“…haverá um rebanho e um Pastor” (João 10:16)
Fala-se muito atualmente em união de igrejas, aproximação das denominações, cooperação entre cristãos, unidade na diversidade, etc., sem se atentar ao que dispõe a Bíblia sobre a verdadeira união. Antes de nos unirmos a determinadas denominações, devemos ter em mente aquilo que Deus estabeleceu como a verdadeira unidade do corpo de Cristo.
A Unidade É Pela Verdade
Como exórdio ao presente estudo, devemos ressaltar que a unidade cristã é bíblica e, portanto, deve ser buscada pelos membros do Corpo de Cristo (embora essa unidade não decorra da mera vontade humana). Orando ao Pai, Jesus disse: “Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como nós. … E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela sua palavra hão de crer em mim; para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (João 17:11, 20 e 21). Essa idéia de unidade do corpo de Cristo resulta da idéia central da Tri-Unidade de Deus. Por isso que o apóstolo Paulo declarou: “Porque nós, sendo muitos, somos um só pão e um só corpo, porque todos participamos do mesmo pão” (1 Coríntios 10:17).
A unidade do Corpo de Cristo permite a união dos desiguais: “Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito. Porque também o corpo não é um só membro, mas muitos. … E, se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo? Assim, pois, há muitos membros, mas um corpo” (1 Coríntios 12:13-14 e 19-20). Paulo assim escreve para demonstrar que cada membro do corpo é diferente um do outro, mas forma uma unidade: uns são mãos, outros, pés, outros olhos, assim por diante – não somos todos apenas um membro do corpo, mas vários membros formando um só corpo: “E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: Não tenho necessidade de vós. Antes, os membros do corpo que parecem ser os mais fracos são necessários; … Para que não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual cuidado uns dos outros. De maneira que, se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele.” (vs. 21-22; 25-26).
O cristianismo é, sobretudo, uma religião baseada na união – união de gregos e troianos, judeus e gentios, negros e brancos, ricos e pobres, todos unidos numa só fé – mas não tolera a conjunção entre o certo e o errado, a verdade e a mentira, a luz e a escuridão. Assim, a unidade cristã se dá PELA verdade bíblica universal, a Palavra viva, santa e imutável de Deus. Na sua oração pela unidade, Jesus disse: “Porque lhes dei as palavras que tu me deste; e eles as receberam; … Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade.” (João 17:8 e 17). Se não for PELA Palavra de Deus não haverá unidade cristã verdadeira. Portanto, a unidade não deve ser meramente espiritual, mas também bíblico-doutrinária, mediante a uniformidade da fé.
A Unidade É Para a Verdade
Muitos pastores e líderes buscam a unidade em meio ao erro doutrinário, o que contradiz a Palavra de Deus. Essa “unidade”, na realidade, agrada muito mais aos homens do que a Deus. Não falo das pequenas diferenças existentes no meio cristão (pois, como dissemos, cada membro do corpo é desigual), que não comprometem a sã doutrina, mas daquelas que possam afetar a verdade bíblica. Por exemplo: como poderei andar com um irmão que vive de “revelações” e que coloca as suas experiências pessoais acima da Bíblia, se eu creio que a Bíblia é a minha única regra de fé e conduta? Ou como poderei participar de uma igreja que ensina um outro evangelho (do cristianismo fácil, da busca de sucesso material, da salvação condicionada ao mérito pessoal, do curandeirismo, da realização de “sinais e prodígios”, do G12, etc.) se prego a simplicidade do evangelho de Cristo? “Porventura andarão dois juntos, se não estiverem de acordo?” (Amós 3:3).
Respeito muito o trabalho daqueles que buscam a unidade no meio evangélico, mas esse trabalho será em vão se não for PARA A VERDADE, por obra e vontade do nosso Deus: “Se o SENHOR não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam; se o SENHOR não guardar a cidade, em vão vigia a sentinela.” (Salmos 127:1). O nosso dever de afastamento daqueles que se desviaram da verdade é muito mais bíblico do que a busca pela unidade a qualquer custo: “E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles.” (Romanos 16:17). Essa admoestação não se dirige à observação somente dos “hereges”, mas também contra os que promovem “dissensões” doutrinárias, “Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus Cristo, mas ao seu ventre; e com suaves palavras e lisonjas enganam os corações dos simples.” (v. 18). Lembre-se bem deste conselho: “Compra a verdade, e não a vendas.” (Provérbios 23:23a).
A Unidade É Mediante a Fé
Se cremos todos em conformidade de fé (essa é a unidade que deve ser buscada – a unidade da fé), há união cristã verdadeira, ainda que distâncias nos separem. Paulo ensina que devemos nos suportar uns aos outros em amor, procurando guardar a UNIDADE DO ESPÍRITO pelo vínculo da paz (Efésios 4:2-3). Para isso, foi-nos dado “uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos …Até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente.” (Efésios 4:11-14). Note bem que essa unidade da fé não comporta variações doutrinárias, porque senão nos tornaríamos como meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina. Havendo a unidade de fé, todo o corpo de Cristo se torna bem ajustado e ligado pelo auxílio de todas as juntas (v. 20), isto é, sem divergências doutrinárias relevantes.
A Unidade Ocorre na Separação
A união cristã verdadeira somente existirá separando-se o joio do trigo. Da mesma maneira que não devemos nos prender a um jugo desigual com os infiéis (2 Coríntios 6:14), de igual forma não podemos nos associar com os que promovem dissensões doutrinárias. Essa unidade do ponto de vista bíblico se dará exclusivamente se houver total separação. Contradição? Não, pois a verdade não se coaduna com o erro; não existe unidade em meio à discórdia.
O Pr. Ron Riffe, no maravilhoso artigo intitulado “A Doutrina Bíblica da Separação”, publicado no Jornal Sã Doutrina (JARF) nº 10 (março/2003), pg 3, citando 2 Tessalonicenses 3:6, 11 e 14-15, lembra que “alguns crentes de Tessalônica estavam com a falsa idéia que o arrebatamento ocorreria em um futuro próximo. Muitos deles venderam suas propriedades, abandonaram seus empregos e ficaram ociosos, esperando o retorno do Senhor. Enquanto aguardavam, alguns recusavam-se a trabalhar pela comida que recebiam, enquanto outros ficavam se metendo na vida alheia”. Paulo então os adverte:
“Mandamo-vos, porém, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo o irmão que anda desordenadamente, e não segundo a tradição que de nós recebeu. … Porquanto ouvimos que alguns entre vós andam desordenadamente, não trabalhando, antes fazendo coisas vãs. … Mas, se alguém não obedecer à nossa palavra por esta carta, notai o tal, e não vos mistureis com ele, para que se envergonhe. Todavia não o tenhais como inimigo, mas admoestai-o como irmão.” (2 Tessalonicenses 3:6, 11 e 14-15).
Observe bem: todos aqueles que promoviam aquela desordem eram crentes em Cristo, esperavam a salvação em Jesus, criam na Bíblia, enfim, podiam ser chamados de “irmãos”. Mas andavam desordenadamente (isto é, “marchando em outro ritmo”, conforme explicado pelo pastor Riffe), contra a própria tradição apostólica. Qual a semelhança dos tessalonicenses para os crentes hodiernos que praticam coisas contrárias à sã doutrina? Nenhuma, pois ambos andam “desordenadamente”. Devemos, pois, nos misturar com os que acreditam em coisas que reprovamos à luz da Bíblia? Ou será que teremos de admitir que eles estão certos e que nós estamos errados? Como nos entenderemos, estando nós em desacordo?
Apartai-vos Deles
Se você acha estas palavras duras e exegeticamente erradas, perdoe-me a franqueza, mas está se opondo ao próprio Deus, que deseja separar um povo santo para sua exclusiva glória e autoridade. A verdade é que, embora possamos considerar muitos deles como irmãos (assim os considero com fundamento em Mateus 24:24 e 2 Tessalonicenses 3:15), devemos nos afastar dos que não estão de acordo com a sã doutrina, para que não haja confusão doutrinária. Não sou eu quem diz, mas o próprio apóstolo Paulo, inspirado pelo Espírito Santo de Deus. A confusão doutrinária no meio cristão é semelhante à balbúrdia ocasionada pela multidão em alvoroço – ninguém se entende e cada um segue desordenadamente. Se eles estão dispostos a nos ouvir, aí sim poderá haver uma aproximação e, quiçá, até a almejada união (eu também a desejo, mas com a verdade).
O apóstolo Paulo ainda demonstra que devemos nos afastar daqueles que se desviaram da sã doutrina: “Ao homem herege, depois de uma e outra admoestação, evita-o, sabendo que esse tal está pervertido, e peca, estando já em si mesmo condenado” (Tito 3:10-11). Certamente o texto fala de heresias; mas, não são heresias as muitas coisas que se pregam em determinados círculos evangélicos? Lembramos que muitas das igrejas com as quais se almeja a união saíram do nosso meio. Por que? “Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós.” (1 João 2:19). Saíram de nós por desacordo – voltaremos a nos unir com eles ainda em desacordo?
Várias são as admoestações bíblicas no sentido da separação mesmo: “Se alguém ensina alguma outra doutrina, e se não conforma com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo, e com a doutrina que é segundo a piedade, é soberbo, e nada sabe, mas delira acerca de questões e contendas de palavras, das quais nascem invejas, porfias, blasfêmias, ruins suspeitas, contendas de homens corruptos de entendimento, e privados da verdade, cuidando que a piedade seja causa de ganho; aparta-te dos tais.” (1 Timóteo 6:3-6). “Todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter convosco, e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o saúda tem parte nas suas más obras.” (2 João 1:9-11)
Conclusão
Infelizmente, sempre haverá dissensões doutrinárias no meio evangélico – o joio crescerá no entre o trigo para, finalmente, ser arrancado e lançado fora (Mateus 13:30). E isso é necessário até mesmo para que se levantem os que são leais à sã doutrina: “E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós.” (1 Coríntios 11:19); os que não são leais à sã doutrina farão de tudo para alcançarem a união fora dos padrões bíblicos e muitos “leais” poderão se influenciar pela falsa união. No entanto, devemos nos separar dos contradizentes e dos que estão em desacordo com a [única] verdade, sob pena de estarmos agradando ao nosso próprio ventre, aos homens e de desobedecermos a Deus. Ora, “mais importa obedecer a Deus do que aos homens” (Atos 5:29). Essa unidade não pode ser a que almeja nossos corações e nem a que vislumbra nossos olhos humanos, mas deve estar centrada na Palavra da Verdade e se conformar com a vontade divina. Por esse motivo, o líder cristão deve seguir “Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes.” (Tito 1:9).
Deus nos abençoe!
Autor: Marcos A. F. Martins – marcosafmartins@ig.com.br
Editor do jornal “A Resposta Fiel”
A Espada do Espírito
Artigo enviado ao CACP por Mary Schultze