Se o grande número e a variedade dos comandos, exortações, admoestações e advertências na Bíblia devem ser levados a sério, então o homem deve ter capacidade para responder, para seu benefício ou prejuízo. Isto é especialmente verdadeiro quando diz respeito à sua salvação:
Olhai para mim, e sereis salvos, vós, todos os confins da terra; porque eu sou Deus, e não há outro (Is 45.22).
E dizendo: O tempo está cumprido, e é chegado o reino de Deus. Arrependei-vos, e crede no evangelho (Mc 1.15).
Mas Deus, não levando em conta os tempos da ignorância, manda agora que todos os homens em todo lugar se arrependam (At 17.30).
Ora, o seu mandamento é este, que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, como ele nos ordenou (1Jo 3.23).
E o Espírito e a noiva dizem: Vem. E quem ouve, diga: Vem. E quem tem sede, venha; e quem quiser, receba de graça a água da vida (Ap 22.17).
Há também os convites do próprio Jesus Cristo no Novo Testamento a ser considerados:
Vinde a mim, todos os que estai cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei (Mt 11.28).
Ora, no seu último dia, o grande dia da festa, Jesus pôs-se em pé e clamou, dizendo: Se alguém tem sede, venha a mim e beba (Jo 7.37).
Se a doutrina de que o homem não tem livre arbítrio é verdadeira, então o que devemos fazer destes versos? Deus está apenas zombando de sua criação? Deus apresentaria a salvação a um homem sabendo que o homem nunca poderia até mesmo desejar recebê-la? O Deus da Bíblia não é o deus do fatalismo. Deus mesmo até assegura a genuinidade de suas intenções: “Não falei em segredo, nalgum lugar tenebroso da terra; não disse à descendência de Jacó: Buscai-me no caos; eu, o Senhor, falo a justiça, e proclamo o que é reto” (Is 45.19). Erasmo reconhecia e usou isto contra Lutero em seu debate sobre o livre-arbítrio: “Se não está dentro da capacidade de todo homem cumprir o que é comandado, todas as exortações nas Escrituras, e todas as promessas, ameaças, repreensões, censuras, abjurações, bênçãos, maldições e os inúmeros preceitos, são necessariamente inúteis”.
Mas na Bíblia é claro que a possibilidade existe de que um homem poderia crer sob uma determinada série de circunstâncias:
Os que estão à beira do caminho são os que ouvem; mas logo vem o Diabo e tira-lhe do coração a palavra, para que não suceda que, crendo, sejam salvos (Lc 8.12).
Mas não quereis vir a mim para terdes vida (Jo 5.40).
E nos impedem de falar aos gentios para que sejam salvos; de modo que enchem sempre a medida de seus pecados; mas a ira caiu sobre eles afinal (1Ts 2.16).
Estes versos não querem dizer que sob uma determinada série de circunstâncias um homem sempre irá crer. Mas eles mostram que há essa possibilidade. E se existir a menor possibilidade de um indivíduo poder crer ao ouvir o evangelho, a doutrina de que o homem não tem livre arbítrio cai pelo caminho.
Extraído de Laurence Vance