que quando ele está em meio a alguma discussão (sobretudo acerca da guarda do sábado ou da imortalidade da alma ou das leis alimentares), ele só aceita sair na poly position, à frente; e para manter-se assim até chegar ao primeiro lugar no podium, ele procura mostrar a suposta superioridade e insuperabilidade de seus argumentos em relação aos “pobres” argumentos dos outros debatedores. O Azenilto invariavelmente assume uma postura inflexível de mostrar para o outro debatedor que os argumentos dele (do Azenilto) estão num patamar muito, mas muito acima dos argumentos contrários que ainda serão apresentados. A impressão que ele parece querer passar é que seus argumentos são infinitamente superiores aos dos “pobres coitados” que cometeram grande “erro” ao discordarem dele nalgum assunto bíblico. É até irônico, para não dizer trágico, que o Azenilto diga “A verdade vence”, quando sabemos que ele já inicia qualquer discussão bíblica já com a imutável certeza de que, não importa o que os debatedores do lado de lá digam, a “verdade” que obrigatoriamente “vencerá” no final será a dele. Porém, isso não poderia ser diferente, visto que o Azenilto, antes mesmo de saber o que os outros escreveram ou pensam, já tem, “sem medo de errar”, uma “resposta total e cabal” para tudo! Isso me faz ironicamente lembrar o Salmo 139:4, em que o salmista diz: “Não havendo ainda palavra alguma na minha língua, eis que logo, ó SENHOR, tudo conheces”. Pelo visto, não só Deus conhece as palavras de Suas criaturas antes mesmo de elas serem pronunciadas…

Voltando ao assunto… No decorrer de minha crítica descobriremos que o Azenilto é capaz de fazer de tudo para negar que Mateus 10:28 ensina, como crêem os imortalistas, a existência de uma alma imaterial-imortal que sobrevive à morte do corpo. Quando eu digo “fazer de tudo”, eu estou dizendo “tudo” mesmo! Para mostrar de qualquer forma que Mateus 10:28 não sustenta a imortalidade da alma, os leitores ficarão sabendo dos métodos utilizados por este homem para interpretar o versículo da forma que ele quer. Porém, também mostrarei as debilidades e as conseqüências do uso de tais métodos de interpretação.

Há um ponto muito importante nesse estudo a ser mencionado: o Azenilto e os demais imortalistas negam enfática e axiomaticamente que a Bíblia empregue (uma única vez sequer) a palavra “alma” (e/ou “espírito”) com o sentido de “elemento imaterial-imortal que sobrevive conscientemente à morte do corpo”. Portanto, para respondermos se Mateus 10:28 ensina ou não sobre a existência de uma alma imaterial-imortal nos seres humanos, teremos que nos deter no sentido em que a palavra “alma” foi usada nesse versículo. Seria essa “alma” mencionada por Jesus aquilo que os imortalistas alegam ser?

Após ter me enviado uma lista contendo dez sentidos diferentes assumidos pelas palavras “alma” e “espírito” na Bíblia, vejam o que o Azenilto disse:
“IMPORTANTE: Apesar de todas estas diferentes formas em que alma e espírito são empregadas, em nenhuma ocasião é dito que signifiquem ‘entidade abstrata e imortal que sobrevive à matéria’. A palavra imortal só se encontra uma vez em toda a Bíblia e isto em referência à Divindade, em 1 Timóteo 1:17 e 6:16: ‘Ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos séculos . . . o único que possui imortalidade’.” (a parte sublinhada é minha)

Alguém talvez pergunte por que o Azenilto (e a IASD e as TJ) nega veementemente que a Bíblia empregue “alma” com o sentido de “entidade abstrata e imortal que sobrevive à matéria”. Creio que a resposta já foi dada um pouco mais acima, na página 1: se puder ser comprovado que as Escrituras empregam “alma” (e/ou “espírito”) com o sentido sustentado pelos imortalistas, então a base de sustentação da imortalidade condicional, do sono da alma e do aniquilacionismo seria destruída. Sendo assim, é vital para o Azenilto negar que “alma” aqui em Mateus 10:28 (e noutros textos) seja usada com o sentido advogado pelos imortalistas.

Vamos agora ler o texto de Mateus 10:28 para, em seguida, analisar as seis falhas que encontrei na interpretação do Prof. Azenilto:

“E não temais os que matam o corpo [gr. soma]e não podem matar a alma [gr. psyche]; temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo ”

Como disse anteriormente, a grande discussão aqui é acerca do sentido da palavra “alma”. Com qual sentido Jesus usou essa palavra aqui em Mateus 10:28 – com o defendido pelos imortalistas ou com o defendido pelo Azenilto? Em sua interpretação desse versículo, o Azenilto disse (msg de 13/09/2003, das 9:22hs) que a expressão “matar a alma” é o mesmo que “dobrar o espírito”. Ele prosseguiu dizendo que “‘dobrar o espírito’ de alguém… significa algo como influenciar tal pessoa em determinado rumo, superando sua firmeza de convicções e intenções”. Continuando, ele argumentou que “em Mateus 10:28 Cristo está expandindo o sentido da alma para denotar não somente a vida física, mas também a convicção íntima de posse da vida eterna da parte daqueles que estão dispostos a fazer qualquer sacrifício pela causa da verdade”. Finalizando, ele disse que se “este texto [Mt 10:28] for lido à luz do sentido ampliado dado por Cristo a alma, o significado da declaração será: ‘não temais aqueles que podem trazer vossa existência terrena (corpo) a um fim, mas não podem eliminar vossa vida eterna em Deus; mas temais o Deus que é capaz de destruir vosso ser integral eternamente’… a passagem de Mateus 10:28… apenas indica que pessoas ou forças malignas podem matar o corpo, a vida física, mas não podem destruir a alma, o caráter, convicções íntimas ou personalidade de um crente… ” (destaque em rosa é meu) Gostaria de abrir um parêntese nesse momento e dizer que todo esse trecho que coloquei em cor azul, que faz parte da resposta que o Azenilto me deu na ocasião, na realidade foi copiado por ele, letra por letra, do livro Immortality or Resurrection?, de Samuele Bacchiocchi. Sabemos ser normal fazer uso de uma idéia ou texto alheio para algum fim, mas desde que se mencione a fonte e coloque o texto entre aspas (caso a idéia esteja sendo citada textualmente). Porém, para variar o Azenilto não fez nada disso, e tratou logo de copiar o pensamento de seu mestre, talvez querendo receber em sua conta os dividendos que na realidade deveriam ser depositados na conta do Bacchiocchi… Há um dito popular que se encaixa perfeitamente nessa situação: “Fulano quer fazer cortesia com o chapéu dos outros”. Mas deixa isso pra lá, vamos continuar nossa análise acerca dos argumentos do Bacchioc… quer dizer, do Azenilto… Eis os seis pontos de minha crítica…


Seis Falhas na Interpretação de Mateus 10:28

1. O verbo “matar” não pode ser trocado por “dobrar”

Ao dizer que a expressão “matar a alma” é o mesmo que “dobrar o espírito”, o Azenilto sutilmente trocou o verbo “matar” por “dobrar”. Isso não poderia ser feito, pois toda a discussão gira em torno do sentido somente da palavra “alma”, e essa troca – por sinal bem conveniente – já altera o sentido do texto, adaptando-o àquilo que o Azenilto quer provar. O verbo “matar” não pode ser substituído por nenhuma outra palavra, sob pena de o sentido do versículo ser alterado. Para mostrar esse erro, darei um exemplo. Em Êxodo 1:5 está escrito: “Todas as almas, pois, que procederam dos lombos de Jacó, foram setenta almas”. Nesse versículo fica bem claro e fácil entendermos que “almas” tem o sentido de “pessoas”, pois ao lermos esse versículo, dentro desse contexto, automática e corretamente já interpretamos “almas” com o sentido de “pessoas”. Porém, notem que devemos substituir somente a palavra “almas”, pois fazer o contrário alteraria o sentido do texto. Para poder construir a expressão “dobrar o espírito”, o Azenilto teve que trocar o verbo “matar” por “dobrar” e, desta forma, tentou dar um sentido diferente à palavra “alma” (“espírito”) no texto. Porém, essa troca não pode ser feita.

Não podemos perder de vista que Jesus disse que os homens não poderiam matar alguma coisa. Se perguntarmos o que é essa coisa que os homens não podem matar, então a resposta óbvia é que eles não podem matar a “alma”. Porém, o que é essa “alma”? Aí é que está o centro de toda a nossa discussão. Sendo assim, a tarefa do Azenilto é mostrar qual é o sentido somente da palavra “alma” dentro da expressão “matar a alma”, mas sem trocar o verbo “matar”. Ele deve substituir só a palavra “alma” por um outro suposto sentido que ela tenha sido empregada no versículo, assim como fizemos em Êxodo 1:5.

Inevitavelmente surge a questão: Por que o Azenilto trocou o verbo “matar” por “dobrar” para, em seguida, poder construir a expressão “dobrar o espírito”? Resposta: ele fez isso porque senão teria grandes dificuldades para substituir somente a palavra “alma” (como fizemos no texto acima de Êx 1:5) por toda a expressão “dobrar o espírito” (ou ainda por “vida eterna em Deus”), sem que o versículo perdesse o seu sentido. Se ele não tivesse feito essa troca do verbo, então vejam como que o versículo ficaria:

“E não temais os que matam o corpo e não podem matar o dobrar o espírito [ou ‘espírito dobrado’]; temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno o dobrar o espírito e o corpo”.

Como podemos ver, essas substituições deixam o versículo totalmente sem sentido, e isso explica a razão de ele ter trocado “matar” por “dobrar”, pois isso aparentemente daria sentido ao versículo. Aliás, por que o Azenilto não foi coerente e também substituiu a expressão anterior, “matar o corpo”, por “dobrar o corpo”?

O que inviabiliza totalmente essa troca pretendida pelo Azenilto, e que se constitui num grande e insuperável obstáculo à sua interpretação (e também da IASD e das TJ), é que a palavra “alma” foi aqui usada por Jesus em seu sentido literal. Assim como Jesus falou a palavra “corpo” literalmente, da mesma forma Ele falou literalmente a palavra “alma”. E por isso mesmo não há como atribuir um sentido secundário para essas duas expressões sem prejudicar a compreensão do texto. Darei um exemplo para clarear mais o que estou dizendo… Qual o sentido da frase: “O ponto de ônibus fica em frente ao corpo de bombeiros”? Ora, certamente essa frase não indica que o ponto de ônibus fica em frente a um corpo literal (de carne e ossos) de um bombeiro morto ou caído no chão. É evidente que “corpo” aqui está sendo usado em um dos seus muitos sentidos secundários, significando “corporação”, “grupo”, “conjunto” de bombeiros. Se lermos “corpo” aqui nessa frase no seu sentido literal, então essa expressão fica sem sentido. Porém, qual é agora o sentido da frase: “O corpo do bombeiro está em frente ao ponto de ônibus”? Aqui facilmente entendemos que “corpo” foi usado no seu sentido literal, ou seja, esse é um “corpo” de carne e ossos. Se substituirmos “corpo” aqui pela palavra “corporação” (um sentido secundário), então a frase perderá o sentido. O que eu quero ilustrar com esses dois exemplos é o seguinte: Não é possível atribuir um sentido secundário, um segundo sentido, para uma palavra que foi usada originalmente em seu sentido literal, e vice-versa. Se isso for feito, então o texto ficará sem sentido. E infelizmente foi isso o que aconteceu quando o Prof. Azenilto tentou dar um sentido diferente para a expressão literal “matar a alma”.

Para finalizar esse ponto, eu deixo aqui uma implicação tirada dessa substituição que o Azenilto fez no texto: se for correta essa troca que ele fez aqui em Mateus do verbo “matar” por “dobrar”, para em seguida construir a expressão “dobrar o espírito”, então o Azenilto é potencialmente capaz de dar o sentido que ele quiser à palavra “alma”, bastando apenas que ele troque o verbo “matar” pelo verbo que sua mente criativa mais achar conveniente.


2. Jesus foi muito claro ao dizer “matar a alma” para Seus discípulos

A princípio poderíamos perguntar se os discípulos para os quais Jesus falou essas palavras precisaram fazer todo esse longo raciocínio que o Azenilto fez a fim de concluírem que “matar a alma” é o mesmo que “dobrar o espírito”. Aliás, não nos esqueçamos que primeiro o Azenilto disse (ver essa resposta acima, antes do ponto 1) que a expressão “matar a alma” significa “dobrar o espírito”; depois, em sua (ou melhor, do Bacchiocchi) paráfrase de Mateus 10:28, “dobrar o espírito” já significa “vida eterna em Deus”; por último, ele chegou a dizer que esse “matar a alma” “apenas indica que pessoas ou forças malignas podem matar o corpo, a vida física, mas não podem destruir a alma, o caráter, convicções íntimas ou personalidade de um crente.” Ou seja, para o Azenilto “matar a alma” pode ter os sentidos de “dobrar o espírito”, “vida eterna em Deus”, “caráter”, “convicções íntimas” e “personalidade de um crente”. Será que os discípulos precisaram fazer todo esse raciocínio feito pelo Azenilto? Pelo visto, parece que eles tiveram que fazer uma reflexão mais ou menos assim: “Bem, a expressão ‘matar a alma’ que o nosso Mestre acabou de nos falar talvez signifique, dentre os muitos sentidos que ‘alma’ pode assumir, nos mais diferentes contextos, ‘dobrar o espírito’, pois o verbo ‘matar’ deve ser trocado por ‘dobrar’, e o substantivo ‘alma’ deve ser trocado por ‘espírito’. Porém, o que ‘dobrar o espírito’ significa? Ah, talvez Jesus queira nos dizer que os homens podem, literalmente falando, matar o nosso corpo; porém, eles não podem, agora alegoricamente falando, matar a nossa alma, ou seja, a nossa ‘vida eterna em Deus’. É isso mesmo, ‘matar a alma’ é o mesmo que ‘dobrar o espírito’, e ‘dobrar o espírito’, por sua vez, é o mesmo que ‘vida eterna em Deus'”. Não creio que Jesus usou a palavra “alma” (dentro da expressão “matar a alma”) com um suposto sentido secundário tão oculto assim, a ponto de fazer Seus discípulos raciocinarem tanto como sugere a explicação do Azenilto. Não seria muito mais sensato acreditar que Jesus usou “alma” aqui (assim como “corpo”) no seu sentido literal, em vez de ter empregado essa palavra com todos esses segundos sentidos pretendidos pelo Azenilto?

Outras questões a serem levantadas… Será que a expressão “dobrar o espírito” era comum na linguagem daquela época, ou ela é uma expressão contemporânea? Será que a expressão “matar a alma” aparece noutro lugar da Bíblia com o sentido de “dobrar o espírito”, ou o Azenilto convenientemente a colocou somente aqui em Mateus 10:28? Se for argumentado que “dobrar o espírito” aparece noutras partes das Escrituras, e não apenas aqui em Mateus, então legitimamente podemos perguntar em qual lugar isso ocorre. Ademais, se a expressão “matar a alma” é o mesmo que “dobrar o espírito”, então é de se esperar (caso haja mais ocorrências da expressão na Bíblia) que haja outras passagens em que a expressão “matar [ou verbos semelhantes] a alma” apareça com o sentido proposto aqui em Mateus pelo Azenilto. Porém, alguém aqui conhece algum outro versículo da Bíblia (exceto Mt 10:28) em que a expressão “matar a alma” ocorre?

Ao tentar dar um sentido secundário para a expressão “matar a alma” (embora já vimos no ponto 1 que ele não poderia ter mexido no verbo “matar”), os leitores talvez já começaram a notar que o Azenilto está disposto a dizer que “alma” aqui em Mateus 10:28 é qualquer coisa, menos aquilo que os imortalistas dizem ser: uma alma imaterial-imortal. Porém, como veremos nos próximos pontos, ele precisará pagar um altíssimo preço para tentar driblar o sentido claro e literal de “alma” aqui em Mateus 10:28…


3. O método tipo “Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal” de se fazer exegese

Dentre as seis falhas que notei na interpretação do Azenilto, essa é seguramente uma das mais graves que encontrei. A primeira parte do versículo diz:

“E não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma”

Lendo essa primeira parte do texto, tanto eu como o Azenilto entendemos que Jesus falou a expressão “matar o corpo” de forma literal. Ou seja, esse “matar” é matar mesmo, assassinar, tirar a vida biológica; e esse “corpo” é um corpo mesmo, feito de carne e ossos. Ao lermos literalmente essa expressão, evidentemente nós não a espiritualizamos, não lhe aplicamos nenhuma alegoria, não lhe atribuímos nenhum outro sentido além do literal, e muito menos trocamos o verbo “matar” ou o substantivo “corpo” por nenhuma outra palavra. Eu e o Azenilto entendemos que esse “corpo” mencionado por Jesus aqui em Mateus é inegavelmente um “corpo” de verdade, literal. Nós também sabemos que “corpo” (gr. soma), dependendo do contexto, pode assumir outros sentidos secundários (p.e., “igreja”, “essência”, etc.) além do sentido primário, literal e primitivo que foi empregado aqui em Mateus. Porém, se por exemplo eu e o Azenilto entendermos “corpo” aqui com o sentido de “igreja” (que é um sentido secundário), então o versículo perderá totalmente o sentido, visto que “corpo” aqui foi usado por Jesus inequivocamente em sentido primário. Portanto, com toda a certeza os discípulos não precisaram fazer nenhuma reflexão profunda para compreender prontamente que o “corpo” mencionado aqui por Jesus era um corpo mesmo, de carne e ossos.

Bem, pelo menos eu (e os imortalistas), ao ler a expressão seguinte, “matar a alma”, mostro coerência exegética, pois eu também a leio literalmente, seguindo a mesma seqüência de raciocínio utilizada na expressão anterior (“matar o corpo”). Eu entendo que Jesus falou a expressão “matar a alma” de forma literal. Ou seja, esse “matar” é matar mesmo, e essa “alma” é, literalmente falando, uma alma mesmo. Certamente eu não espiritualizo essa expressão, não lhe aplico nenhuma alegoria, não lhe atribuo nenhum outro sentido além do literal e, assim como na expressão “matar o corpo”, eu também não troco o verbo “matar” ou o substantivo “alma” por nenhuma outra palavra. Eu sei muito bem que “alma” (gr. psyche), dependendo do contexto, pode assumir outros sentidos secundários (p.e., “vida”, “pessoa”, “sentimentos”, “sangue”, “coração”, etc.) além do sentido primário, literal e primitivo que foi empregado aqui em Mateus. Porém, se eu por exemplo entender “alma” aqui com o sentido de “sentimentos” ou “sangue” ou “coração” ou “pessoas” (ou, de acordo com o Azenilto, “dobrar o espírito”), então o versículo perderá totalmente o sentido, visto que “alma” aqui foi usada por Jesus inequivocamente em seu sentido literal, não admitindo, portanto, nenhum sentido secundário. Nessa expressão eu – sendo coerente com a interpretação dada à expressão anterior – evidentemente considero que Jesus empregou “alma” literalmente, e os Seus discípulos, portanto, não precisaram fazer nenhuma reflexão profunda para compreender prontamente que essa “alma” mencionada era uma alma mesmo, no seu sentido primário, e não com quaisquer sentidos secundários. Em vez de fazerem todo aquele longo raciocínio proposto pelo Azenilto e, no final, talvez descobrir que “matar a alma” é o mesmo que “dobrar o espírito” ou “vida eterna em Deus”, eles logo concluíram que essa “alma” mencionada aqui era literal, sem precisar espiritualizar, alegorizar ou trocar palavras como o Azenilto fez.

Porém, justamente aqui, na expressão “matar a alma” (que é ponto crítico, central, a parte mais importante na discussão do versículo), o Azenilto (e os demais não imortalistas) começou a espiritualizar, a alegorizar, a trocar palavras e a dar sentidos secundários a essa expressão. Na expressão “matar o corpo” ele certamente entende que esse “matar” e esse “corpo” são literais; porém, na expressão “matar a alma” ele rápida, esquisita e sorrateiramente começou a espiritualizar, a alegorizar, a substituir o verbo, a dar sentidos secundários para “alma”, e a dizer que na realidade “matar a alma” significa “dobrar o espírito” ou “vida eterna em Deus”. Por que esse “matar” aqui nessa expressão já não é mais um “matar” literal como o foi na expressão “matar o corpo”, mas passou agora a ser interpretado como sendo “dobrar”? Por que essa “alma” não é (assim como o “corpo”) entendida no seu sentido literal? Com exceção da expressão “matar a alma” (onde o sentido somente de “alma” é o centro da discussão), todo o restante do versículo o Azenilto (e a IASD e as TJ) interpreta literalmente. Por que é que justamente na expressão “matar a alma” o Azenilto faz isso? Por que o Azenilto (para ser coerente e imparcial em sua exegese desse texto) também não espiritualizou, alegorizou, deu segundos sentidos e trocou palavras na expressão “matar o corpo”? Afinal, além do sentido literal da palavra “corpo”, a Bíblia também emprega essa palavra com sentidos secundários noutros lugares (p.e., “igreja”, “essência”, etc.). Sendo assim, por que ele não faz o mesmo com essa expressão e diz: “dobrar a igreja” ou “dobrar a essência”? Será que não podemos dizer que a partir da expressão “matar a alma” o Azenilto começou a usar dois pesos e duas medidas em sua interpretação? Quando ele em sua exegese de Mateus 10:28 começa (justamente na expressão “matar a alma”) a espiritualizar, a alegorizar, a trocar o verbo e a dar sentidos secundários para uma expressão que foi usada originalmente em seu sentido literal e primário, nós não poderíamos legitimamente acusá-lo de ser parcial, seletivo, incoerente e aplicador de dois pesos e duas medidas? Num versículo tão curto ele rapidamente pulou da leitura literal para a leitura espiritualizada, alegórica, para a troca de palavras…

Esse tipo de mudança brusca e anormal na seqüência de raciocínio da leitura, justamente nessa parte do versículo de Mateus 10:28, é idêntico ao que as TJ fazem ao ler o texto trinitário de Mateus 28:19, que diz: “Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Quando as TJ lêem esse texto, elas automaticamente entendem que o “Pai” e o “Filho” são pessoas. Porém, quando elas chegam justamente no “Espírito Santo”, aí elas estranhamente mudam a seqüência de raciocínio da leitura, passando a entender que o Espírito não é uma pessoa, mas, sim, uma força impessoal (elas fazem o mesmo com 2Co 13:13; Ef 4:4-6, etc.). A propósito, as TJ lêem Mateus 10:28 do mesmo jeito que o Azenilto e os demais não imortalistas lêem esse versículo.

Dentro dessa minha crítica a essa espiritualização e alegorização que o Azenilto fez em Mateus 10:28, eu de forma alguma estou dizendo que toda a Bíblia deve ser lida de forma literal (e vice-versa), pois afirmar isso seria, no mínimo, uma grande insensatez. O que estou dizendo, isto sim, é que todos os textos bíblicos devem primeiramente serem lidos e interpretados no seu sentido literal. Porém, se alguma palavra que for lida literalmente não tiver sentido algum dentro do seu contexto, então aí sim nós podemos (dependendo do caso) espiritualizá-la, alegorizá-la, procurando assim um sentido secundário para essa palavra. Esse é o critério a ser usado numa exegese bíblica séria e responsável. Entretanto, a espiritualização e a alegorização que o Azenilto (e o Dr. Bacchiocchi) fez na expressão “matar a alma” de Mateus não tem critério exegético nenhum. Aliás, o único critério que ele usou em Mateus 10:28 foi o critério da conveniência, em que ele fez o que quis com essa expressão, procurando enquadrá-la dentro daquilo que ele acredita estar certo.

Mas a incoerência e parcialidade dele na exegese não param por aí… Vejam que quando o Azenilto chega na segunda parte do versículo (“temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo”), ele volta novamente a ler o texto literalmente, pois aqui ele diz em sua resposta que “alma” e “corpo” no texto é o mesmo que “ser integral” (veja a resposta dele acima, antes do ponto 1, em que destaquei em rosa a expressão “ser integral”). Aliás, se essa interpretação azeniltiana estiver certa, então isso indica que Jesus, ao pronunciar essas palavras de Mateus 10:28, se expressou também da mesma forma que o Azenilto sugere: primeiro Jesus falou literalmente a expressão “matar o corpo”; depois, na expressão “matar a alma”, Ele já começou a falar alegoricamente; por fim, no restante do versículo Jesus voltou novamente a falar de forma literal.

Resumindo, a leitura que o Azenilto faz de Mateus 10:28 é a seguinte: primeiro ele começa lendo esse versículo de forma literal; depois, em “matar a alma” ele convenientemente espiritualiza, alegoriza, troca palavras no texto; por último, ele novamente volta a ler a passagem literalmente. Tendo em vista essa seqüência de leitura e interpretação aplicado pelo Azenilto a esse versículo, o seu método exegético pode ser expresso pela seguinte fórmula: Literal-Alegórica+Troca de Palavras-Literal. Bem, abaixo veremos as conseqüências pelo uso de tal método exegético.

Essa oscilação na leitura do Azenilto é anormal e fere as regras básicas da exegese séria e responsável, visto que o sentido literal de “alma” nesse versículo deve ser mantido (assim como o sentido literal de “corpo” também foi mantido). Ler “alma” em Mateus 10:28 literalmente não altera em nada o sentido daquilo que Jesus disse, assim como ler “corpo” literalmente também não altera em nada aquilo que foi dito pelo Senhor. Se quisermos dar sentidos secundários a essas duas palavras, tentando tirar o seu sentido nu e cru, literal, então o texto perde o sentido. Portanto, concluo que o Azenilto fez tudo isso porque ele não queria de forma alguma reconhecer que aqui em Mateus 10:28 Jesus usou nitidamente a palavra “alma” (assim como a palavra “corpo”) com o seu sentido primário, literal, primitivo, ou seja: “alma” como sendo o elemento imaterial-imortal que há dentro do homem e que sobrevive à morte do corpo. Como substituir uma expressão literal por um sentido secundário, sem tirar o sentido do texto, é uma tarefa impossível, então o Azenilto, disposto a pagar o preço que fosse necessário para tentar anular a interpretação imortalista do texto, baixou de vez o nível em sua exegese, passando a aplicar o método exegético do tipo Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal. Porém, vimos que mesmo assim o Azenilto não foi bem sucedido em sua empreitada, visto que o versículo ficou sem pé nem cabeça.

Outro detalhe importante: ao usar a palavra “alma” no seu sentido mais restrito, literal e primitivo (e não em sentidos secundários), conclui-se que Jesus falava sobre uma “alma” no sentido de “elemento imaterial-imortal que há dentro do homem, e que sobrevive à morte do corpo”. Esse era o sentido literal de “alma” aceito universalmente, tanto pelos judeus como pelos pagãos. Evidentemente Jesus não usaria “alma” no seu sentido literal (que portanto não admite sentidos secundários) se Ele não cresse que existisse uma alma imaterial no interior do homem.

Ao aplicar esse método exegético em Mateus 10:28, o Prof. Azenilto (assim como o Dr. Bacchiocchi e a IASD) sem querer revelou o seu método particular, conveniente, seletivo e parcial de fazer exegese. Assim como um oleiro molda a argila, fazendo assim um vaso que lhe agrada, igualmente esse método exegético permite que o Azenilto molde o texto bíblico da forma que ele quer, permitindo-lhe provar aquilo que bem entender. Se esse seu método for utilizado noutros textos bíblicos, então as conseqüências serão horripilantes. Eu explico… Em sua ânsia por combater o entendimento imortalista de Mateus 10:28, o Azenilto sequer parou para pensar que por meio de espiritualizações, alegorias e substituições de palavras estratégicas no texto, nós podemos assustadoramente provar o que quisermos na Bíblia. A coisa mais fácil do mundo é uma pessoa se deparar com um texto bíblico (p.e., Mt 10:28) que contraria alguma doutrina que ela crê e, em seguida, para defender essa doutrina, essa pessoa convenientemente interpreta literalmente uma parte desse texto, alegoriza outra, e, melhor ainda, ela troca palavras que sejam empecilhos para aquilo que está defendendo. Tratando o texto dessa forma, essa pessoa aparentemente consegue blindar a doutrina que ela crê, pensando defendê-la de quaisquer críticas que eventualmente surjam. Sendo assim, se eu quiser eu posso ler Mateus 10:28 e, passando a fazer uso do método exegético azeniltiano (o Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal), eu consigo provar que esse texto ensina que o Inri Cristo (aquele maluco que aparece na TV) de fato é Jesus Cristo, ou que o diabo e seus anjos são bons e que portanto serão salvos, ou que eu devo ser adorado, ou que Jesus é uma criatura, ou que o sexo antes do casamento é agradável a Deus, ou que a guarda do sábado implica salvação, ou que o arcanjo Miguel é Jesus, ou qualquer outra coisa que a minha mente fértil e criativa possa conceber.

Creio que já deve estar ficando claro para os leitores as implicações negativas que esse método utilizado pelo Azenilto na interpretação de Mateus 10:28 traz para o Cristianismo. Ora, esse método peca gravemente porque ele tira todos os referenciais da exegese bíblica séria e responsável, pois sem eles as pessoas poderiam passar a interpretar as passagens bíblicas como bem entendessem, e as milhares de interpretações de um único texto variariam conforme a criatividade e os pontos de vista maculados pelo pecado. Se usarmos o método exegético à moda Azenilto, qualquer um de nós pode ler qualquer texto bíblico e provar o que bem entender, ilimitadamente, e o bom em tudo isso é que ninguém poderá nos acusar de estamos errados. Sendo assim, posso concluir que o método Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal sempre foi (e pelo visto continua sendo) a melhor arma dos hereges para construir ou defender suas falsas doutrinas: basta apenas que eles troquem convenientemente as palavras no texto, atribuam sentidos estranhos às palavras importantes e alegorizem e espiritualizem à vontade… Estou convencido de que esse método exegético exposto pelo Azenilto ajude a explicar a existência de tão grande número de seitas diabólicas cujos adeptos – embora estejam descendo rápida e alegremente pelas belas, largas e atraentes veredas do inferno (pensando ilusoriamente que estão indo para o céu) – assim mesmo juram alegre, fervorosa e fanaticamente que só eles estão certos em sua interpretação bíblica, e que estão seguindo direitinho tudo aquilo que a Bíblia ensina… Aliás, será que esse método exegético também não explique a razão de o Azenilto invariavelmente ter uma “resposta cabal” para todos os argumentos que nem ainda foram apresentados por aqueles que pensam diferentemente dele? Afinal, esse método possibilita-lhe provar o que ele quiser em qualquer versículo bíblico utilizado (e que ainda será utilizado) pelos seus oponentes! Em resumo, parece que para o Prof. Brito não há mesmo regras fixas para se fazer exegese bíblica: a única regra é que não há regras! É um vale-tudo exegético!

Numa de suas lastimáveis mensagens enviadas para mim na Defesa da Fé (no dia 13/09/2003, às 9:22hs), em resposta à minha análise de Mateus 10:28 (que consta no estudo Aniquilando o Aniquilacionismo), o Azenilto debochadamente disse no último parágrafo de seu comentário: “Assim, mais uma parede do edifício interpretativo de nosso amigo Paulo Araújo desaba, pois que a estrutura foi plantada sobre areia da pobreza exegética, e ante o soprar dos ventos da evidência clara vai mesmo desabando pouco a pouco.” (o destaque em vermelho é meu). Vejam que ele me acusou de ter “pobreza exegética”! Bem, após eu ter mostrado o método exegético que o Azenilto aplicou ao texto de Mateus 10:28 (o Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal), eu gostaria que os leitores julgassem quem de fato tem “pobreza exegética”: eu ou o Azenilto (juntamente com o Bacchioccchi). É trágico e até cômico que o Azenilto, querendo negar a qualquer preço o sentido literal de “alma” defendido pelos imortalistas em Mateus 10:28, chegue ao cúmulo de apelar para um método exegético tão baixo quanto o Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal e, mesmo após fazer toda essa lambança no texto, ainda tenha a petulância, a audácia e o descaramento de dizer que eu é quem tenho “pobreza exegética”! Só falta ele agora dizer que o seu método exegético demonstrado em Mateus é o melhor método do mundo…

Finalizando esse ponto… Eu não tenho certeza se o Prof. Azenilto já cursou algum seminário teológico. Se sim, eu fico pensando qual foi esse seminário e que tipo de orientação ele recebeu lá. Por exemplo, será que nas aulas de exegese o professor do Azenilto chegou a discutir em sala de aula com os alunos esse texto de Mateus 10:28, ensinando-os a interpretá-lo assim como o Azenilto interpreta? Se sim, então certamente foi esse professor quem ensinou ao Azenilto esse método Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal para interpretar Mateus 10:28 (e outros textos bíblicos). Aliás, tendo em vista as notáveis semelhanças de idéias e argumentos na interpretação de Mateus 10:28 (e de outros textos que falam sobre outros assuntos), eu tenho quase certeza que esse professor de exegese do Azenilto foi o Samuele Bacchiocchi! E pelo sucesso que o Dr. Bacchiocchi tem entre os adventistas, então certamente suas aulas de exegese deveriam ser bastante freqüentadas, salas lotadas. Porém, essa alta freqüência em suas aulas de exegese evidentemente me deixa muitíssimo preocupado: há um exército incontável de alunos-discípulos do Bacchiocchi mundo afora fazendo esse tipo de exegese que aprenderam com ele! Um desses alunos, é claro, foi o Prof. Azenilto, que, de tão bom e aplicado aluno que foi, tornou-se até “Professor”. Ora, é bem verdade que até hoje eu ainda não sei ao certo do que é que ele é professor… Talvez de teologia!? Porém, se o Azenilto for professor de teologia num seminário, e sobretudo se a sua especialidade for lecionar exegese, então coitados dos alunos dele… Não trisco meus pés nem na calçada desse seminário…

4. Como é que fica a parte final de Mateus 10:28?

É interessante como que esse entendimento do Azenilto (e também do Bacchiocchi e da IASD) sobre Mateus 10:28, com o decorrer desse estudo, mostra-se cada vez mais inadequado para interpretar o que Jesus realmente disse aqui nesse versículo. O método exegético utilizado por ele que vimos acima, que aparentemente resolvera o problema a seu favor, quando avaliado minuciosamente revela-se totalmente autodestrutivo em suas conseqüências, fazendo com que a interpretação do Azenilto torne-se cada vez mais indefensável.

Vejam abaixo o por quê.

Numa paráfrase que o Azenilto copiou do Bacchiocchi (que citei antes do ponto 1 [em cor azul], e que analisarei em detalhes no próximo ponto de minha crítica), ele disse que “alma” é paralela à “vida eterna em Deus”. Ou seja “alma” é o mesmo que “vida eterna em Deus”, aquilo que os homens não poderiam tirar dos fiéis a Cristo. Bem, agora vamos substituir no versículo a palavra “alma” por “vida eterna em Deus” e, em seguida, veremos as conseqüências autodestrutivas (resultantes do sentido secundário dado à “alma”) para a própria interpretação do Azenilto.

“E não temais os que matam o corpo e não podem matar a vossa vida eterna em Deus;
Se eu perguntar para o Azenilto (e também para os demais não imortalistas) qual é o sentido de “alma” nessa primeira parte do versículo, ele certamente dirá que essa palavra é o mesmo que “vida eterna em Deus”. Até esse ponto, tudo parece “normal” (pelo menos para os não imortalistas) nesse sentido atribuído à “alma”… Porém, vejam o que acontece na última parte do versículo…

“temei antes aquele que pode aniquilar no inferno a vossa vida eterna em Deus e o corpo”

Se agora perguntarmos para o Prof. Azenilto (e para qualquer não imortalista) qual é o sentido de “alma” nessa última parte do versículo, aí ele fica num beco sem saída! Por quê? Vejam que nessa última parte do versículo o Azenilto já não pode mais dizer que “alma” é o mesmo que “vida eterna em Deus”, pois senão ele seria obrigado a crer que Deus pode aniquilar a “vida eterna em Deus” (= “alma”) e o “corpo” juntos! Porém, será que o Azenilto crê que a “vida eterna em Deus” pode ser aniquilada? (Obs.: estou usando a palavra “aniquilar” porque o Azenilto crê que esse é o sentido do verbo grego apolesai nessa última parte do versículo. Veja comentários sobre essa palavra no ponto 6) A única aparente saída para o Azenilto dessa implicação negativa para a sua interpretação seria continuar dizendo que na primeira parte do versículo a palavra “alma” tem sim o sentido de “vida eterna em Deus”, mas que na segunda ocorrência dessa palavra o sentido é outro. Entretanto, logicamente eu seria obrigado a lhe perguntar: “Azenilto, então qual é o sentido de ‘alma’ nessa última parte do versículo?”

Essa pergunta sepulta de uma vez por todas a tentativa do Azenilto de querer dizer que “alma” é o mesmo que “vida eterna em Deus” (ou qualquer outro sentido secundário que ele invente), pois o texto é claro em mostrar que a palavra “alma”, nas suas duas ocorrências no versículo, tem inquestionavelmente o mesmíssimo sentido, e atribuir sentidos diferentes para elas deixaria o versículo sem sentido algum.

Como já disse anteriormente, o obstáculo intransponível que o Azenilto (e o Bacchiocchi, a IASD e as TJ) tem pela frente é tentar atribuir um sentido secundário (“vida eterna em Deus”, “dobrar o espírito”, etc, etc, etc.) para uma palavra (“alma”) que foi usada no texto em seu sentido primário, literal. Tentar fazer isso é tarefa impossível, frustrante e inútil. Eu comparo essa tentativa do Azenilto de transpor esse obstáculo à tentativa daquele homem que estava atolado até o pescoço na areia movediça, mas mesmo assim tentava frenética e desvairadamente se mexer para salvar sua vida. Porém, todo esse seu esforço no final complicou ainda mais a sua situação, visto que quanto mais ele se mexia mais ele se afundava mais e mais, acabando, por fim, afundando completamente e morrendo… De forma semelhante, quanto mais o Azenilto (e os demais imortalistas) tenta “salvar” sua interpretação de Mateus 10:28, “mexendo” aqui e acolá para tentar inutilmente mudar o sentido literal da palavra “alma”, mais e mais ele e essa sua interpretação do versículo se afundam, afundam, até que, no final, eles afundam completamente diante das evidências em contrário e das implicações autodestrutivas dessas alterações feitas no texto…


5. “Corpo” e “alma” são ou não a mesma coisa?

Ao interpretar Mateus 10:28, o Azenilto mostra-se contraditório ou confuso, pois chega a dizer que a “alma” é e não é igual ao “corpo”. Em uma parte de sua resposta citada acima, na paráfrase de Mateus 10:28, o Azenilto disse:

“Se este texto [Mateus 10:28] for lido à luz do sentido ampliado dado por Cristo a alma, o significado da declaração será: “não temais aqueles que podem trazer vossa existência terrena (corpo) a um fim, mas não podem eliminar vossa vida eterna em Deus; mas temais o Deus que é capaz de destruir vosso ser integral eternamente”. (a parte sublinhada e o texto em negrito são meus)

Antes de analisar de perto essa paráfrase acima (texto sublinhado), quero dizer que é muito importante tomarmos muito cuidado para não sairmos por aí fazendo paráfrases de textos bíblicos de qualquer jeito. Ao agir assim corremos o risco de inserir nossos pontos de vistas individuais e denominacionais nessas paráfrases, enquanto que o sentido daquilo que os textos bíblicos de fato estão dizendo acaba sendo deixado de lado. Como veremos a seguir, o Azenilto cometeu essa falha ao elaborar sua paráfrase (aliás, essa paráfrase foi copiada do livro do Bacchiocchi), visto que ela não tem absolutamente nada a ver com aquilo que Mateus 10:28 está dizendo! Essa paráfrase foi habilmente construída para direcionar a leitura e a compreensão dos leitores, de modo que eles cheguem às mesmas conclusões que o Azenilto e os demais imortalistas chegaram.

Bem, vamos agora examinar mais de perto essa paráfrase, e desta forma veremos essa contradição do Prof. Azenilto Brito. O esquema da nossa análise está divido, por questões didáticas, em três partes numeradas de 1 a 3. O texto em vermelho representa o versículo de Mateus 10:28, e o texto em azul é a paráfrase feita pelo Azenilto do texto; as partes em rosa, tanto no versículo quanto na paráfrase, mostram os paralelos que serão comentados:

E não temais os que matam o corpo…

1 Não temais aqueles que podem trazer vossa existência terrena (corpo) a um fim,

e não podem matar a alma;

2 mas não podem eliminar vossa vida eterna em Deus;

3 Temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo.

Mas temais o Deus que é capaz de destruir vosso ser integral eternamente.

Uma comparação entre a paráfrase e o texto bíblico nos revelam algumas coisas interessantes. Podemos notar que no bloco 1 a palavra “corpo” no versículo encontra seu paralelo na paráfrase na expressão “existência terrena (corpo)”. No bloco 2 a palavra “alma” equivale na paráfrase à expressão “vida eterna em Deus”. Sendo assim, nos blocos 1 e 2 podemos ver que o Azenilto claramente considera “corpo” (= “existência terrena”) e “alma” (= “vida eterna em Deus”) como sendo elementos diferentes, ou seja, os homens podem matar o “corpo”, mas eles não podem matar a “alma”. Porém, analisemos agora o bloco 3. Vejam que nesse último bloco estranhamente as palavras “alma” e “corpo” já são a mesma coisa, pois na paráfrase elas são o mesmo que “ser integral”. Sendo assim, a paráfrase do Azenilto diz, ao mesmo tempo, que “alma” e “corpo” são e não são a mesma coisa. Nos blocos 1 e 2 da paráfrase (que parafraseiam a primeira parte de Mateus 10:28), “alma” e “corpo” são diferentes para o Prof. Brito; porém, no bloco 3 (que parafraseia a segunda e última parte do versículo) ele junta “alma” e “corpo” numa coisa só, passando a dizer que esses elementos são iguais (“ser integral”).

Bem, o grande problema do Azenilto é que se ele disser que “alma” e “corpo” em Mateus 10:28 são a mesma coisa, então ele terá insuperáveis dificuldades para interpretar esse versículo, pois isso indicaria que os homens podem matar tanto o “corpo” quanto a “alma”. Logo, o Azenilto é obrigado a crer que essa “alma” é diferente do “corpo”. Porém, é evidente que ele jamais dirá que ela é um elemento imaterial-imortal, diferente do corpo, e que sobrevive à morte! Para não dizer que a “alma” em Mateus 10:28 é igual ao “corpo”, e muito menos para dizer que “alma” aqui é um elemento imaterial-imortal, o Azenilto teve que (inutilmente) pagar um altíssimo preço para inventar um outro sentido para essa palavra. E qual foi a moeda utilizada nesse pagamento? Resposta: o método exegético Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal para interpretar o versículo. Bem, os frustrantes resultados desse método exegético nós já vimos acima, nos pontos 1 a 4 de minha crítica…

Ora, o que o Azenilto talvez ainda não tenha parado para pensar é que ele é obrigado a crer que “corpo” e “alma” sejam a mesma coisa (não importa o sentido de “alma”)! Um não imortalista não tem outra opção a não ser acreditar que o “corpo” é a “alma”, pois se não existe uma alma imaterial-imortal dentro do homem, então a morte do corpo marca o fim de toda e qualquer existência. Quando se refere aos homens, não importa os sentidos secundários que “alma” assuma na Bíblia (“sentimentos”, “caráter”, “coração”, “vida”, “sangue”, “personalidade”, etc.), a conclusão para um não imortalista é só uma: “alma” e “corpo” são a mesma coisa, visto que todos os diferentes sentidos de “alma” só podem ser vivenciados num corpo. Esses diversos sentidos secundários de “alma” evidentemente se referem à própria pessoa. Por exemplo, quando “alma” tem o sentido de “sentimento”, esse “sentimento” se refere logicamente ao sentimento que a pessoa sente (desculpem-me a redundância). Logo, assim que a pessoa morre esse “sentimento” (conforme a crença não imortalista) também morre juntamente com ela, desaparecendo literalmente, sendo restaurado somente na ressurreição dessa pessoa. Os imortalistas, porém, crêem que esse “sentimento” continua existindo mesmo após a morte, pois a alma imaterial-imortal se separa do corpo. Portanto, todos os não imortalistas devem acreditar (para serem coerentes com aquilo que crêem e ensinam) que “alma” (seja no sentido literal ou nos secundários) é o mesmo que “corpo”.

Porém, se “alma” é igual a “corpo”, então como fica o texto de Mateus 10:28? Se essas duas coisas são iguais, então a conclusão é que os homens podem matar tanto a “alma” quanto o “corpo”. Como que o Azenilto e os demais não imortalistas resolvem esse problema?


6. “Destruir” em Mateus 10:28 não é o mesmo que “aniquilar”

“…temei antes aquele que pode fazer perecer [ou ‘destruir’; gr. apolesai] no inferno a alma e o corpo”.

Vejam o que o Prof. Azenilto G. Brito diz sobre essa última parte do versículo:

No final de contas, se esta passagem [Mt 10:28] prova alguma coisa é exatamente que Deus faz “perecer” no gehena, tanto o corpo quanto a alma. Então, a passagem fala também em morte da alma. Assim, “a alma que pecar, essa morrerá” indica que, ao contrário de declarar a imortalidade da alma, a Bíblia aponta à sua possibilidade de morrer, entendendo-se logicamente, os vários sentidos para o termo, que em suas várias opções JAMAIS é qualificado nas Escrituras como “imortal”. (a parte sublinhada é minha)

Segundo o Azenilto (e os demais não imortalistas), “destruir” (gr. apolesai, que vem de apollymi) em Mateus 10:28 é o mesmo que “aniquilar”, indicando assim que Deus aniquila tanto a alma quanto o corpo no inferno. Entretanto, apolesai de forma alguma pode ser o mesmo que “aniquilar”, como veremos a seguir. Aliás, os não imortalistas concluem erroneamente que “destruir” alguma coisa é o mesmo que fazer com que essa coisa deixe de existir do universo. Entretanto, uma coisa destruída mesmo assim continua existindo, embora esteja danificada, arrasada, como se fosse uma sucata. Aqui em Mateus 10:28 apolesai tem os sentidos de “estar perdido”, “perecer”, “arruinar”, “perder-se”. Essa é a situação daqueles que estão afastados de Deus, e que por isso mesmo estão mortos, perdidos, sob condenação divina, e que serão lançados no inferno, uma espécie de “depósito de sucatas”. Como veremos a seguir, esse é o sentido único e claro de apolesai aqui em Mateus 10:28.

Antes de mostrar que o sentido de apolesai não é aniquilar, vou novamente (como fiz no ponto 4) citar o intransponível obstáculo que o Azenilto e os demais não imortalistas têm se disserem que “alma” é o mesmo que “vida eterna em Deus” e, ao mesmo tempo, afirmarem que apolesai tem o sentido de “aniquilar”. Vejam como que o versículo ficaria caso os não imortalistas estivessem certos:

“temei antes aquele que pode aniquilar no inferno a vossa vida eterna em Deus e o corpo”

Será que o Azenilto crê que a “vida eterna em Deus” poder ser aniquilada por Deus? Ou será que (como já argumentei acima) ele tentará em vão dar um sentido diferente para a segunda ocorrência de “alma”, dizendo que ela aqui não é “vida eterna em Deus”? Ora, só essa minha argumentação já é mais do que suficiente para inviabilizar totalmente a tese não imortalista de que apolesai aqui em Mateus 10:28 é o mesmo que “aniquilar”. Porém, abaixo farei algumas reflexões que nos mostrarão que o sentido de apolesai pode perfeitamente ser determinado pelo próprio contexto do versículo, e não pelos pressupostos denominacionais do Azenilto.

Uma pergunta a ser feita é: “Quais destes dois é pior, o aniquilamento ou o sofrimento eterno no inferno?” Bem, eu tenho certeza absoluta que o Azenilto e qualquer não imortalista dirá que o sofrimento eterno no inferno é infinitamente pior do que o aniquilamento. Porém, em cima dessa resposta unânime eu faria ainda outra pergunta: “Qual desses dois faria qualquer homem (seja crente ou não) tremer de medo, o risco de ser aniquilado (aqui a pessoa deixa literalmente de existir) ou o de sofrer eternamente no inferno (aqui a pessoa continua existindo)?” Bem, é evidente que o risco de uma pessoa ser lançada no inferno, para ali sofrer eternamente, é muito mais aterrador do que o risco de ser aniquilado, visto que o aniquilamento instantaneamente, num piscar de olhos, põe um fim literal e irremediável em toda e qualquer existência humana. Bem, essas duas perguntas que deixei nos ajudam a compreender o sentido de apolesai aqui no texto. Mateus 10:28 diz que o castigo infligido por Deus é infinitamente pior do que a morte do corpo que os homens podem aplicar. Porém, se apolesai aqui é “aniquilar” (ou seja, o aniquilado não sente mais nada, visto que ele não mais existe), então como que esse aniquilamento executado por Deus pode ser pior do que a morte do corpo que os homens podem praticar? Se a pessoa aniquilada não mais existe, então que diferença há em morrer nas mãos dos homens ou nas mãos de Deus? Se apolesai é “aniquilar”, então morrer nas mãos de Deus ou nas mãos dos homens é tudo a mesma coisa!

Portanto, apolesai em Mateus 10:28 de forma alguma tem o sentido de “aniquilamento”. E se não tem o sentido de “aniquilar”, então é óbvio que a pessoa que perece no inferno continua existindo por toda a eternidade!

Julgo oportuno nessa parte do versículo compararmos o que o texto paralelo, Lucas 12: 4, 5, diz:

“E digo-vos, amigos meus: não temais os que matam o corpo e, depois, não têm mais o que fazer. Mas eu vos mostrarei a quem deveis temer: temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a esse temei”.

Uma leitura superficial nos mostra que as expressões “fazer perecer [apolesai] no inferno” (Mt 10:28) e “lançar no inferno” (Lc 12:5) são paralelas, ou seja, elas se explicam a si mesmas. Vejam como isso acontece…

1. Como vimos, de forma alguma o sentido de apolesai em Mateus 10:28 é “aniquilar”, pois senão os não imortalistas seriam obrigados a acreditar que Deus pode aniquilar a “vida eterna em Deus”;

2. Aqui em Lucas 12:5 os não imortalistas também não encontram apoio para sua interpretação, visto que é dito que Deus pode “lançar no inferno” as pessoas, e evidentemente “lançar” não tem nada a ver com “aniquilar”;

3. Analisando essas duas conclusões, fica fácil entendermos que esses dois textos paralelos de forma alguma ensinam que a pessoa que vai para o inferno é aniquilada. Logo, o único sentido que resta é que a pessoa continua vivendo conscientemente neste lugar de tormento infindável!

A comparação entre esses dois textos paralelos nos ensina o seguinte: a pessoa que for lançada no inferno perecerá (e não “será aniquilada”) nesse lugar por toda a eternidade! Sabemos muito bem que o risco de Deus “lançar no inferno” uma pessoa, para ali ela receber a ira eternamente a ira divina, impõe medo em qualquer um, e é a um Deus que pode castigar dessa forma que devemos ter medo, não dos homens!


Interpretação de Mateus 10:28

Eu disse no início desse estudo que a discussão giraria em torno do sentido da palavra “alma”, e como os leitores constataram, ficou claro que Jesus usou essa palavra com o sentido de “elemento imaterial-imortal, diferente do corpo, que sobrevive à morte”! Essa clara constatação colide frontalmente com a interpretação do Prof. Azenilto e de todos aqueles outros não imortalistas que estão de mãos dadas com ele nessa compreensão de Mateus 10:28. Quando o Azenilto e o Bacchiocchi tentaram contornar o sentido claro e literal de “alma”, dando a essa palavra sentidos secundários, toda a estrutura do versículo foi alterada, e as conseqüências autodestrutivas dessas alterações contribuíram para que essa interpretação de Mateus 10:28 ficasse totalmente insustentável. Nem entrarei no mérito de se o Azenilto cumpriu ou não sua promessa de dar uma “resposta total e cabal” a tudo aquilo que postei no estudo Aniquilando o Aniquilacionismo – os leitores podem conferir isso lendo e comparando o teor do meu estudo com as respostas que o Azenilto deu a ele. Porém, com relação a esse texto específico de Mateus 10:28, parece mesmo que o Prof. Azenilto (e os demais não imortalistas) não conseguiu pagar sua promessa…

Ao mesmo tempo que apontei seis falhas na interpretação do Azenilto (e dos demais imortalistas), mostrando seus equívocos ao encarar esse texto, eu também já apontava a maneira correta de se interpretar cada parte do versículo. Dentro de tudo aquilo que foi visto, este estudo de Mateus 10:28 provou (explícita e implicitamente) cinco pontos:

1. O homem possui um elemento imaterial-imortal dentro de si, que é chamado de “alma” (e/ou “espírito”);

2. A “alma” se separa do “corpo” quando ele morre;

3. A “alma” e o “corpo” (= ser humano completo) serão, juntos, castigados infindavelmente no inferno – ou seja, um dia (na ressurreição) “corpo” e “alma” serão reunidos;

4. A “alma” (por poder ser castigada infindavelmente no inferno) é imortal;

5. A imortalidade condicional, o sono da alma e o aniquilacionismo são doutrinas claramente contrariadas em Mateus 10:28.

Esses cinco pontos que meu exame de Mateus 10:28 provaram indicam que as doutrinas da imortalidade condicional, do sono da alma e do aniquilacionismo, que o Prof. Azenilto G. Brito tanto defende, tiveram sua raiz comum cortada.

Tendo em vista esses cinco pontos provados, segue abaixo a interpretação de Mateus 10:28…

Em linhas gerais, o décimo capítulo de Mateus fala sobre as dificuldades que os cristãos teriam pela frente quando fossem pregar o evangelho. Jesus diz que Seus discípulos deveriam, mesmo sob forte oposição, permanecer fiéis a Ele, pois só assim eles alcançariam a salvação. Dentro desse contexto de perseguição, está Mateus 10:28. Aqui Jesus diz que Seus discípulos não deveriam temer os homens, visto que o máximo que eles poderiam fazer era (literalmente falando) “matar o corpo” (parte material) deles. Porém, o poder humano para castigar é limitado, visto que eles não poderiam (literalmente falando) “matar a alma” (parte imaterial) dos discípulos. Com isso em mente, os discípulos deveriam temer somente a Deus, pois só Ele tem poder para fazer (literalmente falando) perecer no inferno não só o “corpo”, mas também a “alma”. Jesus aqui está enfatizando que os discípulos, mesmo sendo perseguidos por causa do evangelho, deveriam, acima de tudo, ser fiéis e obedientes somente ao Pai, visto que Ele é infinita e ilimitadamente mais poderoso do que os homens. Este grande poder se expressa (dentre outras formas) na capacidade de Deus lançar os homens (maus) no inferno, para ali sofrerem toda a plenitude de Sua ira. Os discípulos deveriam temer somente a um Deus assim. Vejam que essa interpretação faz uma leitura totalmente literal do versículo inteiro, e o texto de forma alguma perde o seu sentido: ele é entendido prontamente por qualquer pessoa que o leia. Nessa interpretação não precisamos espiritualizar, alegorizar, trocar palavras ou dar sentidos secundários para palavras que foram usadas originalmente no sentido literal, como os não imortalistas, representados pelo Prof. Azenilto e pelo Dr. Bacchiocchi, tentaram frustradamente fazer.

Considerações Finais

Finalizo pedindo que os não imortalistas, após terem contato com o conteúdo desse estudo, possam pesar na balança os meus argumentos e os do Prof. Azenilto (assim como os do Dr. Bacchiocchi, da IASD e das TJ) sobre a interpretação de Mateus 10:28, dizendo no final qual interpretação desse texto tem mais peso na discussão sobre a imortalidade da alma. Diante de tudo isso que expus, penso que não há como um não imortalista sincero e imparcial apoiar, por exemplo, o método exegético Literal-Alegórico+Troca de Palavras-Literal que foi utilizado pelo Azenilto e pelo Bacchiocchi para interpretar Mateus 10:28. Não há possibilidades de um não imortalista sincero e imparcial crer, por exemplo, que a primeira ocorrência de “alma” significa “vida eterna em Deus”, mas que na segunda ocorrência dessa mesma palavra, no mesmo versículo, ela tenha outro sentido. Sendo assim, tenho esperanças de que pelo menos alguns não imortalistas comecem a questionar não só a interpretação de Mateus 10:28 que receberam de seus grupos religiosos, mas também os métodos exegéticos utilizados para se chegar a tal interpretação.

Com relação aos imortalistas, espero que este estudo possa ter fornecido argumentações “novas” dentro do debate sobre a imortalidade da alma e suas implicações. Procurei ao máximo trazer “novas” abordagens desse texto já tão conhecido e discutido de Mateus 10:28. Entretanto, essa “nova” abordagem de forma alguma me levou à conclusões diferentes das que todos nós, imortalistas, já conhecíamos. Que esse estudo possa aumentar ainda mais a convicção dos imortalistas de que a imortalidade da alma tem plena sustentação bíblica, e que por isso essa doutrina (embora secundária para a fé cristã) deve ser pregada, ensinada e defendida perante os que pensam em contrário.

Porém, eu não posso deixar de terminar esse trabalho sem dizer que não estou muito esperançoso com relação ao Prof. Azenilto, pois (pelo que conheço) ele jamais admitirá que esteja errado em sua interpretação de Mateus 10:28. Embora seja impossível que o Azenilto consiga se desamarrar das correntes autodestrutivas e negativas de sua interpretação, que por fim acabam por estrangulá-lo, mesmo assim eu ainda penso que ele continuará afirmando que sua interpretação está correta. Isso me faz lembrar de um trecho de uma mensagem que ele me enviou, em que disse:

…Como dizia um erudito, “a ignorância gera a arrogância”. Os grandes eruditos são humildes o suficiente para mudarem de opinião ante a força das provas contrárias ao que pensam. Eu não me considero nenhum erudito, mas já mudei de opinião e interpretação ante a demonstração de evidências inegáveis. Os que teimam e teimam e teimam com uma opinião a despeito de toda evidência em contrário não são as mentes mais brilhantes, e sim os medíocres, dominados pelo orgulho próprio que não admitem verem ferido..” (msg de 10/09/2003, às 13:17 hs; partes sublinhadas são minhas)

Com toda a sinceridade e temor de Deus que tenho, eu afirmo que nunca vi (uma única vez sequer) o Azenilto admitir que alguém lhe tenha “dobrado o espírito” em qualquer debate bíblico! Para mim, essa declaração dele (de que já mudou “de opinião e interpretação ante a demonstração de evidências inegáveis”) não passa de mais um de seus muitos discursos demagógicos, que são bonitos e verdadeiros na teoria, mas que, no caso dele, jamais são encarnados. Se isso que o Azenilto escreveu acima é verdadeiro, então esperamos que ele, perante as “evidências inegáveis” que foram apresentadas aqui nesse estudo, que mostraram a fragilidade de sua interpretação de Mateus 10:28, admita publicamente que esteja enganado em sua interpretação desse texto! Eu pergunto: “Azenilto, onde é que está essa tal ‘humildade’ que você mencionou?” Será que o Azenilto (mesmo sabendo que sua interpretação de Mateus 10:28 é indefensável) acabará vitimado por esse “orgulho próprio” de que fala, e, não querendo vê-lo ferido, acabará não reconhecendo que está errado? Pelo que conheço do Azenilto, eu infelizmente sou obrigado a responder positivamente a essa pergunta… Creio ser mais fácil o Osama Bin Ladin, o Sadam Hussein e o Fidel Castro tornarem-se grandes amigos do George W. Bush, freqüentando inclusive a Casa Branca, do que o Azenilto admitir que esteja enganado em sua interpretação de Mateus 10:28 (ou de qualquer outro texto). Aliás, vou até mais longe e me arrisco a dizer que se até mesmo o próprio Javé lhe aparecesse dizendo que Mateus 10:28 ensina que o homem possui uma alma imaterial-imortal, ainda sim o Azenilto diria: “Javé, Você está errado! A imortalidade da alma é a ‘primeira mentira de Satanás'”. Como disse no início desse estudo, o Prof. Azenilto é capaz de tudo para negar a imortalidade da alma, de tudo… Quem sabe Ellen G. White não tenha mais sorte em “dobrar-lhe o espírito”, fazendo-o mudar de idéia… Que o Senhor tenha misericórdia desse homem…

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