Talvez o fator que mais influencie as pessoas no favorecimento cego, isto é, sem análise, de doutrinas controvertidas como as já citadas, seja o empirismo. Segundo o Dr. R. N. Champlin e o Pr. J. M. Bentes, empirismo “é a tese que diz que todo conhecimento (excetuando as proposições puramente lógicas, como as das matemáticas) está alicerçado sobre a experiência.”[1]
Claro que precisamos desenvolver nossa intimidade com Deus. Essa intimidade é construída mediante um relacionamento pessoal que se dá através da oração e do conhecimento da Palavra. Reconheço que a oração é fundamental para dialogarmos com o Senhor, mas não pode andar sozinha, pois é pelo conhecimento bíblico que filtramos as experiências e até mesmo o que vamos falar com Deus.
Quando me desliguei do ministério em células, algumas pessoas me procuraram pedindo que eu reconsiderasse a decisão. De todos os argumentos que tentavam utilizar para me convencer a voltar atrás, o mais comum era se Deus havia me revelado para sair de lá.
Quando eu respondia que ainda não tinha uma resposta clara no espírito, eles diziam que eu não deveria sair então, pois primeiro era necessária a revelação divina. Diante de tal questionamento, respondi que há coisas que não precisamos orar.
Tão acostumados ao empirismo, assustavam-se com essa resposta, mas eu prosseguia na explicação: “Imagine que alguém esteja desempregado e essa pessoa vai até minha casa. Chegando lá vê uma nota de cinquenta reais em cima da estante. Pelo fato de estar precisando do dinheiro, ela precisaria orar, dizendo ‘Senhor, eu roubo esse dinheiro, sim ou não?’ A Bíblia já responde essa questão, não furtarás”.
Quando comecei a detectar as heresias que estavam sendo ensinadas, as práticas que estavam prejudicando o corpo e as relatei ao pastor presidente e este não demonstrou nenhuma preocupação, não tinha outra alternativa senão me desligar dessas doutrinas.
A experiência não pode ser mais valorizada do que a Palavra de Deus. O próprio movimento G-12 começou com várias experiências questionáveis de César Castellanos.
Não dá para nos basearmos em revelações extra-bíblicas e desta forma formar doutrinas. Ele chega a contar que sua esposa interpretou o que Deus estava falando por intermédio de uma melodia profética tocada por um saxofone.[2]
O que dizer da Apóstola Valnice Milhomens quando no ano de 1990 em seu Programa de TV “Palavra da Verdade”, exibido pela Rede Bandeirantes, anunciou a volta de Cristo para algum Sábado de 2007?
O Dr. Paulo Romeiro transcreveu em seu livro “Evangélicos em Crise”, palavra por palavra do que foi declarado por Valnice. Ela chega a afirmar que,
Deus me trouxe isso no espírito agora em Israel quando eu estava às margens do Jordão. Quando um profeta não souber falar, a mula vai falar, mas Deus não ficará sem voz na Terra (…) Não passará esta geração até que o resto se cumpra. Que geração? A geração que começou no dia sete de junho de 67. Quanto dura uma geração? Quarenta anos. Glória! Uma geração, contando de 67, vai até quando? 2007.[3]
Ela se auto-intitulou a voz de Deus na terra para anunciar a volta de Cristo. Embora esse não seja um problema exclusivo do movimento G-12, não posso deixar de abordar a ênfase que os muitos líderes gedozistas têm dado à experiência. Muitos deles escutam Deus falar o tempo todo, assim como a Valnice disse ter recebido do Alto a revelação da volta do Messias.
Depois que me desliguei do ministério, muitos disseram que Deus mandou falar muita coisa, mas a abordagem do Dr. MacArthur explica melhor a banalização que vemos atualmente para com a teologia da intimidade com Deus:
Há alguns anos, almocei com um pastor carismático muito conhecido e influente. Era também um autor muito lido e uma pessoa freqüente nos meios de comunicação dos Estados Unidos. Ele me disse: ‘De manhã, quando me barbeio, Jesus entra no meu banheiro, põe o braço à minha volta e conversamos’. Ele parou para avaliar minha reação e disse-me: ‘John, você acredita nisso?’ ‘Não, não acredito’. Respondi. ‘Porém, o fato que mais me incomoda é o fato de que você acredita’. ‘Por que?’, ele perguntou. ‘Por que é tão difícil você aceitar a idéia de que Jesus vem visitar-me pessoalmente a cada manhã?’ Eu pensei: ‘Será que ele continua fazendo a barba ou cai de temor e tremor na presença do Senhor glorificado?’ Quando Isaías viu o Senhor no trono, ele disse: Ai de mim, estou perdido! (Is 6.5). Pedro viu o Senhor e prostrou-se dizendo: Senhor, retira-te de mim, porque sou pecador (Lc 5.8). Não creio que alguém pudesse continuar a barbear-se na presença do Senhor ressurreto!”[4]
Além disso, temos outros casos mais graves e que passam pelo povo evangélico não sei se pela falta de atenção, se pela falta de conhecimento ou pela idolatria aos líderes.
Um dos hereges que mais influenciou as igrejas da atualidade com a Teologia da Prosperidade ou Confissão Positiva, Keneth E. Hagin, chegou a dizer o seguinte: “Os teólogos de modo geral, não têm certeza quanto à autoria da Epístola aos Hebreus. Para mim, a carta se parece com os escritos de Paulo. Certa vez, quando Jesus apareceu para mim em uma visão, eu lhe perguntei isso, e Ele me respondeu que Paulo a escrevera”.[5]
Caso ache exagero de minha parte analise cautelosamente outra declaração do mesmo pregador:
Certo ministro, anteriormente bastante sólido na fé, disse: ‘Não preciso mais daquele livro. Já o ultrapassei’. A seguir, lançou a Bíblia no chão. ‘Tenho o Espírito Santo. Sou profeta. Deus me envia instruções de forma direta’[6]
Sabe por que esses homens não são questionados de ensinamentos como esses? Porque os sinais sobrenaturais que executam são suficientes para serem atribuídas a Deus por seus seguidores.
Essa é a realidade do Empirismo, não se questiona o que se sente, basta ser sobrenatural e realizado por alguém que se diz “evangélico”.
O que Jesus nos ensinou é que a árvore é conhecida pelos frutos e não pelos sinais que realizam (Mt 7.15-23). Não é pelo fato de ter sido curado, caído no poder ou ter sentido um calorzinho que há garantia da atuação de Deus.
[1] CHAMPLIN, R. N.; BENTES, J. M. Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia, volume 2. Candeia. São Paulo, 1991, p. 357.
[2] CASTELLANOS, César. Liderança de Sucesso Através dos 12. Palavra da Fé Produções. São Paulo, 2000, p. 319.
[3] ROMEIRO, Paulo. Evangélicos em Crise. São Paulo: Mundo Cristão, 1.999, p. 183, 184.
[4] MACARTHUR, John F. O Caos Carismático. Fiel, 1992, São José dos Campos, p 44.
[5] HAGIN, Kenneth E. The gifts and the calling of God. Tulsa: Faith Library, 1986, p. 12.
[6] HAGIN, Kenneth E. The gift of prophecy. Tulsa: Kenneth Hagin Ministries, 1969, p. 24.
Extraído do livro “A Verdade Sobre o G12″, Couto