Gostaria de, nas próximas três seções, mostrar três grandes perigos do movimento G-12. A primeira delas já está aqui descrita, lavagem cerebral. E as outras duas serão argumentadas em cima da manipulação emocional e das técnicas psicológicas que o movimento adota.
A expressão “lavagem cerebral” foi usada pela primeira vez em 1950 por Edward Hunter, um jornalista norte-americano. Ele a utilizou como a tradução do trocadilho chinês Hsi nao , que significa, literalmente, “lavagem cerebral” com Hsi xin (termo taoista que significa lavagem do coração). Os informantes chineses utilizaram este termo ao se referirem sobre a vida na prisão após a revolução comunista chinesa.[1] O estudo desse tema é chamado de “Reforma do pensamento” na psicologia.
Sei que algumas pessoas ficarão chocadas com essa aplicação sendo designada ao movimento gedozista. Todavia, depois de uma análise do que propomos expor, sei que o amado leitor poderá concordar comigo que no Encontro, acontece uma lavagem cerebral.
Conforme aponta Kathleen Tayor, a lavagem cerebral nem sempre é maliciosa, pois seu executante realmente acredita que a vítima irá ser beneficiada com a “re-educação”.[2]
Podemos detectar que houve uma reforma de pensamento levando em consideração o aspecto tempo: “quanto mais curto o tempo de transição – entre as antigas e as novas crenças – o mais provável é que alguma forma de lavagem cerebral tenha ocorrido.”[3] Podemos dizer que a carga horária da proposta gedozista se dá em aproximadamente 44 horas distribuídas em pouco mais de um mês (Pré-encontro, Encontro e Pós-encontro).
Uma obra bastante citada em relação a esse assunto é Thought Reform and the Psychology of Totalism, de Robert Jay Lifton. Este livro é um estudo psicológico das técnicas de reforma do pensamento utilizadas na China comunista. Lifton realizou extensas entrevistas com quarenta pessoas em Hong Kong logo após a libertação dos mesmos da prisão. Eram 25 ocidentais e 15 chineses.
O grupo ocidental era formado por 13 missionários (12 católicos e 1 protestante), 4 homens de negócio, 2 jornalistas, 2 físicos, 1 pesquisador escolar, 1 professor universitário, 1 capitão da marinha e 1 dona de casa.[4]
Muita pesquisa foi realizada nessa época, pois um fato curioso aconteceu com certa frequência. Vários soldados americanos haviam mudado de lado depois de serem mantidos prisioneiros na guerra da Coréia (1950-1953).[5] O patriotismo americano é notório, portanto, uma mudança radical de pensamento como essa, merecia a atenção e pesquisa por parte dos profissionais da área de psicologia e psiquiatria.
Lifton enumerou 12 passos no processo psicológico de reforma de pensamento: 1) o assalto à identidade; 2) o estabelecimento da culpa; 3) a auto-traição; 4) o conflito total e medo básico; 5) a clemência e a oportunidade; 6) a compulsão para confissão; 7) a canalização de culpa; 8) a desonra da lógica; 9) o progresso e a harmonia; 10) a confissão final; 11) o renascimento e 12) a liberação: transição e limbo.[6]
Seria coincidência? Lavagem cerebral em “12” passos. Claro que é uma brincadeira. Bem, não há espaço suficiente aqui para explicar detalhadamente cada um desses passos, mas podemos citar nosso raciocínio de forma sucinta.
Cada um desses passos acontecia num espaço de confinamento. O primeiro ponto é um ataque à identidade. É como se dissessem, você não é um soldado. Você não é quem você pensa que é. Você não é Jacó, você é Israel (1). Enquanto essa crise de identidade vai sendo instalada, mostra-se a culpa. Você é ruim. Você não presta. Um mapeamento espiritual pode até ajudar com a grande listagem de pecados (2). O próximo passo é a auto-traição. Você concorda comigo que é ruim? Depois de tanto pecado, concordo! (3).
O soldado entrava em colapso, num conflito interno. O que devo fazer a partir de agora? (4). Daí o reformador do pensamento sugeria numa falsa clemência: eu posso lhe ajudar (5). No meio das torturas, a vítima constantemente precisava confessar as acusações. A confissão se tornava uma prática compulsiva, era o meio pelo qual poderia garantir sua sobrevivência (6).
Com a compulsividade da confissão e a constante acusação, outra consequência era trazida: a canalização da culpa (7). A argumentação dos coreanos visava confundir a lógica das coisas. Você não é um padre? Não está aqui para servir? A bíblia ensina você a servir? Você acredita nisso? Todas essas perguntas tinham resposta positiva. Até que veio outra questão: quem arrumou sua cama hoje, padre? Ele respondeu, meus criados. Então você não tem seguido sua doutrina, tem? Muitas pessoas viram suas lógicas (métodos eclesiológicos tradicionais) serem desfeitas no Encontro. (8). Uma vez desfeita, o doutrinador oferece uma nova lógica. Seu destino está nas próprias mãos, depende da própria escolha. Se escolher a nova opção sua vida será melhor (9).
Depois dessa pressão, o oprimido acaba escolhendo a nova sugestão e faz sua confissão final (10). O sentimento de alívio acaba sendo comparado com um renascimento por parte das vítimas (11). A transição final não era algo simples. Muitas sequelas seriam carregadas para o resto da vida. Muitos eram os traumas e não haveria possibilidade para viver na normalidade da vida. A mudança de pensamento, a reeducação, a doutrinação ou a lavagem cerebral estava feita. Nunca mais seria a mesma pessoa (12).
Lifton é conhecido, ainda, por sua tese dos oito pontos dos oito pontos de reforma do pensamento. Watters comenta essas oito teses da seguinte maneira.[7]
1) Controle do meio: “As seitas usam várias técnicas para controlar o meio das pessoas que recrutam, mas usam quase sempre uma forma de isolamento”. O Encontro, com suas técnicas de doutrinação, pode se enquadrar aqui com toda facilidade.
2) Manipulação mística: “Nas seitas religiosas, Deus está sempre presente nas atividades da organização. Se uma pessoa sai da seita, quaisquer acidentes ou outros infortúnios que lhe aconteçam são interpretados como uma punição de Deus.” Esse ponto será abordado com maior detalhes no capítulo 7, na seção “o que acontece com quem quebra a aliança”.
3) Exigência de pureza: “O mundo é descrito a preto-e-branco, não há necessidade de se fazerem decisões baseadas numa consciência treinada. A conduta da pessoa é modelada de acordo com a ideologia do grupo, conforme esta é ensinada na sua literatura. Pessoas e organizações são descritas como boas ou más, dependendo do seu relacionamento com a seita.” Ver capítulo 7 na seção “o que acontece com quem quebra a aliança”.
4) O culto da confissão: “Pecados sérios (segundo os critérios da organização) têm de ser confessados imediatamente.” As listas de pecado durante o mapeamento espiritual servem de apoio a esse tópico.
5) O “conhecimento sagrado”: A ideologia da seita torna-se na moral definitiva para estruturar a existência humana. A ideologia é demasiada ‘sagrada’ para se duvidar dela e requer-se que o adepto tenha reverência pelos líderes. A seita alega que a sua ideologia tem uma lógica infalível, fazendo parecer que é a verdade absoluta, sem contradições. Um sistema assim é atrativo e oferece segurança.” O sistema de quebra de lógica da eclesiologia tradicional está presente em todo o sistema gedozista.
6) Linguagem elaborada: “As seitas usam de forma abundante ‘clichês para acabar com o pensamento’, expressões ou palavras que são forjadas para acabar a conversa ou a controvérsia.” O maior clichê do G-12 você já sabe: O ENCONTRO É… (TREMENDO).
7) Doutrina acima das pessoas: “A experiência humana é subordinada à doutrina, independentemente de quão profunda ou contraditória tal experiência seja (…) O indivíduo só tem valor na medida em que se conforma aos modelos preestabelecidos pela seita.” Ver capítulo 7 na seção “o que acontece com quem quebra a aliança”.
8) Dispensados da existência: É a seita quem decide tudo para o adepto. Ele fica alienado de suas decisões e se submete cegamente à organização. Ver capítulo 7 na seção “Para aliança, eu digo sim (submissão cega)”.
Outro fator que corrobora infalivelmente para a doutrinação do sistema gedozista no evento do Encontro, é a grande quantidade de palestras subsequentes. Não há tempo para que o encontrista “pense” direito. Sua mente fica cansada, pois é um assunto após o outro. Além disso, o trabalho com os neófitos é mais promissor, pois tornam-se “presas mais fáceis”.[8]
Manipulação emocional
Outro aspecto relevante acerca da lavagem cerebral é a respeito da “força das crenças envolvidas e sua associação com a emoção”. Normalmente “as novas crenças estão associadas a estados emocionais extremos”.[9]
Essa associação pôde ser vista nos passos enumerados anteriormente. A manipulação emocional é um fator preponderante para que isso ocorra.
Conforme já relatamos, os momentos em que a emoção sofre maior impacto são nas ministrações de libertação e cura interior (principalmente esta). Além dessas palestras, há o momento da entrega de presentes. Essas etapas realmente marcam a vida das pessoas que são mais suscetíveis ao emocionalismo.
O Dr. Martin LLoyd-Jones comentou que, nos falsos avivamentos as emoções são controladas e manipuladas. Trata-se de levar as pessoas ao delírio, ao descontrole e/ou ao êxtase. “Portanto”, diz Jones, “qualquer esforço que deliberadamente tenta estimular as emoções (…) naturalmente é condenado pelo Novo Testamento. Jogar com as emoções é errado (…) qualquer assalto direto sobre as emoções é, necessariamente falso e inevitavelmente resultará em problemas”.[10]
No Guia Oficial do Encontro, podemos ver muitas orientações de manipulação emocional. Os discipuladores que ministram as aulas do pré-encontro são orientados a “promover quebrantamento através da oração” com imposição de mãos.[11]
Quem produz quebrantamento no cristão não é outro cristão. Isso é um ato soberano de Deus. A ideia de Terra Nova é que através de palavras emotivas sobre nosso estado de pecador proferidas com o auxílio de uma música de fundo, temos condições de emocionar e quebrantar o coração dos participantes.
Na última lição do Pré-encontro, Renê orienta o professor da lição a “orar por eles [futuros encontristas] liberando o amor de Cristo”.[12]
Vejamos bem, qual de nós, meros mortais tem a capacidade de liberar o amor de Cristo através de uma oração? É como se orássemos assim numa reunião: “eu libero o amor de Cristo sobre a sua vida!”
Esses jargões adquiriram muita expressividade no Brasil. Virou uma mania comum profetizar, expulsar demônios, curar pela própria autoridade usando o Nome de Cristo.”Eu profetizo”, “eu repreendo”, “eu…”, “eu…”.
Gostaria de citar mais duas orientações de manipulações. A primeira é uma orientação geral do Encontro: “deixe à disposição um bom gravador com músicas que falem sobre a dependência de Deus, o amor de Jesus, o Seu perdão, etc. A música deverá ser tocada na hora da oração de arrependimento e quebrantamento; é bom que seja sempre a mesma música, para ficar como um marco na lembrança dos encontristas”.[13]
E a última para a primeira lição do Pós-Encontro: “promova o mesmo sentimento de alegria e quebrantamento pela presença do Senhor experimentados no Encontro”.[14]
Está mais do que evidente o trabalho forçado pela manipulação emocional no Encontro com Deus. Isso me leva a perguntar: das milhares de conversões citadas por Renê em sua estatística, quantas são emocionais (produzidas pela técnica humana) e quantas são realmente espirituais (produzidas pelo Espírito Santo)?
Jones fez uma excelente abordagem sobre o uso de técnicas psicológicas na teologia cristã. Ele critica seriamente essas técnicas e revela que, a influência psicológica não produz mudanças genuínas, mas apenas respostas emocionais. Estas, por sua vez, são momentâneas e enganosas.[15] A pessoa até se sente bem, mas essa sensação não é sustentável.
Atualmente outras denominações do ramo da teologia da prosperidade também lançam mão destas ferramentas psicológicas. Durante suas campanhas, as mensagens, que contêm uma forte ênfase emocional, incentivam os desavisados a oferecerem coisas que Deus não está pedindo.
Muitos, no afã e na euforia dessas mensagens, doam suas casas, carros e outros bens. A prova de que não era uma doação voluntária, feita com alegria e motivada por Deus está na atitude posterior de remorso e tristeza por terem efetuado tais doações.
Há alguns meses na cidade onde moro, um pastor fez uma campanha de libertação. Durante as semanas ele incentivava os participantes a ofertar altas quantias e o fazia como numa espécie de leilão. Começava com altos valores e ia diminuindo para atrair mais contribuintes. As promessas de bênção eram também proporcionais às ofertas. Mais dinheiro, quer dizer, semente, mais bênçãos de Deus.
Uma das técnicas emocionais que ele usava para “forçar” as pessoas a doarem quantias mais gordas era apelar para os valores familiares. Dizia ele : “você vai ofertar aquilo que vale a sua família. Quanto você acha que valem seus familiares? Pais, mães, maridos, esposas, filhos…?”. Ora, minha família não tem preço! Entretanto, muitas pessoas criam expectativas baseadas nas palavras desses manipuladores e doam o que tiverem.
Para Castellanos o Encontro com Deus equivale a todo um ano de assistência fiel à igreja.[16] Ele pensa isso porque os encontristas saem de lá motivados a viverem diferente. Já vi até pessoas que estavam há anos no Evangelho dizerem que depois desse evento é que eles tinham sido convertidos.
A experiência emocional é realmente muito forte e tem provocado essa sensação em muitas pessoas, as quais acabam pensando que nasceram de novo a partir dali. Há uma confusão entre emoção e regeneração.
Tillich explica que, a regeneração, bem como a conversão “pouco têm em comum com a tentativa de criar reações emocionais apelando ao indivíduo em sua subjetividade”.[17] Durante a obra regeneradora do Espírito Santo a pessoa pode até sentir alguma coisa e se emocionar, mas isso não é via de regras.
Em um de seus sermões, Spurgeon disse:
O quebrantamento santo que faz um homem lamentar o seu pecado surge de uma operação divina. O homem caído não pode renovar seu próprio coração. O diamante pode mudar seu próprio estado para tornar-se maleável, ou o granito amolecer a si mesmo, transformando-se em argila? Somente aquele que estendeu os céus e lançou os fundamentos da terra pode formar e reformar o espírito do homem. O poder de fazer que da rocha de nossa natureza fluam rios de arrependimento não está na própria rocha. O poder jaz no onipotente Espírito de Deus.
Ele ainda continua dizendo que,
O enternecimento do coração e o lamento pelo pecado são produzidos por olharmos, pela fé, para o Filho de Deus traspassado. A verdadeira tristeza pelo pecado não acontece sem o Espírito de Deus. Mas o Espírito de Deus não realiza essa tristeza sem levar-nos a olhar para Jesus crucificado. Não há verdadeiro lamento pelo pecado enquanto não vemos a Cristo… Ó alma, quando você chega a contemplar Aquele para quem todos deveriam olhar, Aquele que foi traspassado, então seus olhos começam a lamentar aquilo pelo que todos deveriam chorar — o pecado que imolou o seu Salvador! Não há arrependimento salvífico sem a contemplação da cruz… O arrependimento evangélico é o único arrependimento aceitável. E a essência desse arrependimento é olhar para Aquele que foi moído pelos pecados… Observe isto: quando o Espírito Santo realmente opera, Ele leva a alma a olhar para Cristo. Nunca uma pessoa recebeu o Espírito de Deus para a salvação, sem que tenha recebido dEle o olhar para Cristo e o lamentar por seus pecados.[18]
A manipulação emocional não é capaz de produzir arrependimento genuíno. Trata-se de resultado a curto prazo. É como a semente que caiu em terreno pedregoso. Ela atingiu apenas a superfície, pois não tinha condições de se aprofundar mais do que isso.
Jesus disse que essa pessoa até recebe a palavra com alegria, mas “não tem raiz em si mesmo, antes é de pouca duração; e sobrevindo a angústia e a perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza” (Mt 13.21).
É preciso entender que, técnicas psicológicas produzirão resultados psicológicos.[19] A pregação legítima não pode perder seu verdadeiro espaço e tampouco o Espírito Santo pode ser substituído na Igreja. A atenção exagerada a técnicas e métodos “é sempre indicativa de falta de fé na Obra do Espírito Santo”.[20]
Precisamos usar a espada do Espírito. Ela é a única que pode penetrar no âmago do homem. Que pode separar juntas e medulas, alma e espírito. Além do mais, é o Espírito Santo quem convence o pecador e o conduz a Cristo.
Cabe a nós, ministros do Evangelho, “evitar toda e qualquer coisa que meramente produza uma condição psicológica, em vez de uma condição espiritual”.[21]
Isso não significa que não pode haver choro, quebrantamento, alegria e paz de espírito em nossos cultos. Porém, qualquer manifestação emocional deve ser operada pelo Espírito Santo e não plagiadas ou forçadas por mecanismos psíquicos, frases de efeito ou qualquer outra forma de manipulação emocional.
Técnicas psicológicas
Nesta seção veremos algumas das práticas psicológicas que são utilizadas no Encontro e no movimento gedozista em geral. Não quero dizer, com isso, que os criadores dessa programação utilizam essas técnicas deliberadamente. Na realidade, o lugar que muitos líderes vêm dando ao pragmatismo é que propiciou a entrada de técnicas como as que vamos comentar aqui.
Brown lembra bem que, as tentativas de modificar as opiniões dos outros são mais antigas que a história escrita. No entanto, o surgimento dessa prática tem mais provavelmente seu gênese no aparecimento do “dom da palavra”. Através desse “dom”, surgiu o poder de manipular e/ou persuadir as pessoas sem ser necessário o uso de força e coação.
Para uma “lavagem cerebral” eficiente, “as armas essenciais são verbais (…) e os resultados são psicológicos”.[22] Transformações psicológicas, por sua vez, demandam técnicas psicológicas. Veremos a seguir, sete dessas oito técnicas, as quais são utilizadas no meio da propaganda e publicidade, enumeradas por Brown em seu livro “Técnicas de Persuasão: da propaganda à lavagem cerebral”.[23]
1. O emprego de estereótipos: por estereótipo, podemos entender uma ideia ou um conceito pré-estabelecido como padrão, um pré-conceito. Podemos citar algumas ideias para ilustrar.
Nos EUA, principalmente após o desastroso evento do 11/09, muitas pessoas acabaram ligando a imagem de um árabe à de um terrorista. O estereótipo do muçulmano, portanto, tomou uma visão negativa após essa tragédia.
Atualmente, no Brasil, pastores em geral receberam um estereótipo de mercantilistas. É como se toda a liturgia evangélica se desse em torno de “pedir” dinheiro. Sabemos que isso não é uma imagem verdadeira do cristianismo, mas após algumas denominações implantarem a teologia da prosperidade por aqui, essa visão deturpada do Evangelho se instalou.
Na área publicitária, podemos ver os estereótipos nas figuras dos modelos. Os homens são sempre bem aparentados, sarados, com uma impressão de ser bem sucedido. Os casais são sempre bonitos, harmônicos (parece que nunca brigam), saudáveis, invejáveis e desejáveis. As mulheres são as de corpo escultural, sempre felizes e belíssimas e também saudáveis.
Nas agências de turismo os estereótipos são usadas nas fotos mais belas, nos pontos que mais chamam a atenção, praias, belezas naturais e por nomes que identifiquem algo a mais naquela localidade. O Rio de Janeiro é a cidade maravilhosa, Paris é a cidade das luzes e assim por diante. Nunca vemos numa propaganda dessas, cenas de violência, favelas, mendigos e coisas semelhantes. A ideia é atrair pelos estereótipos qualitativos.
Da mesma forma, no movimento G-12 em si, a ideia é aplicada em sua ideologia. Seu estereotipo é a de uma nova reforma, a de uma solução para o crescimento da igreja, um modelo sem igual, uma novidade sem precedentes, uma visão magnífica e eficaz. A grande colheita só pode ser atingida pelas igrejas que adotarem esse método. Essa é a propaganda gedozista. No Encontro isso fica muito claro, principalmente na palestra sobre a visão dos 12.
O contrário também é verdade, os métodos tradicionais são taxados como ultrapassados, obsoletos, sem sentido. Escola Dominical pra quê? Agora existe um meio mais avançado e rápido, a escola de líderes. “Não há alternativa”, diz Castellanos, “a igreja celular é a igreja do Século XXI”.[24]
2. A substituição de nomes: a ideia em substituir alguns nomes é para favorecer e/ou desfavorecer os concorrentes. Pode também ser utilizado para amenizar ou denegrir determinado segmento.
Os defensores da prática do aborto, por exemplo, substituem a expressão bebê por feto. A primeira nos dá a ideia de um ser vivo, uma criancinha. A última, entretanto, não dá essa impressão e choca menos saber da morte de um feto do que a de um bebê.
As demais denominações históricas e pentecostais que se opuseram ao movimento gedozista foram tratadas como tradicionais. Esse foi o rótulo que estamparam.
Renê Terra Nova, por exemplo, declarou que esse mover (visão dos 12) perturbou “aqueles que estavam presos à letra e arraigados às tradições humanas” [25].
Numa apostila sobre o movimento em células, o pastor Ivo Gomes do Prado diz que, “a Igreja tradicional ou Modelo Baseado em Programas (MBP) tem conseguido crescer até um patamar pequeno”.[26] Antes disso ele tenta convencer os leitores de que o modelo inovador é o mais aplicável citando exemplos de mega igrejas ao redor do mundo que adotaram essa sistemática.
Prado cita, ainda, a experiência de Neighbour dizendo que, ele estava “totalmente desiludido com a estrutura da Igreja tradicional onde as Igrejas viviam estagnadas e pouco atingiam o mundo descrente”, mas que “recebeu o chamado do Senhor para uma obra especial”.[27]
Repare como fica a apresentação dos dois estereótipos: o primeiro (tradicional) é ineficaz e tende a estagnar, deixou Neighbour até desiludido. O segundo (celular), por sua vez é uma obra especial.
3. Seleção: o método de seleção consiste em separar apenas as informações convenientes. As propagandas gedozistas tentam mostrar apenas o crescimento numérico e vantagens de menos trabalho na seara do Senhor.
Certa igreja afirmou que nas denominações em que o sistema gedozista não foi adotado, as consequências são: igrejas pequenas, pessoas não pastoreadas, pessoas que entram pela porta da frente e saem pela porta dos fundos, o pastor carrega o trabalho, o potencial da liderança não é aproveitado, as pessoas ficam desmotivadas, o crescimento é lento, a reprodutividade é incapacitada e há constantes insatisfações.
Em contrapartida, a propaganda para uma igreja que adotou o sistema é de que, todos serão líderes e ninguém é inativo, os relacionamentos são fortalecidos, cada membro da igreja é valorizado, há oportunidade para que todos trabalhem, o poder de evangelismo aumenta, o crescimento não depende de recursos financeiros, a estratégia para enfrentar tempos de perseguição já é adotada e o discipulado e o ensino passam por todos os membros da igreja, favorecendo a unidade na fé e na visão.[28]
Com base em que essas informações são citadas? Certo líder da Igreja do Nazareno afirmou sábias palavras que guardei para meu ministério: “pastor deve ter cheiro de ovelhas”. O marketing em torno da facilidade e dos métodos menos trabalhosos da visão dos 12, chamou a atenção de muitos pastores no Brasil.
Selecionar apenas estatísticas de igrejas que deram certo no modelo é uma armadilha tendenciosa. Por trás do movimento há inúmeras dificuldades e vários problemas que não são mencionados.
4. Repetição: Joseph Goebbles, ministro da propaganda de Adolf Hitler, dizia que, “se uma mentira for repetida mil vezes, sempre com convicção, tornar-se-á uma verdade”. Isso os nazistas conseguiram com sucesso.
Essa técnica da repetição consiste, na área da propaganda e publicidade, na propagação de clichês, slogans ou jargões.
Atualmente, um dos maiores empresários brasileiros, Silvio Santos, adotou esse sistema em uma de suas marcas. Seu slogan é “não existe mulher feia, existe mulheres que não conhecem os produtos Jequiti”.
Outros slogans famosos são: “Fazendo sua vida mais doce” (Açúcar União); “Se é Bayer, é bom” (Bayer); “Tem 1001 utilidades” (Bombril); “Abuse, use C&A” (C&A); “Abra a boca é Royal” (Pó Royal) e “Tomou Doril, a dor sumiu” (Doril). Quem faz parte das gerações x ou y deve se lembrar de um dos mais famosos slogans da caninha 51: “uma boa ideia”.
A pastora Roselaine Perez relata que teve
que digerir depressa demais o amontoado de quesitos que a Visão Celular possuía, parecia que tinha mudado de planeta e precisava aprender o novo dialeto local, e urgente, para conseguir me adaptar. Ganhar / consolidar / discipular / enviar, almas / células/ famílias, Peniel, Iaweh Shamá, honra, conquista, ser modelo, unção apostólica, atos proféticos, mãe de multidões, pai de multidões, conquista da nação, mover celular, riquezas, nobreza, encontro, reencontro, encontros de níveis, resgatão, Israel, festas bíblicas, atos proféticos, congressos, redes, evento de colheita, prosperidade, recompensa, multidão, confronto, primeira geração dos 12, segunda geração dos 12, toque do shofar, cobertura espiritual, resultado, resultado, resultado, etc…[29]
Além desses slogans, temos ainda, o mais famoso de todos. Esse você já conhece, “O ENCONTRO É…”.
5. Afirmação: Segundo Brown, o “propagandista raramente discute, mas faz afirmações ousadas em favor de suas teses”.[30] A afirmação, portanto, trata-se não de uma defesa apologista de suas bases, mas de uma propaganda estonteante de si mesma.
Declarações de que a Visão dos 12 é uma segunda reforma, a única opção para o século XXI e demonstrações numéricas de seus alcances são verdadeiras estratégias de afirmação.
6. Apontar o inimigo: Além de propaganda em favor próprio, o propagandista também propaga imagens contra seus adversários. Browm diz que esse inimigo “pode ser real ou imaginário, supostamente contrário à vontade de seu público”.[31]
O Bispo Ronaldo, do “Ministério Apostólico Luz para os povos”, disse que Deus lhe “mostrou pelo menos três inimigos que tem vindo contra” os gedozistas a fim de impedi-los “de conquistar as promessas que a Visão Celular”[32] mostra.
Dois desses três inimigos são os demônios. Eles estão alegorizados na figura dos amonitas e dos hagarenos. Os “espíritos amonitas” são os que roubam a visão e matam a multiplicação. Já os “espíritos hagarenos” são os trabalham com nosso passado, causam traumas de rejeições, decepções com as pessoas e murmurações e fofocas de insatisfação.
O terceiro inimigo são pessoas que trazem desânimo, confusão, zombaria, fofocas e medo. Estas são simbolizadas por Sambalate e Tobias (cf Ne 6).
7. Apelo à autoridade: esse apelo nada mais é do que uma estratégia subjetiva de recorrer a alguém que dê mais respaldo à tese em função do cargo de autoridade ou pelo renome já conquistado.
Normalmente nas propagandas, vemos esse tipo de técnica sendo exercida em frases do tipo “médicos de vários lugares…”, “as autoridades já…”, “líderes de…” e “especialistas de todo o mundo”. Repare que são frases subjetivas. Quais são os médicos, autoridades, líderes e especialistas?
Algumas vezes, usa-se o nome de alguém para respaldar a tese, podendo ser o de médicos, especialistas, presidentes da república, etc.
No caso gedozista, bem como no meio neopentecostal e em casos abusivos do pentecostalismo, a maior autoridade que se recorre para validar a tese é o próprio Deus.
Castellanos narra que a visão nasceu de uma revelação divina,[33] Comiskey diz a mesma coisa.[34] Aliás, senão todos os líderes, a grande maioria alega a implantação do método gedozista baseados numa ordenança divina.
Essa estratégia “finaliza” qualquer embate, pois quem vai questionar a legitimidade da revelação? Se foi Deus quem mandou, só resta obedecer.
[1] LIFT, Robert Jay. Thought Reform and the Psychology of Totalism. The Norton Library, New York. 1963, p. 3.
[2] TAYLOR, Kathleen. Brainwashing – The Science of Thought Control. Oxford University Press. Oxford, 2004, p. 10.
[3] Ibid, p. 11.
[4] LIFTON, Robert Jay. Op. Cit., p. 12.
[5] Ibid, pp. 5-7.
[6] Ibid, pp. 65-85.
[7] WATTERS, Randall. Como as Seitas Controlam as Mentes dos Adeptos. Revista sã doutrina. Revista Apologético-Cristã Bimestral Ano 6 – 2007 – nº 11, pp. 3-4.
[8] ZÜGE, Edgar. Movimento G-12 – o que é? Revista da Igreja Luterana, n° 2, 2002, p. 173.
[9] TAYLOR, Kathleen. Op Cit., p. 12.
[10] LLOYD-JONES, Martin. Avivamento. PES. São Paulo, 1996, p. 79.
[11] NOVA, Renê Terra. Op. Cit., p. 22.
[12] Ibid, p. 33.
[13] Ibid, p. 43.
[14] Ibid, p. 104.
[15] LLOYD-JONES, Martin. Conversões: psicológicas e espirituais. PES. São Paulo, pp. 36-37.
[16] CASTELLANOS, César. Sonha e ganharás o mundo. Palavra da Fé Produções. São Paulo, 1999, p.91.
[17] TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. Sinodal. São Leopoldo, 2005, p. 461.
[18] SPURGEON, Charles H. O Motivo mais importante para o arrependimento. Sermão matinal de domingo 18 de setembro de 1887.
[19] LLOYD-JONES, Martin. Op. Cit., p. 41.
[20] Ibid, p. 39.
[21] Ibid, p. 42.
[22] BROWN, J. A. C.. Técnicas de Persuasão: da propaganda à lavagem cerebral. Zahar Editores. Rio de Janeiro, 1965, p. 11.
[23] Ibid, pp. 27-30
[24] CASTELLANOS, César. Sonha e ganharás o mundo. Palavra da Fé Produções. São Paulo, 1999, p.143.
[25] História da PIBREM. Disponível em: http://www.mir12.com.br/br/index2.php?pg=aGlzdG9yaWFkb21pcg==. Acesso em 20/05/11.
[26] PRADO, Ivo Gomes do. Apostila de Igreja em Células: vivendo a comunhão do primeiro amor. São Paulo, /2000, segunda edição, p. 9. Material não publicado.
[27] Ibid, p. 5.
[28] Monte Sião. Voltar aos princípios do primeiro século para enfrentar os desafios do último. Disponível em: http://www.montesiao.pro.br/estudos/visao/proposta_celular.html. Acesso em 18/05/11.
[29] PEREZ, Roselaine. Uma Sobrevivente da Visão Celular de Renê Terra Nova Conta Tudo. Disponível em: http://www.genizahvirtual.com/2010/11/uma-sobrevivente-da-visao-celular-de.html. Acesso em 05/05/11.
[30] BROWN, J. A. C. Op. Cit., p. 29.
[31] Ibid, p. 29.
[32] SILVA, Ronaldo Pereira da. Os inimigos da visão. Disponível em: http://www.luzparaospovos.org.br/pagina.asp?pagina=4907. Acesso em 21 de Outubro de 2013.
[33] CASTELLANOS, César. Sonha e ganharás o mundo. Palavra da Fé Produções. São Paulo, 1999, p.21.
[34] COMISKEY, Joel. Op. Cit, p. 12.
Extraído do livro “A Verdade Sobre o G12”, Couto