Em seus escritos, especialmente em “Conselhos Sobre o Regime Alimentar” (1938), Ellen White faz várias declarações enfáticas contra o consumo de carne. Ela afirma que a carne “estimula, … prejudica o estômago e perverte o paladar” (p. 48), “excita as paixões animais inferiores” (p. 63-64), e “animaliza o homem” (p. 390). White também alega que consumir carne “enfraquece o vigor do pensamento para a compreensão de Deus e da verdade” (p. 384) e que “uma vida religiosa pode ser … mantida com mais sucesso se a carne for descartada” (p. 389). Ela chega ao ponto de dizer que aqueles que consomem carne “devem se afastar do povo de Deus” (p. 382) e que “o povo de Deus deve tomar uma posição firme contra o consumo de carne” (p. 383).
“E nós, para podermos entrar na pátria celestial, necessitamos de uma preparação maior que a dos Judeus (que se alimentavam de carne) para entrarem na Canaã terrestre. Nesta preparação, devemos, portanto, nós os que vivemos no tempo do fim, abster-nos do alimento cárneo com maior razão que eles” (“A Carne e a Saúde – Ed. Verdade Presente; 20 Edição; p.126” – parêntese e grifo nosso).
“… Muitos alegam… que a carne é essencial; mas é devido a ser o alimento desta espécie estimulante, a deixar o sangue febril e os nervos excitados, que assim se lhes sente a falta. Alguns acham tão difícil deixar de comer carne, como é o ébrio o abandonar a bebida… (A Ciência do Bom Viver, EG White, p.268,271)
CARNE E ALIMENTOS AFINS
O consumo de carne é mencionado no concerto que Deus fez com Noé: “Tudo quanto se move, que é vivente, será para vosso mantimento…” (Gn 9.3). Aqui vale uma observação: isso ocorreu antes da Lei Mosaica.
Embora a dieta normal dos hebreus consistisse em vegetais e frutas, eles comiam carne, especialmente nos banquetes e festas:
- Novilho: quando o filho pródigo voltou ao lar, o pai matou um novilho cevado para festejar (Lc 15.23). Na vida dos hebreus, o novilho era considerado a melhor de todas as carnes e reservado para as ocasiões mais festivas;
- Cabrito ou bode: o irmão mais velho do filho pródigo ficou indignado e disse ao pai: “Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos” (Lc5.29; grifo do autor). O cabrito era a carne mais comum, mais barata, e comida pelos pobres. Era usado nas ofertas sacrificiais (Nm 7.11 -87);
- Ave: algumas eram consideradas impuras para alimento (Dt 14.11-20). Mas a perdiz, a codorniz, o ganso e o pombo podiam ser comidos;
- Peixe: alimento predileto na Palestina, apanhado em grandes quantidades no mar da Galileia e no rio Jordão. Depois de sua ressurreição, Jesus preparou uma refeição matinal de peixe e pão num braseiro junto à praia para alguns dos seus discípulos (Jo 21.9-13). Em outra feita, quando apareceu aos discípulos após a ressurreição, ele pediu-lhes algo para comer. Lucas relata: “Então eles apresentaram-lhe parte de um peixe assado, e um favo de mel; o que ele tomou, e comeu diante deles” (24.42,43). A Lei declarava que todo peixe com barbatanas e escamas era limpo e, portanto, podia ser comido (Dt 14.9,10);
- Ovelha (cordeiro): além de ser usada como alimento, a ovelha tinha outras utilidades. Era um animal importante por sua carne, leite e gordura da cauda que, às vezes, chegava a pesar quase sete quilos. Na celebração da Páscoa, matava-se um cordeiro, que era comido para rememorar o livramento da escravidão do Egito (Ex 12.1-28).
- Gordura: a gordura pura era ofertada a Deus, visto que era considerada a melhor parte ou a parte mais rica de um animal (Lv 3.16). Não podia ser comida em tempos primitivos, mas parece que se ignorava essa lei quan-do os animais eram mortos e usados apenas como alimento (Dt 12.15).
Acrescenta, ainda, o dr. Davis: “O alimento dos hebreus, durante o seu estado de povo nômade, consistia, em grande parte, de pão e de produtos dos rebanhos, tais como: leite, manteiga, carnes (Gn 18.7,8; Jz 5.25) e mel silvestre (Dt 8.8). Depois de seu estabelecimento na Palestina, acrescentaram os produtos das hortas, das vinhas e dos olivedos, como: lentilhas, pepinos, feijões (2Sm 17.28), as romãs, os figos, as uvas etc (Nm 20.5, Dt 8.8). […] e bem assim, peixes, gafanhotos, aves e ovos (Ne 13.16, Mt 4.18). Abraão recebeu os seus inesperados hóspedes, de um modo mais distinto, oferecendo-lhes coalhada e leite, bolos de flor de farinha e um bezerro” (Gn 18.6-8)”.
NO NOVO TESTAMENTO
Encontramos uma única exceção: não comer carne sacrificada aos ídolos: “Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue, e da carne sufocada, e da prostituição, das quais coisas bem fazeis se vos guardardes” (At 15.29).
Havia também uma advertência aos coríntios quanto ao fato de se comer carne. Eles deveriam ter o cuidado de não levar um irmão mais fraco a supor que a carne que estava comendo era sacrificada aos ídolos (quase toda carne dos mercados de Corinto era oferecida aos ídolos antes do consumo) e, com isso, o mais fraco ficar com a consciência contaminada. Nesse contexto, por causa do fraco, Paulo diz: “Bom é não comer carne, nem beber vinho, nem fazer outras coisas em que teu irmão tropece, ou se escandalize, ou se enfraqueça” (Rm 14.21).
A preocupação do apóstolo não era proibir a igreja de comer carne, mas de não escandalizar o fraco: “Porque um crê que de tudo se pode comer, e outro, que é fraco, come legumes. O que come não despreze o que não come; e o que não come, não julgue o que come; porque Deus o recebeu por seu” (Rm 14.2,3).
Como podemos ver, a igreja neotestamentária comia carne. O Senhor Jesus também: “Veio o Filho do homem. comendo e bebendo, e dizem: Eis aí um homem comilão e beberrão, amigo dos publicanos e pecadores” (Mt 11.19; Jo 21.13). Por que, então, não podemos comer carne?
O CERNE DA QUESTÃO
A problemática da retórica descrita por Paulo em sua homilética diz respeito ao irmão mais fraco, pois ele diz: o débil come legumes” (Rm 14.2; ara); “… e outro, que é fraco, come legumes (Rm 14.2; Ed. Contemporânea). Geralmente, a carne era sacrificada aos ídolos antes de ser ingerida e, conforme o costume das igrejas, os irmãos de Roma e de Corinto estavam comendo carne como a liberdade cristã os permitia. É aí que Paulo mostra que a nossa liberdade não deve ofender a fé alheia: “Eu sei, e estou certo no Senhor Jesus, que nenhuma coisa é de si mesma imunda, a não ser para aquele que a tem por imunda; para esse é imunda. Mas, se por causa da comida se contrista teu irmão, já não andas conforme o amor. Não destruas por causa da tua comida aquele por quem Cristo morreu (Rm 14.14,15).
A liberdade, afirma Paulo, deve estar sujeita ao amor. E assim os irmãos, ainda que não fosse pecado comer carne, deveriam sacrificar-se por aqueles que eram fracos e débeis no conhecimento e achavam que a ingestão de carne poderia lhe tirar a comunhão com Deus. O fato é que tal texto não é, de modo nenhum, uma proibição de comer carne, sendo que o próprio apóstolo ainda acrescenta: “Mas o Espírito expressamente diz que nos últimos tempos apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios; pela hipocrisia de homens que falam mentiras, tendo cauterizaria a sua própria consciência; proibindo o casamento, e ordenando a abstinência dos alimentos que Deus criou para os fieis, e para os que conhecem a verdade; a fim de usarem deles com ações de graças; porque toda a criatura de Deus é boa, e não há nada que rejeitar, sendo recebido com ações de graças. Porque pela palavra de Deus e pela oração é santificada” (1Tm 4.1-5; grifo do autor).
Apesar do nosso compêndio ser teológico, citaremos na próxima edição uma análise de duas nutricionistas que, imparcialmente e sem envolvimento religioso, responderão a algumas indagações maliciosas dos adventistas que, para substanciar suas teorias, torcem fatos e inventam boatos.